A favela, desde sua origem, no então morro da Favela em 1897, sempre foi considerada como um problema para cidade. Durante muitos anos esses espaços foram abandonados pelo poder público e as soluções apresentadas pelo governo visavam sempre às remoções, inclusive criminosas, e não adequações em espaços habitáveis.
A favela e seus moradores sempre conviveram com o prejulgamento e a segregação e, muitas vezes, ainda são relacionados aos problemas de ordem urbana pelo viés da violência e do tráfico de drogas. Favela e favelado, por vezes, representam categorias de acusação. Uma pesquisa do Data Favela (2015), revelou que 51% dos das pessoas entrevistadas afirmaram que as primeiras palavras que lhes vêm à mente quando ouvem falar de favela são droga e violência.
No entanto, com os recentes movimentos midiáticos de glamourização da favela, muitos elementos culturais desses espaços estão sendo usados por outros grupos que não conhecem a realidade da favela. Em síntese: a cultura da favela, muitas vezes, é negada sobre seus aspectos reais em seu dia a dia e, é cooptada por outros suportes midiáticos e do consumismo, por meio da apropriação cultural, que faz uso de alguns de seus símbolos.
O jovem rico veste a camiseta da grife com letras grandes estampando o nome “Favela”, comercializada por quase R$ 100, um preço não acessível a muitos moradores da favela, e vai para eventos nomeados de “baile de favela”, mas que acontecem no asfalto com ingressos com preços altíssimos. Além de se divertir e carregar uma realidade que não o pertence, este jovem, na maioria das vezes, nem mesmo conhece a realidade da vida na favela. Além das grifes nacionais, outras empresas fazem uso de elementos da favela, uma camiseta de uma marca francesa com a estampa “Favela 74”, custava cerca de 390 dólares em um site. A favela da Rocinha, também serviu de inspiração a uma dupla de designers que criaram a Cadeira Favela comercializada por cerca de 7 mil euros.
As favelas são locais que apresentam uma multiplicidade de manifestações culturais, mas usa-las apenas como elemento decorativo, esquecendo a verdadeira realidade e as dificuldades enfrentadas por quem ali habita é se apropriar de uma cultura e ganhar dinheiro às custas da desigualdade e da pobreza. Enquanto as empresas e grifes acumulam fortuna às custas da nossa realidade, os moradores continuam sofrendo com os diversos problemas comuns a todas as comunidades.
* Davison Coutinho, morador da Rocinha desde o nascimento. Bacharel em desenho industrial pela PUC-Rio, Mestre em Design pela PUC-Rio, membro da comissão de moradores da Rocinha, Vidigal e Chácara do Céu, professor, escritor, designer e liderança comunitária na Comunidade