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Caixa Cultural expõe crônica ilustrada de fatos corriqueiros da vida, que é a tônica da obra de Rafael Sica

Confira entrevista com o quadrinista Rafael Sica

Divulgação -
De Sica acredita que a ausência de diálogos nos quadrinhos potencializa os desenhos que podem ser "lidos" através dos movimentos e expressões corporais dos personagens
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Um rapaz que toca violão alheio ao sono de uma pedinte nas calçadas; um consumidor voraz oprimido por sua compulsão em acumular; uma passageira de ônibus obrigada a mudar de assento para preservar seu direito à introspecção. Cenas como essas integram a Comédia Humana em forma de tiras de quadrinhos que, a partir de hoje, vai tomar conta da Caixa Cultural, numa retrospectiva da poesia gráfica de Rafael Sica. Até o dia 23 de dezembro, quem der uma espiada em sua revisão infortunística dos fatos corriqueiros da vida vai entender por que Sica é respeitado como um dos maiores nomes da HQ brasileira.

Macaque in the trees
De Sica acredita que a ausência de diálogos nos quadrinhos potencializa os desenhos que podem ser "lidos" através dos movimentos e expressões corporais dos personagens (Foto: Divulgação)

Criado em 2007 na web, o blog “Ordinário” (http://rafaelsica.zip.net/) - lotado de expressões gráficas do verbo “viver” feitas sem palavras - fez dele um cronista do dia a dia, com o traço atento à solidão, à incomunicabilidade, às múltiplas modalidades da opressão. Sem um discurso específico ou bandeira em si, as tiras foram compiladas como álbum pela Cia. Das Letras, em 2011. E ele chegou a ser laureado duas vezes com o Prêmio HQ Mix (a maior honraria brasileira para quem faz gibis ou tiras), nas categorias Novo Talento (2005) e Web Quadrinhos (2009).

Macaque in the trees
De Sica acredita que a ausência de diálogos nos quadrinhos potencializa os desenhos que podem ser "lidos" através dos movimentos e expressões corporais dos personagens (Foto: Divulgação)

Idealizada sob a curadoria de Weaver Lima, a exposição da Caixa Cultural contará com mais de 200 obras do artista gráfico gaúcho, que, na abertura, vai desenhar um painel de 8m x 3m a partir das 15h, para “ilustrar” o evento com sua estética. Logo depois, a partir das 19h, Sica vai lançar uma revista, com distribuição gratuita para o público. Na entrevista a seguir, o artista fala sobre a ausência de balões em suas HQs e avalia os sentidos diferentes que a palavra “mercado” pode ter para a representação do ordinário.

Macaque in the trees
Rafael Sica (Foto: Divulgação)

JORNAL DO BRASIL: Qual é o papel do silêncio e da solidão na sua produção de quadrinhos?

RAFAEL SICA: Aos poucos fui subtraindo a palavra do meu trabalho. Ainda escrevo em alguns desenhos, mas muito pontualmente. Fui percebendo, com o fazer do trabalho, que a ausência de diálogos potencializava o desenho. Existe um texto ali, mas é texto que vem da expressão corporal dos personagens, dos cenários, dos enquadramentos etc. Acho que esse silêncio na narrativa abre mais portas para o leitor interpretar e entender, ou não o trabalho. É uma espécie de diálogo mais amplo entre o leitor e o artista, mesmo que não seja verbal.

Qual é o repertório poético de vivências que compõe o conjunto de desenhos dessa exposição?

A mostra se divide em séries. Trabalho muito assim. Vem da minha vontade de ver sempre os trabalhos impressos. Elas, em sua maioria, já foram publicadas, mas há também muitos desenhos inéditos, além de muito material de rascunho e pesquisa. Em todas as séries estão presentes os mesmos temas: o comum, o dia a dia, o ordinário e as questões políticas, de costumes e existenciais do ser humano. Sempre tento trabalhar a narrativa de uma maneira diferente entre um trabalho e outro e isso também fica bem visível observando o conteúdo da exposição.

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De Sica acredita que a ausência de diálogos nos quadrinhos potencializa os desenhos que podem ser "lidos" através dos movimentos e expressões corporais dos personagens (Foto: Divulgação)

Como você vê a expressão autoral no quadrinho nacional hoje? Como anda o mercado?

Essa palavra “mercado” me faz pensar em bancos e investidores: tudo o que vem acabando com a nossa existência durante anos e anos. Os quadrinhos, olhando por esse ponto de vista de lógica de mercado, sempre correram por fora. E sempre correram muito bem como expressão autoral. Temos muitas e muitos desenhistas incríveis com trabalhos autênticos e que não devem nada a qualquer lugar do mundo onde o quadrinho é mais respeitado. Hoje, existe uma quantidade de feiras de publicações independentes, de artes gráficas de uma maneira geral, e o quadrinho está muito presente nelas. E como protagonista. Frequentar essas feiras é uma ótima maneira de conhecer o trabalho que vem sendo feito por esses artistas.

*Roteirista e crítico de cinema

Divulgação - De Sica acredita que a ausência de diálogos nos quadrinhos potencializa os desenhos que podem ser "lidos" através dos movimentos e expressões corporais dos personagens
Divulgação - Rafael Sica
Divulgação - De Sica acredita que a ausência de diálogos nos quadrinhos potencializa os desenhos que podem ser "lidos" através dos movimentos e expressões corporais dos personagens