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Ponte Londres-Niterói: Coletânea da Midsummer Madness apresenta 30 anos de indie brasileiro à cena inglesa

Divulgação -
O MAC, em Niterói, na capa da compilação, nem existia quando selo foi fundado
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O Museu de Arte Contemporânea que ilustra a capa da coletânea “Tropical Fuzz: Brazilian Guitars 1988-2018” ainda nem existia em 1989, quando Rodrigo Lariú, então morador da Boa Viagem, Niterói, criou seu fanzine Midsummer Madness. Dois anos depois, ele passou a vender fitas com coletâneas de bandas junto com o zine – o qual extinguiu em 1994, vertendo o MM em um selo que lançava fitas de grupos independentes dos quais gostava, em sua maioria na linhagem de psicodelias e guitarras com efeitos que marcou o underground da virada das décadas de 1980 e 1990.

Só dois anos depois, em 1996, o MAC foi inaugurado, o que dá ideia da resiliência do produtor, que agora lança a compilação de bandas que gravaram pelo selo, com 22 músicas em CD físico e 50 na versão digital. A digital se antecipa em um ano em relação ao marco zero do MM por incluir a música “Lollipop”, da primeira fita da banda Killing Chainsaw, de Piracicaba (SP), gravada em 1988 e depois incorporada ao selo.

Macaque in the trees
Com uma faixa em Tropical Fuzz, Fabrin nasceu no ano que MM virou selo (Foto: Divulgação)

“Como em novembro passado eu me mudei para Londres, resolvi fazer uma coletânea com 50 bandas para apresentar aos gringos”, conta Lariú, que partiu com o objetivo de “conhecer de perto o mercado musical daqui, bem mais maduro que o brasileiro”.

O interesse combina com o cast do Midsummer Madness. A maioria das bandas do selo canta em inglês, o que já causou problemas, como em 1998, quando o idioma britânico foi alegado para limar Pelvs e Cigarettes do festival Abril Pro Rock, no Recife, para o qual haviam sido convidadas – e que, na edição anterior, teve o Sepultura.

Àquela altura, o que já parecera uma onda rumo ao mercado externo, iniciada pela banda mais famosa banda brasileira de metal, já se quebrara, e produzir bandas que cantavam – e soavam – como estrangeiras, havia virado questão de diletantismo. Que persiste.

Macaque in the trees
Samba dada, do Casino, chegou a ser tocada em rádios FM de rock e MPB (Foto: Divulgação)

“Mostro a coletânea a toda viv’alma que aparece na minha frente e parece minimamente interessante ou interessado. Bandas, bookers, casas de shows, blogs, rádios e até para selos que eu sempre admirei. Não dá para saber ainda o que eles acharam. A reação é sempre de surpresa, do tipo ‘um selo shoegazer no Brasil com 30 anos?’”, responde Lariú, sobre a recepção da “Tropical Fuzz”, citando o termo dado aos músicos que tocavam olhando para o chão – por timidez, marra ou por usarem muitos pedais em suas guitarras. “Mas não tenho altas expectativas. Aprendi com estes 29 anos que o que você acha incrível, sensacional e imperdível pode ser apenas mediano ou horrível para a outra pessoa”, pondera.

Se no Brasil havia dificuldades com o idioma, fora dele havia com a distância, lembra o produtor, sobre os esforços para lançar bandas do MM. “Sempre tentamos. Já lançamos ou distribuímos algumas vezes no passado. Não deu em nada, exceto por alguns discos e compactos super caros no Discogs”, brinca, frisando que isso também é problema para bandas de países anglófonos. “É muito difícil lançar banda em outro país sem que a banda esteja nesse país. Vejo isso direto aqui na Inglaterra: as bandas norte-americanas ou australianas que estão sendo lançadas por selos daqui, vêm sempre fazer shows e ações promocionais. Ou seja, lançar uma banda brasileira na Inglaterra significa investir para que ela esteja aqui promovendo o lançamento. E isso custa bem caro. O plano não é esse. Vejo o Midsummer Madness com um selo de catálogo, de colecionador. Queremos continuar registrando e lançando bandas brasileiras dentro de um determinado estilo (shoegazer, dream pop, indie rock). E queremos que o selo seja referência nisso”.

Macaque in the trees
O MAC, em Niterói, na capa da compilação, nem existia quando selo foi fundado (Foto: Divulgação)

No Brasil, acabou que já é, há algum tempo. A mesma Pelvs que foi desconvidada do festival recifense abre “Tropical Fuzz” com a solar “Even if the sun goes i’ll surf”, de 2001 – época em que era tocada, e cantada, como qualquer canção de banda gringa em pistas de festas do segmento como a finada A Maldita, na Casa da Matriz, em Botafogo.

Como de costume em selos independentes, há alta confluência entre os artistas, muitos deles amigos próximos. Vizinha de Lariú em Niterói, Bia Lamego, autora da capa de “Tropical Fuzz”, integrou o Stellar, incluída nas duas coletâneas com a gravação mais antiga do CD físico – “Sometimes things can’t be said”, de 1995. Outro integrante do Stellar, o guitarrista Fábio Leopoldino – morto em 2009, aos 46 anos – integrara o Second Come, também presente, com a faixa “Shoes”, e cujo ex-baixista, Francisco Kraus, comparece com “Living among the stars”.

Tal como o Second Come – que, em 1993, inaugurara o selo Rock It!, de Dado Villa-Lobos e André X –, a compilação tem bandas já haviam gravado passaram depois para o Midsummer Madness. São os casos da paulistana Pìn Ups (“Guts”) e da brasiliense Low Dream (“From the ocean inside”). Também é o do Fellini, único grupo que o MM pegou de uma geração anterior e dos poucos que cantam em português – “Gravado no Rio” é de 2002, ano em que se reformou a banda formada em São Paulo em meados dos anos 1980.

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A banda Pelvs, em sua formação de 2001, quando gravou a música que abre os álbuns (Foto: Divulgação)

Presente só na versão digital, “Samba Dada”, do Casino, é outra faixa obrigatória em português, que chegou a tocar tanto na Fluminense quanto na MPB FM, no início dos anos 2000.

Sem saudosismo, o selo que já contabiliza 153 EPs, 58 álbuns e 43 compactos de mais de cem grupos e artistas solo brasileiros, dois da Argentina e uma coletânea dos ingleses Telescopes, segue lançando gente nova. O multi-instrumentista paraense Frabin, cuja “Kids from outer space” é uma das boas novidades incluídas em “Tropical Fuzz”, nasceu em 1994, quando, já em seu quinto ano de idade, o Midsummer Madness se consolidava como selo.

As duas versões da coletânea “Tropical Fuzz” podem ser ouvidas e compradas através do site httpss://midsummermadness.bandcamp.com.

Divulgação - A banda Pelvs, em sua formação de 2001, quando gravou a música que abre os álbuns
Divulgação - Com uma faixa em Tropical Fuzz, Fabrin nasceu no ano que MM virou selo
Divulgação - Samba dada, do Casino, chegou a ser tocada em rádios FM de rock e MPB
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