O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Mercado vive a 'reversão das expectativas'

Campos Neto foi escolhido no governo Bolsonaro e segue sendo seu prolongamento, junto com a diretoria do Banco Central

Publicado em 26/05/2023 às 14:53

Alterado em 27/05/2023 às 07:18

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto José Cruz/Agência Brasil

Roberto de Oliveira Campos, ministro do Planejamento do 1º governo militar, comandado pelo marechal Castelo Branco, cunhou a expressão “reversão das expectativas” quando as medidas reformistas do PAEG (Plano de Ação Econômica de Governo) começaram a fazer a inflação baixar e a roda da economia funcionar. Com a fina ironia, que lhe era peculiar, fustigou os críticos, afirmando estar ocorrendo a “reversão das expectativas” (pessimistas).

Pois seu neto, que exerce a presidência do Banco Central desde janeiro de 2019, e ganhou autonomia com a Lei 179, de fevereiro de 2021, chegou a cunhar a expressão “frustração das expectativas” para justificar o primeiro dos sucessivos aumentos da Selic (de 2% ao ano para 2,75% ao ano em março de 2021 até 13,75% em 3 de agosto de 2022, que se mantém até agora) na tentativa de colocar a inflação dentro das metas de inflação. Não adiantou.

Houve dois estouros seguidos no teto das metas de inflação do BC (em 2021 o teto era de 5,25%, deu 10,06%; e se repetiu em 2022, com teto de 5% e IPCA de 5,79%. A queda não veio dos juros, mas porque, com a inflação em 12 meses em 11,89% em junho, o governo cortou impostos federais e estaduais de combustíveis, energia elétrica e comunicações; o BC ainda elevou a Selic de 13,25% a 13,75%). O estouro tende a ocorrer novamente este ano.

Campos Neto, ao inverso do avô, faz o papel dos críticos do governo. O velho Roberto Campos punha fé em que as mudanças estruturais em curso (correção monetária em mão dupla dos débitos públicos para recuperar as finanças e o crédito público, com as ORTNs, abrindo espaço ao financiamento de longo prazo no Sistema Financeiro da Habitação; o novo Banco Central para frear as emissões sem lastro do Banco do Brasil e as reformas bancárias e de mercado de capitais, além do FGTS) iam colocar a economia de pé.

A surpresa de Campos Neto

Já o jovem Campos Neto, que foi escolhido no governo Bolsonaro e segue sendo seu prolongamento, junto com a diretoria do Banco Central, que ainda está desfalcada de dois dos oito diretores, porque Gabriel Galípolo, indicado para a diretoria de Política Monetária, e Ailton dos Santos, para a de Fiscalização, ainda não têm data de sabatina marcada no Senado (e dificilmente farão parte da reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central em 20 e 21 de junho), sendo provável a presença em 1 e 2 de agosto. Campos Neto sempre coloca um “mas, porém, todavia, contudo”, quando o mercado vê sinais para o início da baixa da taxa Selic.

Entretanto, diante dos sinais positivos desta semana – aprovação, com folgas na Câmara, do Arcabouço Fiscal, que projeta clima favorável à tramitação da Reforma Tributária e a redução do IPCA-15 de maio, para 0,51% (abaixo dos 0,62% esperados pelo mercado, com desaceleração nos preços dos serviços) – Campos Neto, admitiu, em entrevista a Andreia Sadi, na 5ª feira, na GloboNews, que os indicadores do mercado o surpreenderam positivamente.

Como não sou economista, mas apenas um jornalista de Economia, com 51 anos de experiência na cobertura do mercado financeiro, não me prendo a esta ou aquela teoria (que fracassam muitas vezes por causas externas, um choque climático ou desavenças na área política). Dou peso (que os economistas desdenham), aos impactos psicológicos que detonam a inflação para cima ou para baixo. A gasolina sempre foi um “termômetro” para os profissionais que atuam no mercado de serviços. O valor que pagam nas bombas de gasolina serve parâmetro à formação dos preços que cobram cabelereiros, manicures, eletricistas, pedreiros, marceneiros, bombeiros hidráulicos e pedreiros.

Não foi por outro motivo que o ex-ministro da Economia, Paulo Guedes, assessorado pelo ministro das Minas e Energia, Adolfo Sachsida, que foi chefe da Secretaria de Assuntos Econômicos de Guedes (acompanhando inflação, contas públicas, PIB, desemprego e contas externas), focou no corte eleitoreiro e provisório (até 31 de dezembro) de impostos da gasolina, demais combustíveis, energia elétrica e comunicações para tentar derrubar a inflação e reeleger Jair Bolsonaro, pois não acreditavam que o BC teria sucesso com os juros altos. Só derrubaria o crescimento e pioraria as chances de reeleição.

Petrobras segura a inflação

Não é surpresa, portanto, que todos os bancos e consultorias estejam revendo para baixo as suas previsões de inflação depois que o governo Lula não reonerou em 100% os impostos cortados em 2022 e a Petrobras aprovou sua nova política de preços dos combustíveis. A estatal adotou as vantagens do custo mais baixo de extração do petróleo leve do pré-sal e a otimização do uso de suas refinarias, sem a aderência 100% aos princípios do PPI (paridade de preços internacionais), que vinculava, desde 2016, os reajustes à variação câmbio e das cotações internacional da gasolina, diesel e GLP, entre outros.

Como o câmbio ainda caiu 0,51% para R$ 5,01% hoje, depois da leve subida ontem com os temores sobre o desmonte de ministérios (a queda foi causada pelo Banco Central, ao formar a 3ª parcial da Ptax, a taxa de referência cambial que se aplica às transações financeiras e aos contratos de câmbio futuro que vencem dia 1º de junho na B3, fixou os valores em R$ 5,0099 para compra e R$ 5,0105 para venda), o próprio BC chancelou a mudança de cenário.

LCA prevê IPCA de 0,35% em maio

Depois da desaceleração no IPCA-15 de maio para 0,51%, a LCA Consultores está prevendo redução ainda maior no IPCA cheio, para 0,35%. Com esse índice, a inflação em 12 meses desceria dos 4,18% em abril para 4,05%. O IPCA cheio vai captar mais intensamente as reduções dos combustíveis e uma desaceleração nos preços de Alimentos e Bebidas (após os 0,94% do IPCA-15, o índice cheio ficaria em 0,57%). Seria o mesmo impacto esperado para Habitação, com queda expressiva do GLP, mas altas em energia em algumas cidades onde há reajustes anuais e tarifas de água e esgoto. Mas o item Transporte deve ter queda de 0,43% (depois de apenas 0,04% no IPCA-15), jogando pra baixo o IPCA.

Resta ver se o alívio na bomba de combustível será repassado aos preços dos profissionais autônomos. A estabilidade já é um ganho. A LCA prevê alta de 0,69% dos preços monitorados em maio (planos de saúde puxam alta de 0,93% em Saúde e Cuidados Pessoais) e de 5,9% no IPCA de 2023.

Para o Bradesco, “a prévia da inflação de maio sugere dinâmica mais benigna para os preços no curto prazo”. O banco assinala que “das nove categorias pesquisadas, sete perderam força ante abril, com destaque para transportes, vestuário e saúde e cuidados pessoais”. O banco colocou viés baixista na sua projeção de 6,2% para o IPCA de 2023.

Já o Itaú considera que “o IPCA-15 de maio confirma o cenário de desinflação em curso, embora as medidas centrais continuem acima da banda da meta de inflação. Na margem, com dados ajustados sazonalmente e anualizados, a inflação subjacente da indústria e dos serviços está a um ritmo de 6%”.

Para Itaú, inflação cairá a 3,7%

Para o Itaú, “nas próximas leituras, devemos continuar vendo uma queda na inflação em 12 meses para cerca de 3,7%, influenciada pelo efeito base dos cortes de impostos do ano passado e pelos recentes cortes nos preços dos combustíveis nas refinarias”. O banco projeta IPCA em 5,8% até o fim do ano e em 4,5% em 2024.

Já a Genial Investimentos considerou “a desaceleração do IPCA-15 excelente notícia para Banco Central”. A gestora assinala que, ao contrário de abril, o IPCA-15 de maio gerou algum alívio entre os analistas, vindo abaixo das expectativas (0,51% contra 0,65%), com “desaceleração em praticamente todos os segmentos. A média dos núcleos desacelerou de 0,45% para 0,42%, os preços livres saíram de 0,31% em abril para 0,29% em maio, os preços dos produtos industriais passaram de 0,38% para 0,23% preços dos serviços mostrou deflação de – 0,06% e serviços subjacentes desacelerou de 0,51% para 0,45%”

Conservadora, a Genial considerou a “desaceleração generalizada do IPCA-15 é uma excelente notícia, mas, diante dos ainda elevados níveis de inflação e das expectativas para a inflação em horizontes mais longos, ainda está longe de justificar o otimismo de alguns analistas que voltaram a prever queda da SELIC já em agosto de 2023”.

PIB pode crescer mais de 1,4% no trimestre

O Departamento de Estudos Macroeconômicos do Itaú não escondeu sua surpresa com a “resiliência econômica nos três primeiros meses do ano”, quando espera que o PIB cresça 1,4% sobre o 4º trimestre de 2022 e 3,4% frente ao mesmo período de 2022. O IBGE divulga os dados em 1º de junho. Antes, o Itaú previa 1,2%, mas o excelente resultado da colheita de soja (24,7% sobre 2022), deve elevar o PIB da agropecuária em 14%.

O Itaú viu surpresas positivas nos “números da atividade e do mercado de trabalho”. O banco espera “um ganho de 3,0% no setor de serviços (uma pequena desaceleração frente aos 3,3% do 4º trimestre), impulsionado por "serviços de informação" (+9,1% contra 4,9% no 4º trimestre), "outros serviços" (+6,7% X 8,3%) e "serviços de transporte (+6,0% X 5,3%). A categoria "outros serviços", que inclui os serviços prestados às famílias, continuou mostrando resiliência, enquanto o transporte foi apoiado pelo agronegócio”.

Para o Itaú, “o PIB industrial provavelmente subiu 1,4% ao ano (desacelerando de 2,2%, contra 6% no 4º trimestre), liderado por mineração e extração (aumento estimado de 5,0% X 1,4%). A manufatura provavelmente desacelerou para 0,0% X 1,0%), afetada pela menor produção de caminhões, em meio a mudanças nas regulamentações ambientais.

Viés de alta no ano

O mais importante na análise do Itaú foi a observação: “Se nossa estimativa para o PIB do 1º trimestre se confirmar, a previsão para o ano inteiro de crescimento de 1,4% do PIB em 2023 terá um viés de alta”. O Itaú está esperando crescimento de 0,3% no PIB do 2º trimestre sobre o 1º. Isso elevaria a previsão do PIB do ano de 1,4% para 1,7%, se a economia ficar estável no 2º semestre. Se crescer, com os estímulos do governo e queda de juros, o avanço do PIB tenderá a se aproximar dos 2%. O Bradesco prevê 1,8%.

No trimestre, de compondo o lado da demanda, o Itaú vê “o consumo das famílias e as exportações se destacando positivamente”. Ele estima “avanço de 5,4% a.a. nos gastos das famílias graças ao ímpeto fiscal (aumentos do salário-mínimo mensal e das transferências de renda no âmbito do programa de auxílio Bolsa Família) e a um mercado de trabalho resiliente. As exportações provavelmente subiram 6,7% a.a., apoiadas pelo bom desempenho do PIB agrícola no período”.

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