
O OUTRO LADO DA MOEDA
U$: é a tarifa, não o déficit, estúpido
Publicado em 04/02/2025 às 12:06
Alterado em 04/02/2025 às 12:06

As tarifas de Donald Trump, que tanto impulsionaram o dólar no último trimestre de 2024 (e levaram o Federal Reserve Bank à cautela na baixa de juros), tiveram um duplo recuo de 30 dias contra México e Canadá, que ameaçaram imediato revide na mesma moeda de 25% contra os produtos americanos. Assim, voltaram a desestabilizar os mercados de câmbio e as cotações das commodities e ativos negociados em dólar. No Brasil, está ficando claro que foi a ameaça tarifária de Trump, que turbinou o dólar (e pressionou a inflação) e não o déficit fiscal (que, afinal, terminou o ano comportado, dentro da meta) que desancorou as perspectivas da inflação para 2024, 2025 e 2026.
Para se ter uma ideia dos estragos das ameaças de Trump (percebidas dentro dos Estados Unidos, onde os empresários e economistas temiam forte impacto inflacionário, daí um certo alívio pela adoção de negociações comerciais bilaterais antes do gesto extremo), basta acompanhar a taxa do dólar contra o real. O pico foi atingido em 17 de dezembro: R$ 6,3144. Mas o ano fechou a R$ 6,1840. Em janeiro, o Banco Central continuou a atuar no mercado para forçar a reversão das apostas altistas. Dia 10 de janeiro, a dez dias da posse que detonaria a imposição de tarifas (adiada para fevereiro e novamente adiada) o dólar estava cotado a R$ 6,1055. Dia 20, o Dia D de Trump, teve cotação de R$ 6,0315. As cotações começaram a despencar. Dia 22 estavam em R$ 5,9415 e janeiro fechou a R$ 5,8410. Hoje, às 11:45 (horário de Brasília), o dólar era negociado a R$ 5,8030 (baixa de 0,05%). Desde o pico de 17 de dezembro houve uma queda de 8%. Muito expressiva que já influi nos preços no atacado.
Ata do Copom está velha
Faço essas observações para ponderar que a Ata da reunião do Copom, realizada dias 28 e 29 de janeiro, e divulgada hoje pelo Banco Central está velha, diante dos fatos subsequentes, no exterior e que influíram no cenário doméstico. O cenário da discussão tinha por base o dólar a R$ 6,00 (é o cenário que a Pesquisa Focus está projetando para o final deste ano e o final de 2026). Mas a realidade está mostrando outro cenário. É cedo para acreditar que o cenário atual vai se perpetuar. Mas também é um erro se aferrar ao cenário (não realizado de dez dias atrás) para projetar a economia em 2025.
Com base no cenário projetado em 28 de janeiro – no primeiro dia de reunião, os membros do Comitê de Política Monetária do Banco Central (8 diretores e o presidente Gabriel Galípolo) analisam os dados da economia mundial e da economia brasileira, passando em revista os fatos subsequentes à reunião de 11 de dezembro, e fazem projeções adiante.
Eles bem frisaram que o cenário externo, que levou o Fed a ser cauteloso, mas admitiram que “o cenário-base do Comitê segue sendo de desaceleração gradual e ordenada da economia norte-americana, mas, além das incertezas inerentes à conjuntura econômica, há dúvidas sobre a condução da política econômica em diversas dimensões, tais como possíveis estímulos fiscais, restrições na oferta de trabalho, introdução de tarifas à importação e alterações importantes em preços relativos decorrentes de reorientações da matriz energética, o que pode impactar negativamente as condições financeiras e os fluxos de capital para economias emergentes”. Ou seja, um monte de incertezas, que se solidificam com as idas e vindas do governo Trump.
Pois bem, diante deste terreno pantanoso, uma observação palmar do Comitê gerou manchetes (que a meu ver já não seriam válidas); Diz o Copom que, “na análise de curto prazo - em se concretizando as projeções do cenário de referência -, a inflação acumulada em doze meses permanecerá acima do limite superior do intervalo de tolerância da meta [3,00%+1,50% de tolerância=4,50%] nos próximos seis meses consecutivos. Desse modo, com a inflação de junho deste ano, configurar-se-ia descumprimento da meta sob a nova sistemática do regime de metas”.
Itaú ainda posta em Selic a 15,75%
Ao analisar a Ata do Copom, o Itaú considera que “apresentou um tom mais duro do que o comunicado. O texto, de forma adequada, destaca a preocupação com a deterioração das expectativas de inflação e indica que o Copom está monitorando a atividade econômica, atento a sinais de uma desaceleração mais acentuada, o que não é o cenário-base deles (nem o nosso)”. O banco frisa que “as autoridades alertam para um possível aumento da taxa neutra, devido a uma política fiscal e parafiscal ainda mais expansionista”.
E salienta que, “apesar do tom geral da ata ser mais duro, o texto indica que o comitê acompanhará a evolução da atividade econômica, do repasse cambial e das expectativas. Isso pode, ou não, refletir uma ordem de prioridades - o tempo dirá”
Mas em conclusão, o Itaú diz que “por ora, projetamos que, após o aumento de 100 pontos-base sinalizado para março, haja mais duas elevações, de 75 pontos-base cada, encerrando o ciclo em 15,75% ao ano”.