Ricardo Schott, Jornal do Brasil
RIO - Escalado para voltar ao trabalho televisivo e comercial que tem marcado sua carreira dedica-se agora à trilha incidental de Viver a vida, próxima novela das 21h, com autoria de Manoel Carlos e direção de seu eterno parceiro Jayme Monjardim, com quem trabalha desde 1989 o compositor mineiro Marcus Viana diz preferir manter suas raízes progressivas bem ancoradas. Além de preparar para breve o lançamento de um DVD de seu antigo grupo, o Sagrado Coração da Terra, alinhou-se, em seu novo CD, Pleiadian connections, ao estilo de música que, há três décadas, era vitimizado na imprensa, ganhando o rótulo pouco explicativo de new age. Um som que, para ele, tem propriedades maiores (e bem mais nobres) do que as que normalmente se supõe.
O Pleiadian faz parte de um projeto que criei, que chamo de Pharmácia de música. Estamos mesmo visando à música como um remédio afirma Viana, que, na capa, escreveu que o disco traz música espacial e xamânica para cura e meditação . As pessoas não prestam atenção nisso, mas música é uma coisa muito complicada e perigosa, sem vergonha mesmo. Ela é capaz de levantar uma nação em guerra. E, de certa forma, ela conduz pensamentos, assim como o funk faz qualquer um rebolar ou o axé faz pular. Com um trabalho de concentração, é possível atingir várias regiões de uma pessoa com esse tipo de música que desenvolvo no meu trabalho.
Sinfonias em DVD e na novela
Quanto ao Sagrado Coração da Terra, grupo sinfônico com o qual lotava espaços e mantinha boas vendagens de CDs independentes, ele retorna num DVD chamado Cosmos x caos, que está sendo preparado para o segundo semestre. No conteúdo, uma apresentação de 1989, gravada no Palácio das Artes de Belo Horizonte, que, além de comemorar os 10 anos do grupo, marcava o lançamento no Rio do segundo disco, Flecha (1987).
Deve ter uma parte iconográfica grande, com fotos, um documentário, e talvez coisas de outros shows. Foi uma época muito feliz para a gente, em que me projetei nacionalmente afirma o músico. Depois dessa época passei a trabalhar mais solo e o Sagrado entrou em hibernação. Eu ainda preciso ver como isso será lançado. Pode ser que reúna a banda para fazer um show no Rio.
O glacê progressivo, com referências espaciais, curativas e xamânicas, no entanto, vai ser deixado de lado quando a nova trama de Manoel Carlos for ao ar. Monjardim já viajou para Israel para fazer algumas gravações. Viana, que faz seu primeiro trabalho ao lado do teledramaturgo, aguarda pela hora em que se reunirá com Manoel para discutir detalhes. Mas já sabe que seu lado montanhês e mineiro deverá unir-se à visão leblonense do autor. Que, por sinal, adora dar seus pitacos em trilhas sonoras de novelas, escolhendo músicas permeadas por climas bossanovistas, jazzísticos e sempre cariocas.
Estou com uma expectativa bem grande e espero realmente aflorar meu lado jobiniano. Mas meu trabalho é mais incidental. É como aquela música do banheiro do Hitchcock brinca ele, referindo-se à famosa cena de Psicose, clássico do cineasta dedicado ao suspense. Conversei com o Monjardim e sei que ele adora sinfonias. E gosto muito do Manoel Carlos, sei que ele é bastante ligado em música e cultura brasileiras. A novela vai se passar em lugares como Israel e Jordânia, então devo preparar algo de música oriental. Ao lado de uma sonoridade meio carioca, mas que se refere a vários outros lugares.
A parceria entre Viana e Monjardim começou em 1989, quando o diretor assistiu a um especial do Sagrado Coração da Terra na antiga Rede Manchete. O músico foi convidado por ele para compor temas para a trilha da novela Kananga do Japão, primeiro grande sucesso do núcleo de teledramaturgia da emissora. Mas o grande hit mesmo daquela época foi Pantanal (1990), recém-reprisada pelo SBT, na qual os trabalhos de Viana (responsável por toda a trilha instrumental e por uma suíte sinfônica lançada até num CD separado) e de Monjardim praticamente fundiram-se num só. Apesar do clamor dos atores, que chegaram a reclamar da reprise abrupta da novela, Viana diz nunca ter feito parte desse time.
Só agora, com essa reprise, é que fui receber direitinho do Ecad, porque na época ninguém sabia nada de direito autoral revela Viana, que espera que o SBT agora chegue a obras televisivas como Ana Raio e Zé Trovão (1991), que tinham um extenso trabalho musical de sua autoria. Tem toda uma geração que não viu essas novelas e que se animou muito de assisti-las. E ainda tem o pessoal que viu na época e adorou a reprise. Meu Orkut e meu YouTube ficaram cheios de recados quando Pantanal voltou.
Outro projeto ao qual Viana se dedica é o de recolher material iconográfico de seu pai, o maestro Sebastião Vianna (este, com dois nn), morto em outubro de 2008 aos 93 anos. O músico estava em plena atividade e havia lançado recentemente um CD interpretando a obra do chorão Joaquim Callado. Mas seu filho diz que o maestro não deixou material gravado.
O projeto dele era reger uma orquestra tocando temas do barroco mineiro, cujas partituras haviam sido encontradas por um pesquisador chamado Curt Lange. Infelizmente isso não aconteceu.