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O movimento do cinema nas cores quentes de Almodóvar

Cineasta lança "Dor e Glória" com aplausos do público e da crítica

Divulgação -
Pedro Almodóvar
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Aos 69 anos, Pedro Almodóvar Caballero, o mais aclamado cineasta espanhol desde Luis Buñuel, está lançando com aplausos do público e da crítica “Dor e Glória”, sua vigésima segunda assinatura de direção e roteiro. Um caráter autoral de realizador, que, ao lado de nomes como Martin Scorsese e Woody Allen, tem selo de qualidade no cinema contemporâneo. Nesse momento de maturidade, Almodóvar confiou a seu ator-fetiche Antonio Banderas, a interpretação de seu alter-ego no novo filme. Uma revisão do passado e um testamento do cineasta que nos primeiros trabalhos dedicou-se ao gênero comédia. Filmes como “Pepi, Lucy, Bom e Outras Garotas de Montão”, de 1980, foram representativos do período de redemocratização da Espanha. O país se libertara cinco anos antes da ditadura Franco e o diretor queria retomar elementos fundamentais da sociedade espanhola após o sofrimento com regime repressor.

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Pedro Almodóvar celebra 45 anos de carreira em grande forma (Foto: Divulgação)

Se o caminho inicial foi o humor, o drama tomaria conta do seu repertório a partir de 1999 com um marco na carreira. “Tudo sobre minha mãe”, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro, era o casamento do cinema clássico, do melodrama, com temas urgentes como a doação de órgãos e a Aids. Era como um sino que tocava, despertando as mulheres na tomada de consciência de seu papel, independente das ações dos homens. Na trama, a personagem Manuela (Cecília Roth) sofre com a morte acidental do filho, fã da atriz Huma Rojo (Marisa Paredes), que estrela nos palcos como Blanche Dubois, numa montagem de “Um bonde chamado desejo”. A dor e a solidão profunda de Manuela será a própria reflexão clássica de Blanche: depender da bondade de estranhos. No caso, Manuela encontra a solidariedade através de uma série de mulheres que vai conhecendo.

Pedro Almodóvar cria uma cumplicidade com o espectador através das mais ousadas provocações. Desejo é a palavra que gravita o cinema dele. Não por acaso, El Deseo é o nome da produtora do diretor. O combustível de criação é, principalmente, a complexidade do universo feminino e o desejo que envolve essa composição. Almodóvar trabalha drama e comédia, o kitsch e o sofisticado, o acaso e o destino através desse matriarcado. A criação é fruto de um bom ouvidor. A infância, além da presença da mãe, foi rodeada de muitas mulheres. Para Almodóvar, ouvir as mulheres foi fundamental para a obra dele. O que elas conversavam entre si. O modo como se expressavam e pensavam. Ele criou roteiros inspirados nessas observações. A mulher em movimento é a grande energia de seus filmes. Segundo ele, quando elas estão em movimento, muitas coisas acontecem ao redor.

A originalidade dessa visão deu ao criador o reconhecimento do mercado internacional e no americano, em especial. No entanto, Pedro recusou Hollywood e preferiu continuar fazendo filmes na Espanha. Seus personagens são universais, mas têm a forma, as cores e a alma da linguagem hispânica. A expressão das palavras adoráveis de Agrado (Antonia San Juan), em “Tudo sobre Minha Mãe” ou do terrível Dr. Robert Ledgard (Antonio Banderas), em “A Pele que Habito” estão no centro de um cinema de autor. Assinatura de Almodóvar é espanhola. Um cinema de sotaque latino e inspiração de um realizador que cria seus personagens como um figurinista que vai provando seus trajes e experimentando as medidas para falar de violência (“Ata-Me” e “Kika”), repressão religiosa (“A Má Educação”), abandono e redescoberta (“Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos” e “A Flor do Meu Segredo”), encontro e refúgio (“Fale com Ela”).

Pedro, como bom ouvidor nos últimos 45 anos, transformou em imagens os desejos e os medos do nosso tempo. Que continue colorindo a tela.

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almodovar | filme