Um projetor cinematográfico Ernemann 35 milímetros VIII B, da década de 1950, é uma máquina composta por ferro e ferro fundido de quase dois metros de altura e 250 quilos. Um telefone Iphone 4, lançado em 2010, mede 11,5 cm e pesa 137 gramas. Para o conservador-chefe da Cinemateca do MAM, Hernani Heffner ambos os dispositivos se vinculam e integram a história do cinema pela capacidade de exibir imagens em movimento. “Conseguir entender essas conexões é fundamental para ultrapassar o fetichismo da tecnologia e entender como ela de fato se desenvolve”, disse.
Para tornar compreensíveis esses vínculos ao longo da história e como isso se transmuta em imagens, o MAM inaugura hoje, às 15h, a exposição “Galáxia (s) do Cinema – Máquinas, Engrenagens, Movimentos ou This strange little thing called love”, com curadoria de Hernani. A mostra promove uma viagem desde o pré-cinema até imagens digitais a partir de equipamentos, maquinismos e peças que, de alguma maneira, “dão conta da evolução da tecnologia cinematográfica e evidenciam a relação com a criação estética do filme”.
O acervo provém da coleção da Cinemateca do MAM, estimada em mais de duas mil máquinas, e de um garimpo com instituições, produtoras e colecionadores. Com cerca de 400 peças espalhadas pelo Salão Monumental, a exposição é segmentada por áreas como fotografia, montagem, conservação, projeção e som.
A mostra faz parte das comemorações dos 70 anos do MAM, em função da relevância da Cinemateca para o museu. Embora só tenha inaugurado sete anos depois, a sala de cinema já constava no projeto original. O MAM já sediou outras exposições sobre cinema, mas esta é primeira vez que exibe a maquinaria da arte.
O curador afirma que a exposição atende a uma antiga paixão pessoal pela tecnologia. O modo de feitura sempre foi o aspecto que mais lhe interessou no cinema, assegura. “Tão fascinante quanto assistir a um filme como um objeto artístico é imaginar quais foram os processos que levaram ao resultado. Pela observação da tecnologia, é possível perceber como ela se insere na sociedade e como se desdobra nas imagens”.
Um exemplo disso, aponta Hernani, são as mesas de montagem. Originalmente, o operador trabalhava de pé, em um equipamento vertical. Na década de 1920, o italiano Attilio Prevost teve a ideia de realizar o procedimento sentado. A mudança foi simples, mas decisiva. “Foi uma mudança meramente conceitual: ao invés de se trabalhar na vertical, passou-se para a horizontal. Isto, entretanto, ajudou a indústria do cinema. Como os montadores agora estavam sentados, podiam trabalhar por muito mais tempo”.
Uma das mesas concebidas por Prevost é uma das raridades exibidas. Os destaques incluem também equipamentos históricos como a câmera comprada por Adhemar Gonzaga para os estúdios da Cinédia em 1929, utilizada em clássicos como “Ganga bruta”, de Humberto Mauro (1933), e “It’s all true”, o inacabado filme brasileiro de Orson Welles. Estão lá ainda o equipamento que Luiz Carlos Barreto empunhou em “Terra em transe” (Glauber Rocha, 1967) e o de “Cabra marcado para morrer”, de Eduardo Coutinho.
Há, ainda, obras das origens científicas do cinema, com fotografias instantâneas produzidas pelos pioneiros Eadweard Muybridge e Étienne-Jules Marey na década de 1880. Antes da invenção do cinematógrafo pelos irmãos Lumière em 1895, o cinema dizia respeito ao estudo do movimento e à fisiologia humana. Dentre as visões do futuro, a exposição tentou obter óculos de “realidade virtual”, mas não conseguiu por falta de recursos.
Hernani diz saber que as relações entre a maquinaria e os filmes não são evidentes para qualquer espectador e, em razão disso, vai oferecer visitas guiadas às 16h das quartas-feiras, quando a entrada do museu é gratuita. Será uma boa oportunidade para ouvir um dos maiores especialistas na sétima arte do país, grande contador de histórias, que atualmente cuida do acervo de 100 mil rolos e 40 mil fitas e DVDs.
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SERVIÇO
GALÁXIA(S) DO CINEMA. MAM (Av. Infante Dom Henrique, 85 - Parque do Flamengo; Tel.: 3883-5600). De ter. a sex., das 12h às 18h; sáb. e dom. das 11h às 18h. R$ 14. Até 4 de novembro.