
O OUTRO LADO DA MOEDA
IPCA cai; falta o Congresso ajudar
Publicado em 10/06/2025 às 13:22
Alterado em 10/06/2025 às 13:22
A inflação teve forte queda em maio para 0,26%, 17 pontos percentuais abaixo dos 0,43% de abril, sob impacto da alta de apenas 0,17% na Alimentação e Bebidas (e de só 0,02%na alimentação em domicílio) e da queda de 0,37% em Transportes, e produziu a primeira baixa em 2025 em 12 meses, de 5,53% em abril para 5,32%. O índice de difusão dos preços em alta caiu de 67% em abril para 60%, com o mesmo nível entre os bens alimentícios e não alimentícios.
Nos serviços, os índices mais renitentes à desaceleração, ocorreu a terceira queda seguida (0,56% em março, 0,43% em abril e 0,26% em maio), o que fez a taxa acumulada em 12 meses cair de 6,03% em abril para 5,80% em maio, mostrando que a política monetária está esfriando a inflação, embora siga acima do teto da meta (4,50%). A rigor, com a baixa de 5,6% na gasolina nas refinarias em junho, este mês deve indicar nova queda. A bola está nas mãos do Congresso para aprovar nova rodada de ajustes entre despesas e receitas.
Mercado surpreendido
Ao analisar o resultado, o Bradesco destacou que o IPCA veio “abaixo do esperado por nós (0,33%) e pelo consenso de mercado (0,34% e também pela LCA Consultores). Com isso, a inflação acumulada em 12 meses recuou de 5,53% para 5,32%. O Bradesco assinalou que “a desaceleração se deve ao contínuo arrefecimento dos alimentos ‘in natura’ (leite, arroz, feijão óleo de soja, frutas, ovos e tubérculos, exceto batata-inglesa), mas, em 12 meses, o grupo ainda acumula alta de 7,19%”. Para 2025, o Bradesco espera que encerre próximo desse patamar. Três itens contribuem para a alta: o café, que subiu 4,59% em maio, 42,10% no ano e 82,24% em 12 meses; a batata inglesa, que subiu 10,34% em maio e 11,23% no ano e a cebola, que ficou 10,28% mais cara e acumula alta de 26,56% no ano.
Nos bens industriais a alta foi de apenas 0,06%, abaixo dos 0,36%previstos pelo Bradesco. Em 12 meses, os bens industriais acumulam alta de 3,83%. Dentro do grupo, o Bradesco destaca a fraqueza dos bens duráveis, que registraram deflação no mês (-0,17%). Para o banco, “os dados mensais sugerem que o repasse cambial decorrente da desvalorização do final do ano passado ficou para trás e a apreciação cambial recente começa a ser incorporada nos preços, gradualmente”
O Bradesco destaca ainda que, no acumulado em 12 meses, o núcleo registra alta de 5,32%. O núcleo que melhor antecipa os movimentos futuros da inflação segue ao redor de 5,1%, na média anualizada dos últimos três meses. Para o banco, a dinâmica dos bens industriais foi significativamente mais benigna e “o conjunto dos dados aponta para uma inflação que relativamente bem-comportada. Para 2025, o Bradesco espera inflação de 5,4%.
Lobbies do Congresso protegem seus nichos
Dezenove frentes parlamentares – lideradas pela Frente Parlamentar da Agropecuária, que reúne 251 (dos 513) deputados e 39 (dos 81) senadores - divulgaram nota contra as alternativas ao aumento do IOF discutidas domingo na reunião entre Fernando Haddad, os presidentes da Câmara e do Senado e líderes da base aliada. As frentes criticam a tentativa de aumentar a carga tributária para resolver o problema fiscal do país, o que, somente será possível com a "redução do tamanho e do custo da máquina pública". As frentes defendem quatro linhas de ação: "o fim da política de aumento de impostos, a redução dos gastos públicos, uma reforma administrativa e a implementação de iniciativas que melhorem a eficiência e desburocratização do Estado".
Não chega a ser surpresa o discurso de “farinha pouca, meu pirão primeiro”, recorrente dos representantes de “lobbies” no Congresso. Imagina se a Frente Agropecuária, setor contemplado com a menor tributação do país e que recebe montanha anual de R$ 400 bilhões em créditos subsidiados do Plano Safra, vai concordar com o alcance indireto da tributação de 5% sobre instrumentos alternativos de financiamento do setor (como LCAs, isentas de impostos, como os LCIs, que inflam os fundos imobiliários; operações de recebíveis e de warrantagem). Não aceitam ceder um pouquinho dos seus ganhos.
Os cortes são aceitáveis só nos programas sociais. Não se fala, por exemplo, nos altos salários do funcionalismo. Isso poderia atingir os altos salários do Legislativo e, principalmente, os penduricalhos vinculados. O silêncio é também total em relação aos cortes das verbas do Orçamento Secreto.
Não se faz ajuste fiscal, mesmo tímido, sem reação contrária dos setores e interesses atingidos. E tanto faz se o ajuste é pelo lado da receita ou da despesa. Quem perde - e sempre há perdedores quando se faz um ajuste fiscal - reclama. Se for adiante, a ideia de reduzir em 10% os benefícios tributários também será combatida por setores afetados e representados no Congresso. A questão, do ponto de vista político, é saber se o lado que protesta tem poder suficiente para barrar o ajuste. As frentes parlamentares têm força sim.
Ou seja, terá de haver muita negociação entre o governo, a Fazenda e as lideranças do Congresso até que se chegue a um acordo que talvez renda algum ganho fiscal modesto em 2025 e 2026.
A escalada dos juros não é um processo neutro na economia. Nela perdem as famílias endividadas, as empresas (sobretudo as micros e pequenas) e, sobretudo, o Tesouro Nacional (cuja dívida cresce, mas a receita desacelera com a economia travada pelo desestímulo ao consumo). Ganham os ricos investidores rentistas e os gestores de capital, como donos de corretoras, bancos e empresas de “asset-management”.
É compreensível que o governo, ponderando os dois lados da balança, queira buscar de volta, para o Tesouro Nacional, uma parte do quinhão que engordou a conta dos rentistas e do setor financeiro. É inadmissível, no entanto, que o mercado financeiro e seus porta-vozes no Congresso não queiram ceder um milímetro e insistam com os cortes nos programas sociais como o BPC (por pudor, diminuíram os ataques ao Bolsa Família, cuja gestão vem expurgando benefícios irregulares). O Congresso não pode deixar de enfrentar os cortes dos subsídios e benefícios de mais de R$ 500 bilhões. Para vários setores.
O certo, por ora, é que Hugo Motta e David Alcolumbre não botarão em votação as propostas de derrubada do decreto que aumentou o IOF. Vão esperar a MP que encaminhará alternativas à medida. E, após a edição da MP, a negociação se estenderá aos salões e gabinetes do Congresso. A definição do cabo de guerra ocorrerá apenas no 2º semestre, quando a MP estiver mais próxima do término de sua vigência (MP valem por 120 dias, descontado o período de recesso). Até lá a MP e as medidas propostas estarão em vigor.