O OUTRO LADO DA MOEDA
Câmbio muda por influências externas
Publicado em 23/07/2025 às 17:54
Alterado em 23/07/2025 às 17:55
Parece acaciano, mas no artigo “Modelos de câmbio e fatores explicativos”, de autoria da economista Paula Magalhães, o Boletim Diário do Bradesco considera, nesta quarta-feira, 23 de julho, que as maiores influências para o câmbio no Brasil vêm de fatores externos. Digo que parece acaciano, mas vale lembrar que uma boa parte do mercado dizia n o ano passado, quando houve a escalada do dólar no segundo semestre que a causa era o desequilíbrio fiscal.
Já era a ameaça do tarifaço da campanha de Donald Trump, favorito, que mexia com os mercados de câmbio em todo o mundo. O governo Trump completou seis meses no domingo e as ameaças de tarifaços continuam assombrando o mundo e o Brasil, sem sinais de adiamento ou negociação antes da data fatal de 1º de agosto. A China ganhou prazo até 12 de agosto.
O Japão fez acordo com nível tarifário de 15% e promessa de abrir seu mercado de automóveis. A União Europeia caminha para acordo no mesmo nível, segundo o “Financial Times”, depois de ameaçar retaliar com 30% três grandes alvos: os aviões da Boeing, que concorrem com o Airbus (franco-britânico), a taxação sobre o Bourbon e restrições aos veículos “made in USA”.
O efeito no câmbio foi imediato. O euro caiu diante do dólar, mas o iene subiu 0,6% e o dólar australiano valorizou 0,63% (porque o país é grande exportador de minérios ao Japão, China e Coreia do Sul. No Brasil, o real valorizou 0,54%, com o dólar cotado a R$ 5,5350, às 13:25 (horário de Brasília).
Desde dezembro, real subiu 15%
Segundo Paula Magalhães, “desde o pior momento no ano passado [17 de dezembro] , a taxa de câmbio chegou a apreciar quase 15%, flertando com o patamar de R$/US$ 5,40 no início do mês, antes do anúncio das tarifas comerciais contra o Brasil. Aquele valor era bastante próximo do câmbio de equilíbrio de longo prazo sugerido pelo nosso modelo estrutural. Apesar disso, os modelos de curto prazo indicam que essa aproximação aos fundamentos se deu majoritariamente por fatores externos – e não por fatores locais”.
E explica: “Para calcularmos o valor de equilíbrio da taxa de câmbio, recorremos a um modelo VEC, que indica uma taxa ao redor de R$/US$ 5,30. Essa classe de modelos analisa relações de longo prazo entre variáveis econométricas que se movem juntas no tempo e mantêm equilíbrio neste horizonte. O modelo sugere que as variáveis que impactam o câmbio de equilíbrio no longo prazo são os termos de troca e o passivo externo líquido em relação ao PIB.
No caso dos termos de troca, quanto mais favoráveis os preços ao Brasil, mais apreciada é a taxa cambial. No caso do passivo externo, quanto maior os compromissos com o resto do mundo, pior é o câmbio real.
O que tipicamente alimenta o passivo externo é o déficit em conta corrente, que tem se ampliado nos últimos anos. Mas é verdade que o tamanho dos déficits registrados no Brasil, inferiores a 3,0%, mexem lentamente o câmbio real no longo prazo, dado que o passivo externo é ligeiramente maior do que 50% do PIB. Os termos de troca costumam oscilar mais. Por fim, vale ressaltar que, por ser um equilíbrio de longo prazo, é muito comum que a taxa de câmbio divirja por períodos
Ainda que a taxa de câmbio tenha se aproximado do valor dos fundamentos, a maior contribuição para a apreciação veio de fatores externos. Para essa conclusão, nos apoiamos em um modelo do câmbio nominal que controla as variações pelo índice do dólar (DXY), diferencial de juros de um ano entre Brasil e Estados Unidos, o CDS, um índice de commodities (CRB) e a uma variável que captura a variação de uma cesta de emergentes.
Para evitar a multicolinearidade dessa cesta com o índice da moeda americana, cuja correlação no nosso período de estimação é de 0,8, fizemos uma regressão do DXY contra a cesta de emergentes e utilizamos o resíduo desta equação no modelo do câmbio brasileiro. Assim, julgamos que estamos aplicando a porção das moedas emergentes que não é explicada pelo DXY.
Este modelo indica que, desde o início de maio, os fatores externos foram responsáveis por uma queda de 23 centavos da apreciação cambial. Exceto por alguns momentos pontuais, como na semana do anúncio da taxação de 50% sobre produtos importados pelos EUA, os fatores externos têm contribuído positivamente para a taxa de câmbio.
Por outro lado, os fatores internos levaram a uma alta de 14 centavos neste mesmo período. O principal determinante para o fator externo é a fraqueza do dólar, enquanto, para os fatores locais, destacamos o componente de erro, que foi parcialmente compensado pela queda do CDS no período e pelo diferencial de juros.
Desde nossa última publicação do cenário, optamos por colocar nossa projeção para taxa ao final do ano em R$/US$ 5,50. Mesmo reconhecendo, à época, potencial para valorização adicional – eventualmente até para abaixo dos níveis de equilíbrio de longo prazo –, destacávamos que as incertezas quanto às políticas econômicas local e global nos afastavam de uma projeção mais ousada.
Desde a indicação da adoção das tarifas contra o Brasil, o Real piorou do seu melhor momento, em parte também alinhado ao movimento de um pequeno fortalecimento do dólar no mundo. A essa altura, é difícil saber qual será a extensão plena dessa iniciativa e qual será a reação do governo brasileiro. Por ora, entretanto, embora possam ocorrer impactos setoriais importantes, o fato de o Brasil ser uma economia relativamente fechada e os fundamentos externos seguirem indicando fraqueza do dólar ajudam a explicar o fato de a taxa de câmbio seguir orbitando não muito distante dos valores de equilíbrio”, conclui o estudo.
Gangorra das commodities
A pouco mais de uma semana do prazo fatal do tarifaço, os preços das commodities continuam oscilando muito. O ouro subiu hoje 0,65% (em dólar), o cobre valorizou 1,56%. O petróleo Brent para entrega em setembro teve queda de 0,17%. Mas os produtos exportados pelo Brasil que estão na mira do tarifaço, tiveram oscilação bem maior.
O contrato futuro do café para entrega em setembro subiu 1,81% no dia, mas cai 4% na semana. O açúcar tem queda de 0,6%. Mas o suco de laranja, do qual o mercado americano depende 58% das vendas brasileiras, sobe 0,70% no dia, 7% em uma semana e 45% nos últimos 30 dias. As restrições à carne provocam alta no preço do contrato de Boi Gordo negociado em Chicago (+0,68% no dia; 1% na semana e 2,3% em 30 dias). Outro salto é em madeira serrada e celulose de fibra curta (eucalipto), da qual o Brasil é o maior exportador.