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Acordo Mercosul-UE: vitória da diplomacia

Brasil perdeu quando PT ignorou acordos comerciais

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Esse importante acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, que abre as fronteiras do maior mercado consumidor do mundo (com 27 países) a produtos agrícolas e industriais brasileiros e seus vizinhos é uma vitótia da diplomacia dos dois lados do Atlântico, do Brasil, dos vizinhos e dos europeus. Demorou quase 19 anos para ser fechado por culpa do PT. No início do seu 1º governo, em 2003, Lula seguiu o exemplo de Hugo Chaves da Venezuela que rejeitou grosseiramente a Aliança de Comércio da América (Alca) dizendo “Alca, al carajo”.

O acordo que daria preferência, com baixa tributação, a produtos brasileiros no mercado americano, negociado desde o governo FHC com a administração Bill Clinton, foi arquivado. Lula, que tinha se encontrado com George W. Bush entre a eleição e a posse, se recusou a receber o representante do Departamento de Comércio dos Estados Unidos, Robert Zoelick, alegando que “ não ia conversar com o sub do sub“. Mais tarde, Zoelick foi indicado para a presidência do Banco Mundial e Lula o recebeu, em Brasília.

Do mesmo modo ficaram congeladas as negociações com a União Europeia. No período não só o Brasil perdeu espaço no mercado americano e na União Europeia, cujo número de sócios aumentou de uma dúzia, em 2002 para as atuais 28 nações (de um total de 50 nações europeias, das quais ainda estão fora parceiros comerciais importantes, como Rússia e Turquia. Vários industriais brasileiros, para não perder acesso ao mercado americano, transferiram fábricas para países da América Central, como a Costa Rica, que recebeu pelos menos duas fábricas de produtos têxteis e de confecção. Mais importante, o Brasil ficou meio que à margem das novas cadeias produtivas de mantufaturados.

Vale lembrar que no começo deste século, em 2002, os EUA e uma União Europeia ainda encolhida respondiam por 25,3% e 25,9%, respectivamente, das exportações brasileiras (que chegaram a US$ 60,3 bilhões naquela ano). A China importava apenas US$ 3 bilhões, ou 4,9% das vendas brasileiras. Era menos que o conjunto do Mercosul, que importara US$ 3,3 bilhões (5,5%).

No ano passado, para um total de US$ 239 bilhões exportados pelo Brasil, a China importou US$ 66,5 bilhões (27,8%, exatamente o que cabia aos EUA em 2000). Mas a UE, mesmo com o elenco ampliado, teve sua participação encolhida para 17,6% (US$ 42,1 bilhões) e os Estados Unidos absorveram US$ 28,8 bilhões, ou 12% das exportações brasileiras. O conjunto do Mercosul importou US$ 20,9 bilhões, ou apenas 8,7%.

A ascendência da China no comércio mundial foi aproveitada pelo Brasil, mas de maneira ilusória. O gigante asiático, que na metade da 1ª década desbancou o Japão e a Alemanha como 2ª e 3ª potências econômicas, passou a importar matérias primas agrícolas (soja, açúcar, carnes) e minerais do Brasil (minério de ferro, petróleo bruto) e bens intermediários (celulose) e a vender bens manufaturados de maior conteúdo tecnológico a preços imbatíveis. Mas a expansão das vendas brasileiras para a China não mudou o placar: devido ao baixo conteúdo tecnológico de seus produtos, o Brasil segue há quatro décadas com apenas 1,2% de participação nas exportações mundiais.

O preço do baixo investimento em educação

Vários outros países asiáticos cresceram substancialmente mais que o Brasil. A Coreia do Sul é o maior exemplo. Em 2918 participava com apenas 0,5% das exportações mundiais e o Brasil tinha os mesmos 1,3% de hoje. Mas, graças a investimentos em educação nos anos 60 e 70, houve massa crítica para o salto tecnológica de empresas que foram as empreiteiras que lideraram a reconstrução do país, apoiada pelos EUA, após a trégua na guerra entre as duas Coreias. Hoje, o país se aproxima dos 3% do comércio mundial.

No Brasil, as empreiteiras, cuja prática de superfaturamento e cooptação do Estado foi desnudada na Lava Jato, investiram em projetos de menor impacto tecnológico, até porque a massa crítica saída de universidades e escolas técnicas brasileiras sempre teve baixa conexão com o mundo empresarial, salvo exceções que confirmam a regra. Ao não priorizar a educação no século 20 e 21, a elite brasileira é a principal responsável pelo atraso do país.

Um exemplo da mudança do perfil da economia mundial, com muitas atividades fabris se deslocando para a China (no caso da indústria eletrônica e de informática ou ainda a indústria têxtil e de confecções, que também se espalhou por outros países asiáticos e a Turquia) pode ser medido pela comparação entre participação de Japão e Coreia nas exportações brasileiras. Em 2002, a Coreia do Sul importou US$ 845 milhões e o Japão, US$ 2,471 bilhões. Pois no ano passado as compras se aproximaram: US$ 4,3 bilhões do Japão e US$ 3,4 bilhões da Coreia.

Processo é demorado; pior foi tempo perdido

Há quem observe, como o próprio presidente Bolsonaro admitiu, que os acordos (que precisam ser referendados pelos governos dos países do Mercosul e da EU) só terão efeitos a partir de três anos. E os processos de redução de tarifas de importação (para evitar a quebra de indústrias brasileiras sem capacidade de competir pode se estender por até 15 anos).

Mas a existência de um novo horizonte de negócios pode antecipar projetos que ficaram adormecidos. Exportadores que já atuam no mercado europeu não vão esperar três anos para ampliar a capacidade de produção.

Se os acordos demoram tempo para terem efeito prático, dá para se imaginar o tempo perdido pelo Brasil por ter mantido sua economia tão fechada. Se alguma coisa serve de consolo, o interregno da guerra comercial entre EUA e China pode abrir espaço de negociação ao Brasil na UE.

Valeu a pena retardar abertura da economia?

É aqui que cabe uma discussão: valeu a pena adiar o encontro com a verdade da competição do mercado internacional? Valeu a pena o by pass da parceria com a China? O exame da pauta de exportação do Brasil diz que não.

Há quase 20 anos, a participação dos produtos manufaturados se sobressaía na pauta, sobre os produtos primários. Os bens de alta tecnologia (aviões, equipamentos eletrônicos e de informática e produtos químicos e farmacêuticos) equivaliam a US$ 5,6 bilhões em 2002, ou a quase 25% das exportações de produtos básicos da agricultura.

No ano passado o montante exportado de bens de alta tecnologia sequer dobrou para US$ 10,1 bilhões, enquanto a pauta de produtos primários (agrícolas e minerais) passou a responder por mais de 60% das exportações.

Resumo da história: mais de 500 anos após o descobrimento continuamos trocando matérias primas por espelhinhos e outros badulaques.

Fixação em Conselho de Segurança congela acordos

É bom lembrar que uma fixação dos governos brasileiros desde que o então senador Fernando Henrique Cardoso foi convidado por Itamar Franco para ser ministro das Relações Exteriores (novembro de 1992 a maio de 1993, quando assumiu a pasta da Fazenda) era ter um assento permanente no colegiado ampliado do Conselho de Segurança da ONU, limitado às cinco potências nucleares (EUA, Rússia, França, Reino Unido e China). O argumento era de que o Brasil era a 5ª nação do mundo em população e território e um dos 10 maiores PIBs do mundo.

Esse desejo também virou foco do Itamaraty, sobretudo do governo Lula em diante. Ouvindo o canto da sereia soprado pelo então presidente da Odebrecht, Emílio Odebrecht, com quem redigiu (a não sei quantas mãos) a “Carta aos Brasileiros”, em junho de 2002, Lula foi convencido de que o apoio do BNDES a projetos de empreiteiras e empresas brasileiras no exterior (quinhão que a Odebrecht abocanhou em mais de 60%) iria render substanciais divisas cambiais e votos dos países da América Latina (Central, Caribe e do Sul) e da África em eleições e projetos para a Organização das Nações Unidas.

Como a história ensina, o CS da ONU segue com cinco membros permanentes e a presença de outras cinco nações em sistema de rodízio. Nos grandes fóruns internacionais da ONU, o Brasil disputou na era PT a presidência da Unesco e alguns outros fóruns. Ganhou apenas a presidência da FAO, com Francisco Graziano, um dos idealizadores do “Fome Zero”, trocado pelo Bolsa Família e cujo mandato não foi renovado este ano.

Calotes lembram as polonetas dos anos 80

Os apoios de países da África e AL (muitos deles sob ditaduras à esquerda e à direita) não vieram. E o BNDES e o Banco Central têm dívidas espetadas em volumes maiores que as polonetas dos anos 80.

A eleição, em 2013, do brasileiro Roberto Azevedo, para diretor geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), na qual já atuava como representante do Brasil, teve mais a ver com o peso do país como maior exportador mundial de produtos primários do que por influência política.

Em 2018, no governo Temer, o Brasil ganhou a presidência executiva da Organização Mundial de Saúde.

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