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Saudades do mestre

Cinemateca do MAM celebra 90 anos do diretor Nelson Pereira dos Santos com exibição de clássico

Divulgação -
Nelson Pereira dos Santos morreu em abril
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Pai do cinema moderno no Brasil, festejado entre seus colegas imortais da Academia Brasileira de Letras (ABL) por seu empenho em prol da difusão do filme nacional em variadas latitudes, o diretor Nelson Pereira dos Santos (1928-2018), morto em 21 de abril, comemoraria hoje seus 90 anos. O parabéns a ele e a seu legado, num gesto de saudade da classe cinematográfica, será cantado, às 19h, na Cinemateca do MAM, ao largo da exibição de um dos maiores sucessos do cineasta: “Vidas secas” (1963), baseado na obra homônima de Graciliano Ramos. Exibido no Festival de Cannes de 1964, na disputa pela Palma de Ouro, o filme, que saiu da Croisette com o Prêmio Humanitário da Organisation Catholique Internationale du Cinéma et de l’Audiovisuel, completa 55 anos agora em 2018.

A sessão desta noite, que marca a inauguração do novo projetor digital 4K laser da Cinemateca, vai contar com a participação do fotógrafo do longa, o produtor Luiz Carlos Barreto, e a filha do realizador, Marcia Pereira dos Santos. O evento é organizado pela Associação Brasileira de Cinematografia (ABC) em parceria com o MAM Rio, a Afinal Filmes, a Visom Digital, a Barco Filmes, a Naymar e a Regina Filmes.

Macaque in the trees
Filmado a partir da obra de Graciliano Ramos, "Vidas secas" concorreu à Palma de Ouro em Cannes em 1964. O filme será projetado em novo projetor digital da Cinemateca (Foto: Divulgação)

A partir de sábado até o dia 25/11, o MAM continua a homenagem com o “Curso e Mostra Petrobras de Cinema 4xNelson”, que será ministrado pelo conservador-chefe da Cinemateca, Hernani Heffner. O curso tem 180 vagas e é gratuito.

Em sua última entrevista ao JB, Nelson contou: “Continuo gostando do Graciliano da mesma forma. Outro dia estava relendo um de seus livros, ‘Angústia’. Taí uma adaptação para o cinema que gostaria de ter feito”, disse o realizador, que terá seu aniversário festejado ainda no Canal Brasil. Em tributo ao diretor, a emissora vai iniciar nesta madrugada uma retrospectiva com 14 longas, sempre de segunda pra terça, à 0h15. Até janeiro, o espectador vai rever marcos como “Memórias do cárcere” (1984); “Mandacaru vermelho” (1961); “Tenda dos milagres” (1977) e “O amuleto de Ogum” (1974).

A abertura será com “Rio 40 graus” (1955), que vai ganhar sessão durante o Festival do Rio (1 a 11 de novembro) em tributo ao cineasta. “Para a minha geração, Nelson significou independência, liberdade, pensamento fundamentado em bases humanistas e o prazer da prática cinematográfica. Filmar com ele era como embarcar em um carrossel de alegria e criatividade. Para mim, particularmente, sua importância foi definitiva na minha escolha pelo cinema”, lembra a diretora e atriz Ana Maria Magalhães, que estrelou um dos maiores sucessos do cineasta, “Como era gostoso o meu francês” (1970), incluído na mostra do Canal Brasil.

Curador da Cinemateca do MAM e integrante da Associação de Críticos do Rio de Janeiro (ACCRJ), Ricardo Cota lembra que projetar as pérolas de Nelson é afirmar a força poética do audiovisual brasileiro. “Ele descerrou a cortina do cinema brasileiro para o mundo. Tinha um olho para a história do cinema brasileiro passado e fundou a história do cinema contemporâneo. Sem Nelson, não haveria cinema brasileiro”, sustenta Cota.

Macaque in the trees
Nelson Pereira dos Santos morreu em abril (Foto: Divulgação)

Baiano de Junco (cidade hoje chamada de Sátiro Dias), o escritor e imortal da Academia Brasileira de Letras Antônio Torres, autor do premiado “Essa terra”, conferiu a releitura de Nelson para o clássico de Graciliano numa passagem por São Paulo. “Vi ‘Vidas secas’ pela primeira vez num cinema do Largo do Paissandu. A casa estava lotada de nordestinos, visivelmente identificados com a história. Quanto a mim, jamais iria esquecer o impacto que o filme me causou. Daí para a frente eu não iria perder nenhum dos outros feitos por ele. O que mais me impactou foi a sequidão - da luz, da terra, das relações humanas, enfim, da vida, de que a morte da baleia se torna um símbolo indelével”, lembra Torres.

Responsável pela projeção de clássicos da América Latina nos EUA como programador da sala The Public Theater, em Nova York, Fabiano Canosa testemunhou o sucesso popular da estética de Nelson em solo americano. “Gerry O’ Grady é um dos mais intensos agentes culturais das Universidades nos Estados Unidos. Ele fundou o Media Study Center, na Universidade de New York e, através dele, os grandes nomes da Avant-Garde internacional tiveram a oportunidade de participar de seminários, dar cursos de cinema experimental, etc. Foi nesta época que eu mostrei ‘Vidas secas’ na Universidade América. Era início dos anos 1970. Ao ver o filme, O’Grady me falou, emocionado: ‘O filme dispensa dialogo. Visualmente, e o filme mais contundente que ja vi’. Mais tarde, Nelson Pereira e Gerry se tornaram grandes amigos e O’ Grady planejou e editou o programa em forma de tabloide que produzimos juntos para a retrospectiva que fiz dos filmes do Nelson, meu mentor, no Public Theater”, diz Fabiano Canosa.

Antes de fazer “Rio 40 graus”, Nelson trabalhou no JORNAL DO BRASIL como copidesque. No livro “Meu compadre cinema – Sonhos, saudades e sucessos” (2005) ele falou com carinho de sua passagem pelo jornalismo: “Era revisor, trabalhando diariamente na redação da Avenida Rio Branco. O JB foi muito generoso comigo quando quis partir para filmar e me liberou sem problemas”, disse o diretor. “Levei para o cinema valores que simbolizavam a força do povo brasileiro”.

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Serviço

EXIBIÇÃO DE “VIDAS SECAS”
Abertura dom Cacá Diegues - Hoje - 19h - Entrada franca
CURSO E MOSTRA PETROBRAS DE CINEMA 4XNELSON
Cinemateca do MAM (Av. Infante Dom Henrique, 85 - Parque do Flamengo). De 27/10 a 25/11 - 9h às 13h - Informações: atendimento@mamrio.org.br - Inscrições até quinta pelo link https://goo.gl/forms/JWR9dJeZjvcWOKfr1- Gratuito

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*Roteirista e crítico

Divulgação - Filmado a partir da obra de Graciliano Ramos, "Vidas secas" concorreu à Palma de Ouro em Cannes em 1964. O filme será projetado em novo projetor digital da Cinemateca
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