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A descendência têm seu encanto

Cotação: * * * * (MUITO BOM)

Divulgação -
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Depois da menção honrosa em Cannes e do prêmio de direção no Festival do Rio, o longa de João Salaviza e Renee Nader Messora estreia finalmente em momento oportuno no país, de desqualificação de minorias e de grave apagamento de vozes indígenas. Coprodução portuguesa, o filme representa um olhar de naturalização para a cultura nativa, e trabalha com a ideia da fuga da descendência, tão comum a qualquer jovem moderno. A tentativa de apagar a influência paterna e constituir uma história particular não é prerrogativa de rapazes ou moças ligados ao nosso primeiro povo, fazendo do tema específico do longa identificável a qualquer um.

O protagonista de 'Chuva...' está em processo de receber o bastão que o pai lhe legou, e tornar-se o futuro pajé de sua tribo. Mas ele não quer isso pra si, mesmo recebendo uma mensagem onírica do próprio pai. Ele quer expandir seus horizontes, ir embora da tribo com sua esposa e filho, fixar o seu futuro na cidade longe de sua ancestralidade, negando não apenas suas raízes, mas principalmente uma vocação que parece inerente. Em busca de respostas, foge do seu ambiente pra tentar encontrar um lugar no mundo - ainda que esse seja bem próximo ao seu.

Macaque in the trees
(Foto: Divulgação)

João e Renee conseguem um equilíbrio fino entre as tentativas de reconstrução pessoal ligada ao naturalismo do homem branco, as tradições indígenas que, para eles, são tão comuns quanto as nossas. É uma forma de tentar refugar da rotina do qual ninguém quer sucumbir. Sem negar a importância da vida em comunidade das tribos de nossos habitantes primais, os diretores criam esse elo de ligação entre Ihjãc e sua origem através do pai, que ainda se comunica com ele em cenas repletas de misticismo e beleza.

Colocando em paralelo os dois lados da narrativa e tratando seu protagonista com respeito às suas dúvidas, 'Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos' é mais uma prova do estado atual do nosso cinema - obrigatório, pulsante e criativo, que trata dos mais diversos assuntos com o frescor necessário. Um filme ímpar no meio de uma cinematografia que ainda fala pouco de seus ancestrais, mas que já se mostra livre das obrigações documentais que o tema macro sempre impôs, deixando claro que os povos indígenas também têm seus dias simples.