A maior história de sucesso do teatro francês aconteceu no limiar da chegada do cinematógrafo dos irmãos Lumière. A peça “Cyrano de Bergerac”, de Edmond Rostand, apresentada em 1897, inspirada no escritor e duelista Hector Savinien de Cyrano de Bergerac, seria um divisor de águas pela ousadia da montagem e texto, mas, também pela incrível história de seus percalços para ser realizada. Em “Cyrano Mon Amour”, o diretor e roteirista Alexis Michalik, cria a atmosfera certa para contar a história do dramaturgo Edmond Rostand (Thomas Solivérès), que, com apenas 29 anos, casado e com dois filhos, está sem inspiração e não escreve nada que possa significar sucesso há um bom tempo. Precisando urgentemente trabalhar, ele oferece ao ator Constant Coquelin (Olivier Gourmet) uma nova peça. Ele será o narigudo e inspirado Cyrano. Só há um probleminha. O texto ainda não está escrito.
Para fazer seu projeto dar certo, Rostand tem que enfrentar a crise criativa, caprichos de uma estrela dos palcos (Mathilde Seigner), que será a Roxanne, e as exigências absurdas dos seus produtores. A solução vem da inspiração de um relacionamento amoroso. Com seu texto romântico e refinado, Rostand acaba sendo uma espécie de Cyrano do amigo ator Léonidas Volny (Tom Leeb). Bonito, mas sem as palavras certas para conquistar Jeanne (Lucie Boujenah), Volny consegue a atenção da jovem não por seus méritos e aparência, mas pelas cartas e recitais de Rostand. Nessa comédia de erros, evidentemente, a mulher do escritor vai ficar desconfiada e com ciúmes dele. No entanto, a confusão, na vida e nos palcos, resulta numa ideia ousada.
Vários acontecimentos poderiam ter inviabilizado essa encanação histórica. Tudo isso torna o filme muito divertido e o interesse nunca é disperso. Há uma representação da diva Sarah Bernhardt, a reconstituição da época é caprichada e a contextualização do medo do cinema tirar o público dos teatros remete ao tempo que se pensou que o rádio morreria com a chegada da TV ou mesmo agora que o streaming possa reduzir a frequência nas salas de cinema. Uma reflexão que vale para entender que a experiência de imersão nos palcos ou na sala escura com projeção na telona, é fundamental para os amantes dessas artes.
Há aqui e ali uma queda de ritmo e a opção errada de redução da personagem da esposa, que fica um pouco esquecida em dado momento, e uma cena que sai do teatro em momento muito mais orgânico e vai para uma locação. Escolha desnecessária. No mais, "Cyrano Mon Amour" é uma experiência divertida e refinada na sala de cinema.