O OUTRO LADO DA MOEDA
Voto de minerva, Campos Neto adere a corte de 0,50%.
Publicado em 03/08/2023 às 09:36
Alterado em 03/08/2023 às 09:37
Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central Foto: Raphael Rbeiro/BCB
A 1ª reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central, com a renovação do colegiado de oito diretores, a partir do ingresso de Gabriel Galípolo na diretoria de Política Monetária e de Aílton Aquino, da diretoria de Fiscalização, indica um reequilíbrio de tendências e que dias de maiores discussões virão no colegiado.
Na verdade, houve empate na intensidade do corte: quatro diretores queriam reduzir apenas 0,25 ponto percentual na taxa Selic, de 13,75% para 13,50% ao ano, como indicado na última reunião. Foram eles Diogo Guillen, de Política Econômica (que acumulava desde março a diretoria de Política Monetária), Fernanda Guardado, da área de Riscos Internacionais, Renato Dias Gomes, de Organização, e Maurício Costa Moura, de Cidadania.
Os votos de corte maior, de 0,50 ponto percentual, foram defendidos por Gabriel Galípolo e Ailton Aquino, com apoio de Carolina Assis, de Administração, e de Otávio Ribeiro Damaso, o mais antigo diretor, de Regulação. Ante o virtual empate, coube ao presidente Roberto Campos Netos dar o voto de minerva, com o desempate a favor de queda maior, para 13,25% ao ano.
De alguma forma a opção do Copom por um corte maior, referendado pelo presidente da Autoridade Monetária, não deixa de ser um reconhecimento de que o Banco Central errou em não ter antecipado corte de 0,25 p.p. na reunião de 21 de junho. E os cálculos do mercado, levando em conta que todos apostam em cenário favorável no avanço das reformas visando fortalecer o quadro fiscal, e a visão, unânime, de corte de 0,50% na reunião de setembro, são no sentido de que a Selic fechará dezembro em 11,75% ao ano.
Adeus ortodoxia
Mais do que uma queda mais acentuada da taxa Selic, com voto vencido da corrente ortodoxa-conservadora liderada pelo jovem Diogo Guillen, cujo cacife ficou duplicado desde que assumiu, cumulativamente, a importante diretoria de Política Monetária, e que tinha adesão de Renato Brito Gomes, Fernanda Guardado e Maurício Costa, haverá uma arejamento de ideias no Copom com mais duas indicações do governo Lula no final deste ano, quando vencem os mandatos de Guardado e Costa (ambos em 31 de dezembro de 2023).
É palmar supor que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, irá indicar funcionários do banco ou economistas do mercado comprometidos com ideias menos ortodoxas.
Mais do que isso: a opção política de Campos Neto, de aderir à pressão por celeridade nos cortes dos juros – em vez da “parcimônia” pregada por Guillen, pode funcionar como um divisor de águas no Banco Central.
Os mandatos de Carolina Assis e de Otávio Damaso vencem em 31 de dezembro de 2024, sendo esperado que os dois novos membros do Comitê de Política Monetária que tomarão posse em 2025 já produzam uma nova relação de forças (e de visão econômica) dentro do Copom.
Campos Neto com dias contados
Não há dúvida de que a ida de Gabriel Galípolo, da secretaria executiva do Ministério da Fazenda para a mais importante diretoria do Banco Central, visa dar um choque de realismo em relação à política econômica do governo eleito, que era ignorada pelo Banco Central, em cima de um suposto mandato de independência.
Campos Neto ganhou autonomia perante o Executivo em fevereiro de 2021, mas seria tolice ignorar o peso do governo na condução da política econômica e o melhor é o bom entendimento entre a política fiscal e a monetária. Desavenças neste meio-campo custam caro ao país – ao Tesouro Nacional, às famílias (atendidas pela emergência do Desenrola para reduzir dívidas de mais de 60 milhões de brasileiros a juros impagáveis) e às empresas.
As notas de apoio entusiasmado de setores do empresariado ao passo mais ousado do Banco Central para a redução dos juros – a começar pela Confederação Nacional da Indústria, a Fiesp e a Câmara Brasileira da Indústria de Construção Civil, além da Fecomércio - mostram que o setor produtivo estava angustiado por uma breve e vigorosa baixa da Selic, que se estenda aos juros bancários.
Os empresários viram com alento os cortes imediatos dos juros pelos dois maiores bancos oficiais, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. Agora, esperam que o sistema privado faça a sua parte. Infelizmente, no Brasil, os juros sobem rápido pelo elevador e descem lentamente, pela escada...
Campos Neto tem mandato até 31 de dezembro de 2024, junto com os mandatos de Diogo Guillen e de Renato Brito Gomes. É um horizonte inferior aos 18 meses com os quais trabalham as autoridades monetárias para manejar os juros visando colocar a inflação dentro das metas projetadas. O provável substituto de Campos Neto, já está no Copom: é Gabriel Galípolo.
Os desafios do Banco Central
É tempo suficiente para se redimir e, em harmonia com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com quem divide o triunvirato do Conselho Monetário Nacional, completado pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, não deixar seu nome como apenas o 1º presidente do Banco Central independente.
Assim como lhe coube implementar (quando o BC ainda não era independente) a revolução do PIX e dos novos meios de pagamento, gestados na administração anterior de Ilan Goldfajn, Campos Neto pode passar para a posteridade como um presidente do Banco Central que rompeu paradigmas.
Um deles é forçar uma redução acentuada e civilizada dos juros bancários. Os banqueiros, liderados pela Febraban, já argumentaram que os juros eram altos no país por falto de um cadastro único. Ele foi criado (mas tem mais de 60 milhões de brasileiros com nomes sujos, pelo abuso das taxas de juros. É uma questão de vontade política, como foi a criação do PIX e do open banking.