Toninho Spessoto, Jornal do Brasil
RIO - Há mais de meio século Burt Bacharach, 80 anos, é sinônimo da boa música americana nas paradas pop, no cinema, na Broadway. Gigante de uma tradição que inclui nomes como Cole Porter e George Gerswhin, o autor de Raindrops keep falling on my head, Walk on by, Make it easy on yourself, Alfie e tantos outros clássicos visitou o Brasil pela última vez há 10 anos. A lacuna será sanada com a turnê que o compositor faz em abril, passando por Curitiba (Teatro Positivo, dia 11), Porto Alegre (Teatro do Sesi, dia 13), São Paulo (Credicard Hall, dias 15 e 16) e Rio de Janeiro (Citibank Hall, dia 18). Em entrevista ao Jornal do Brasil, Bacharach fala da música brasileira, das novas perspectivas do seu trabalho e da atual situação da cena pop que ele classifica como péssima .
Jornal do Brasil: O que se pode esperar de seus shows por aqui? No repertório dos concertos recentes não há canções de seus discos de estúdio mais recentes, Painted from memory, gravado com Elvis Costello, e At this time. Pretende incluir algo desses álbuns para os shows no Brasil?
- Sim, já que gosto muito do resultado desses trabalhos. Na turnê pelo Brasil incluiremos God give me strength, minha primeira parceria com Elvis Costello (para a trilha do filme Grace of my heart), de Painted from memory, e Go ask Shakespeare, de At this time, minha e de Rufus Wainwright.
Jornal do Brasil: Falando em parcerias... o senhor compôs recentemente com Brian Wilson, o líder dos Beach Boys, a música What love can do. Como foi a experiência?
- Foi interessante compor com Brian. Ele é um grande autor, de enorme criatividade, os trabalhos que fez tanto com os Beach Boys como sozinho são magistrais.
Jornal do Brasil: Pretende apresentar a canção ao vivo?
- What love can do é uma bela canção. Nunca a apresentei em shows, talvez a inclua no repertório.
Jornal do Brasil: É verdade que você e Elvis Costello estão compondo juntos novamente? Isso pode gerar um novo álbum em parceria?
- Escrevemos algumas canções, sim, mas por enquanto não há nada previsto sobre um novo álbum juntos. Tudo pode acontecer. Fizemos uma canção especialmente para o novo trabalho de Diana Krall (mulher de Costello), mas ela não gostou da letra que ele escreveu...
Jornal do Brasil: Na cerimônia do Grammy em 2007 o senhor e o inglês Seal falaram da possibilidade de trabalhar juntos...
- Ainda não aconteceu, mas quem sabe? Seal tem uma voz belíssima, vem na tradição de grandes cantores com os quais tive o privilégio de trabalhar como Lou Johnson, Ron Isley, Luther Vandross. Gostaria muito de fazer um disco com ele.
Jornal do Brasil: Um número cada vez maior de jovens artistas está gravando canções suas. Isso ainda o surpreende?
- Isso me faz feliz e me surpreende. É sempre uma sensação agradável ver minhas canções gravadas por outros intérpretes, sejam eles jovens ou veteranos. É o sinal do reconhecimento de um trabalho.
Jornal do Brasil: Como vê a cena pop hoje?
- Está péssima. Não existem mais boas canções, hoje tudo é pautado pela volatilidade, pelo consumo rápido, a música descartável comanda as ações. Acho isso simplesmente lamentável. Grandes intérpretes como Gladys Knight ou Aretha Franklin não têm mais lugar nas paradas de sucessos. Inadmissível!
Jornal do Brasil: Em At this time o senhor gravou canções com letras suas, algumas com críticas contundentes ao ex-presidente Bush. Como está vendo o início da gestão de Barack Obama?
- Com esperança. Ele tem consciência de que a missão de revitalizar a economia e reestabilizar socialmente os EUA é muito complicada e trabalhosa. Mas acredito que Obama se sairá muito bem.
Jornal do Brasil: E quanto a gravar novas canções com letras próprias?
- Tenho feito alguma coisa, mas no momento estou compondo com um novo parceiro, o letrista Steven Sater, autor do musical Spring awakenings, que ganhou sete prêmios Tony. É extremamente talentoso e temos feito muitas canções.
Jornal do Brasil: Planos para um novo álbum?
- Sim, até o fim do ano gravarei na Inglaterra um disco somente com artistas britânicos, que deverá ter prioritariamente canções inéditas. Sairá pela gravadora Polydor (ligada à Universal Music).
Jornal do Brasil: O senhor não tem mais contrato com gravadoras: faz acordo por obra. Qual o motivo?
- Hoje o ideal é manter a liberdade, negociando obra a obra. A estrutura das gravadoras infelizmente não é mais tão interessante. Veja o exemplo do álbum Here I am, que fiz com Ronald Isley (cantor dos Isley Brothers) para a Dreamworks Records. É um disco belíssimo, gravado ao vivo em estúdio com uma grande orquestra, e simplesmente não aconteceu por falta de divulgação. Infelizmente não foi lançado numa série de países, inclusive o Brasil. Gostaria de fazer como o Radiohead, que disponibilizou o disco In rainbows pela internet e cada um pagava o que achasse justo. Ou como Prince, que encartou um CD gratuitamente num jornal. Essas novas alternativas de mercado me atraem muito.
Jornal do Brasil: O senhor veio pela primeira vez ao Brasil há exatos 50 anos. Como foi aquela primeira passagem?
- Sempre me diverti e aprendi muito em minhas idas ao Brasil, desde minha primeira visita, em 1959, como diretor musical da cantora e atriz Marlene Dietrich. Nessa primeira viagem conheci o samba e o baião através de visitas a favelas e festas populares. A experiência mudou meu modo de criar, influenciou definitivamente minha produção musical. Estou feliz com a próxima turnê brasileira. Sempre quis voltar ao Brasil, é um país importante para mim.
Jornal do Brasil: E tem ouvido música brasileira recentemente?
- Sempre! A música brasileira é algo presente em minha vida. Gostaria de trabalhar com Ivan Lins, Djavan e Milton Nascimento.