O OUTRO LADO DA MOEDA
REF do BC: bancos vão melhor que clientes
Publicado em 09/11/2023 às 16:09
Alterado em 09/11/2023 às 16:09
Nada mais esquizofrênico do que o Relatório de Estabilidade Financeira (REF) apresentado nesta 5ª feira pelo Banco Central. Com base nos balanços do 1º semestre (a Selic ainda estava em 13,75% ao ano e os juros bancários no máximo; a queda se inicia em 3 de agosto) e nas tendências do 2º semestre, o REF conclui que: “O sistema bancário mantém-se sólido e apto a sustentar o regular funcionamento da intermediação financeira e a oferta de crédito à economia”. Acontece que o mesmo REF indica que os clientes pessoas físicas e as pequenas e microempresas - que são o grosso da clientela - vão mal.
O REF é uma publicação semestral do Comitê de Estabilidade Financeira do Banco Central, composto pelo colegiado dos diretores, que analisa os riscos de solvência das instituições financeiras e, em caso de necessidade, recomenda o reforço no capital do conjunto ou de uma ou outra instituição. Como os bancos dependem da saúde financeira dos clientes, é estranho que ao longo das 78 páginas do documento, recheado de gráficos, tabelas e boxes não haja autocrítica ao excesso dos juros reais praticado pelo Banco Central.
E o diagnóstico macroeconômico do REF vai frontalmente contra os planos do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de fazer a arrecadação crescer (para reduzir o déficit primário das contas públicas) com ajuda do crescimento da economia (PIB). Diz o REF: “O financiamento à economia real permaneceu desacelerando, em linha com o ciclo de política monetária e com a percepção de risco de crédito”. Se o governo não trocar rápido os mandatos dos dois diretores do Banco Central que vencem em 31 de dezembro, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC continuará na retranca.
Foi o elevado e prolongado nível real dos juros (aumentaram enquanto a inflação caía) que aumentou a inadimplência dos consumidores pessoas físicas, microempresários e das grandes empresas do comércio. A crise da Americanas foi apenas a ponta do iceberg. Mesmo sem fraudes de créditos não declarados em balanço (mais de R$ 20 bilhões na Americanas), as concorrentes, salvo exceções, também tiveram grandes prejuízos com as vendas travadas pelos juros altos, em especial no cartão de crédito.
Famílias e micros, o X do problema
O REF até assinala os problemas, mas não se aprofunda nas causas (os juros altos). No caso das pessoas físicas, diz que “a alta alavancagem de famílias e taxas de juros elevadas contribuíram para a continuidade da desaceleração do crédito às Pessoas Físicas (PFs)”. E acrescenta (sem afirmar que o risco deriva dos juros mais altos do mercado) que “o crédito continuou desacelerando nas modalidades mais arriscadas, como cartão de crédito e crédito (pessoal) não consignado”. O REF vê alguma melhora no 2º semestre.
Nas Pessoas Jurídicas (PJs), como as grandes empresas têm acesso ao crédito internacional ou ao endividamento direto no mercado de capitais (por debêntures e títulos de renda fixa, mesmo com a desconfiança dos investidores após o caso Americanas) e até no lançamento de ações (inibidos pelos juros altos), o REF diz que “a carteira bancária cresce a taxas cada vez menores em todos os recortes”, mas ressalta que não houve melhora na “estimativa de qualidade das concessões”. E recomenda “atenção (...) à capacidade de pagamento das micro, pequenas e médias empresas (MPMEs)”, sem perspectivas de melhora a curto e médio prazos.
Previsão e realidade
Há uma semana (em 1º de novembro), logo após o Fed pausar a alta de juros nos Estados Unidos, seguindo decisão do Banco Central Europeu para o euro), o Copom dizia que o cenário externo prenunciava risco de alta mais prolongada dos juros e escalada dos preços do petróleo, diante do temor de alastramento no Oriente Médio do conflito entre Israel e Hamas.
Pois os juros começaram a cair semana passada, após dados de esfriamento do mercado de trabalho nos EUA, o que enfraqueceu o dólar. E mesmo cotados em dólar, apesar de leve subida desde ontem, os preços do barril do Brent seguem bem abaixo das cotações de 1º de novembro. ´
Pesquisa caolha
Por sinal, uma pesquisa do Serasa – onde provavelmente o foco era o peso das contas de serviços públicos nas contas das famílias – aponta que para 53% dos brasileiros, contas de água, luz e gás representam o maior percentual do orçamento mensal.
Segundo o estudo, para 82% dos brasileiros endividados, o valor das contas básicas chega a representar até R 750. Mas, tal qual os rapazes que fazem malabares nos sinais luminosos, 83% confessar já terem atrasado o pagamento de outras contas para evitar o corte de água, luz ou gás (dois meses de atraso é o máximo da tolerância). Ainda assim, 74% das dívidas de contas básicas estão atrasadas há pelo menos um ano.
O fato só demonstra a importância do Desenrola. Falta o Serasa focar no problema maior que é o peso dos juros nos orçamentos domésticos.
Só BB renegociou R$ 18 bi
Os dados do Banco do Brasil são eloquentes. As dívidas renegociadas no Programa Desenrola superaram R$ 18 bilhões. O programa completa quatro meses dia 17. O BB renegociou diretamente R$ 17 bilhões e sua filial (Ativos), que cuida de dívidas bem atrasadas, renovou R$ 1,1 bilhão em bases mais palatáveis.
Para ir onde o cliente está (muitos são caminhoneiros ou moram em cidades sem agência do BB), o banco vai usar uma carreta para percorrer o país com ofertas ambulantes no Programa Desenrola.
À la Zózimo
Não resisto em copiar a ironia, uma das marcas do saudoso Zózimo Barroso do Amaral, colega do velho JORNAL DO BRASIL, para cuja coluna já colaborei com muitas notinhas sobre o mercado financeiro.
“E o Bolsonaro, hein?”
O ex-presidente Jair Bolsonaro não se cansa de perder.
Perdeu na catilinária contra as urnas eletrônicas.
Perdeu no 1º turno, quando disse que ganharia com 30 pontos sobre Lula.
Perdeu no 2º turno, usando a guitarra do governo e a PF para barrar o eleitor.
Tentou o golpe em 12 de dezembro, quando Lula e Alkimin foram diplomados.
Fugiu para os Estados Unidos em 30 de dezembro para não passar a faixa.
No dia 1º de janeiro, Lula subiu a rampa com o povo em grande festa popular.
Vendeu relógios e presentes para fazer pé-de-meia, mas teve de devolver tudo.
Insuflou o golpe de 8 de janeiro e os apoiadores estão entrando em cana.
Ficou inelegível 8 anos por abuso do poder na reunião com os embaixadores.
Instou apoiadores no Congresso a votar contra a PEC da Transição. Perdeu.
Insuflou aos aliados no Congresso a derrubar a MP dos Ministérios. Perdeu.
Depois de perder na reforma tributária na Câmara, tentou barrar no Senado.
Nova derrota, por 53 a 24.
Será que não entendeu que o Brasil é muito maior que a sua rixa com Lula?