O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

O jogo dos 7 erros da Focus

Publicado em 29/12/2025 às 15:20

Alterado em 29/12/2025 às 15:20

Ser engenheiro de obra feita é fácil. Mas, agora que o ano está terminando, vale a pena conferir o que o Relatório Focus previa para 2025 na última pesquisa do Banco Central junto aos economistas do mercado financeiro e o que ocorreu. E ainda podemos ficar de olho nas previsões para 2026. Além de errar, para mais a inflação: 4,96%, contra 4,32%, dentro do teto da meta, de 4,50%, o mercado errou quase todas as projeções. Vejam alguns erros:


Como se percebe, as projeções negativas em relação à inflação, em boa parte causadas pela situação do dólar, que fechou 2024 acima de R$ 6,00%, levou o mercado a superestimar a inflação deste ano (4,96%, quando a última pesquisa Focus aponta 4,32% e 4,31% na mediana das respostas dos últimos cinco dias úteis – vale dizer que a última pesquisa Focus de 2024 teve 150 respostas de instituições financeiras, consultorias e institutos de pesquisa) e induzir o Banco Central a ser mais rigoroso na política monetária, ao elevar a Selic a 15% em junho, quando a previsão máxima do mercado era de 14,75%. O Comitê de Política Monetária do Banco Central usa a Focus como uma de suas bússolas...

Mas, a bem da verdade, o que explica a sucessão de erros na previsão do PIB (além do pessimismo sempre natural do mercado ante as políticas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad – que operou com precisão cirúrgica este ano) foram as medidas tomadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que tomou posse em 20 de janeiro de 2025 e prometeu tarifaço e restrições a imigrantes.

O tarifaço enfrentou vários recuos perante a China (os EUA são muito dependentes de “chips” e motores movidos a baterias elétricas, ambos feitos com terras raras chinesas. No Brasil, entre idas e vindas, segurou os preços da carne (com restrições às vendas aos EUA) do café – em baixa no mundo todo, superados os problemas climáticos nas safras do Vietnã e da Indonésia).

Entretanto, como o tarifaço não funcionou como esperado e ainda travou as cadeias de produção dependentes de importados, o governo Trump usou a velha tática de enfraquecer o dólar para barrar importações e estimular as vendas de produtos “Made in USA”. O tarifaço, combinado com a desvalorização do dólar, além de segurar a inflação dos bens transacionáveis com o exterior, produziu erros muitos largos nas projeções das contas externas.

Balança comercial e IDPs

As projeções para o saldo da balança comercial de 2025 eram elevadas no final de 2024. Mas o saldo previsto de US$ 74,89 bilhões, minguou para apenas US$ 63 bilhões. Em consequência, o déficit em Contas correntes (balança comercial + serviços + rendas de capitais), previsto em -US$ 50 bilhões está sendo estimado entre US$ 74,87 bilhões e US$ 75,07 bilhões (mediana dos últimos cinco dias úteis).

No entanto, a baixa dos juros nos EUA (que ajuda a enfraquecer o dólar) para estimular a demanda doméstica, na medida que a Selic foi mantida em 15%, aumentou o ingresso de investimentos estrangeiros diretos no país (para fazer arbitragem de juros). O resultado é o dólar e a inflação contidos e as projeções indicam que o IDP somará US$ 79,70 bilhões (bem acima dos US$ 70 bilhões previstos no fim de 2024). E a mediana dos últimos cinco dias úteis elevou a projeção a US$ 80 bilhões, cobrindo o déficit em conta corrente.

No front fiscal o pessimismo do mercado também é superado pela realidade. O mercado sempre reagiu à estratégia do ministro Haddad que compensar os ônus ao Tesouro com o aumento das taxas de juros (o juro real da Selic dobrou em 2025 superando os 10,32%) mediante mais tributação sobre as aplicações financeiras dos rentistas e as instituições financeiras em vez de cortar programas sociais. O mercado reagiu até à tributação das “bets” e “fintechs”, que operavam com baixo capital e alta alavancagem. Haddad teve paciência e foi conquistando quase tudo (a tributação de papéis isentos ficou para 2026).

Em fins de 2024, o mercado previa déficit primário de 0,60% do PIB (o PIB cresceu mais e o déficit nas desandou e deve fechar o ano em -0,50% do PIB, nível de projeção mantido para 2026.

A dependência das 'bets'

Se a Dona “Santinha”, como era conhecida Carmela Leite Dutra, esposa do marechal Eurico Gaspar Dutra, estivesse viva ficaria horrorizada com o alto grau da jogatina no Brasil. Ela se tornou primeira-dama do país, com a posse do marechal na presidência, em 31 de janeiro de 1946. E já, em abril do mesmo ano, estimulou o marido a proibir os cassinos no Brasil.

Mas o “lobby” dos cassinos eletrônicos prosperou no governo Bolsonaro. O jogo nos cassinos em “resorts”, apoiado pelo filho 01, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) não foi aprovado (ainda). Mas a jogatina das “bets”, a maioria em paraísos fiscais, corre solta no país. Patrocinam grandes times de futebol e shows de artistas (ambos recrutados como garotos propaganda). Como patrocinam também os programas esportivos (e dominam os anúncios nos estádios e nos intervalos comerciais dos jogos), “compraram” o silêncio das grandes redes de mídias do país, que se tornaram “apoiadores” ou neutros às campanhas de resistência das “bets” ao cerco tributário à jogatina.

O jornal “O Globo” trouxe em sua edição de hoje, segunda-feira, 29 de dezembro, extensa reportagem que só falta louvar as “bets” como se fossem instituições de caridade e não responsáveis pelo endividamento adicional de uma parte da classe média. Só faltou ter anúncios e o ambiente de cassino da propaganda da MGM bet, veiculada todos os dias nas Organizações Globo.

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