Quando se fala nas maiores empresas de tecnologia, geralmente as pessoas pensam em Apple, Amazon ou Google. Porém, nos últimos anos, uma mais antiga que todas elas, mesmo sem tanto alarde, tem retomado o protagonismo no setor: a Microsoft. Na última semana, a empresa tornou-se a terceira americana na história a atingir o valor de mercado de US$1 trilhão e a mais valiosa do mundo, algo que, tirando um breve momento em novembro do ano passado, acontecera pela última vez em 2002 (a Apple retomou o posto nesta quarta, após apresentar números acima do esperado no 2º trimestre fiscal de 2019). O feito torna-se ainda mais importante se considerarmos que, a partir de meados da década de 2000, a Microsoft passou a ser considerada uma empresa obsoleta, com nomes importantes do Vale do Silício chegando a afirmar que ela “não metia mais medo em ninguém”.
Tal ressurgimento tem um grande responsável: Satya Nadella, que assumiu como CEO em 2014. Desde então, as ações da companhia mais do que triplicaram. O executivo, nascido em Hyderabad, Índia, entrou para a Microsoft em 1992 e foi subindo na hierarquia até chegar ao cargo máximo, no qual substituiu Steve Ballmer. Na época, as coisas não andavam bem: o Windows 8 ia de mal a pior, os sistemas operacionais da Apple e Android relegavam ao Windows Phone uma fatia mínima do mercado de smartphones, o Bing fora deixado para trás pelo Google e a bilionária aquisição da Nokia (que pouco depois mostrou-se um fracasso) havia acabado de ser completada, como parte da estratégia de Ballmer de focar em dispositivos e serviços.
Nadella mudou o curso e aumentou a aposta em computação em nuvem, com sucesso. Atualmente o Azure tem o segundo maior market share do setor, atrás apenas da AWS. As assinaturas do Office 365 também têm contribuído para o crescimento de receitas no segmento. O executivo também deixou de lado rivalidades e a conhecida abordagem de tentar impor aos clientes que só usassem produtos Microsoft: a companhia passou a desenvolver apps para dispositivos da Apple e Android, fechou parcerias com a Salesforce e Dropbox, além de integrar o sistema operacional Linux em aplicações da Azure, algo inimaginável sob a gestão de Ballmer. Há de se destacar ainda algumas aquisições, como o game Minecraft, o LinkedIn e o Github, uma plataforma para desenvolvedores. Esta última, aliás, mostrou que a empresa abraçou de vez a filosofia open source, outra ruptura com a tradição interna. O lançamento do HoloLens, seu headset de realidade aumentada, e o investimento em inteligência artificial também mostram uma preocupação com o futuro.
Porém, talvez a maior mudança na Microsoft tenha sido na cultura organizacional. A companhia tinha fama de manter equipes isoladas, chefiadas por gerentes que competiam ferozmente para ter o melhor produto. Uma sátira de um organograma, que mostrava diferentes departamentos apontando armas uns para os outros, chegou a circular online. Funcionários afirmam que havia um receito de apresentar ideias ou questionar projetos. Sob a gestão de Nadella, foi instituída a chamada “mentalidade de crescimento”, onde os empregados são estimulados a colaborar entre si, a estar em constante aprendizado e a buscar novos produtos inovadores, adotando a máxima de startups, de testar e falhar com rapidez, usando poucos recursos.
O resultado de tantas mudanças tem sido refletido nas demonstrações financeiras: no 1º trimestre de 2019 (que a Microsoft considera o 3º para efeitos de apuração), a receita chegou a US$30,6 bilhões e o lucro líquido US$8,8 bilhões, respectivamente 14% e 19% a mais em relação a 2018, ambos acima das expectativas dos analistas. Alguns números merecem destaque: o Azure cresceu 73% sobre o ano passado e o Office 365 para negócios ultrapassou 180 milhões de usuários mensais ativos.
Apesar do valuation de US$1 trilhão ter sido momentâneo, alcança-lo mostrou que a empresa voltou a ser protagonista entre as Big Techs. O meio, no entanto, é ingrato e a Microsoft precisará estar sempre se reinventando se quiser continuar nesta posição.