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Geoengenharia solar: cartada polêmica contra as mudanças

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O mundo está falhando na missão de combater as mudanças climáticas. Apesar de as consequências catastróficas serem conhecidas, alguns países importantes parecem ainda não colocar o assunto como prioridade em suas agendas. Prova disso é um estudo publicado na última semana pelo Global Carbon Project, que mostra que as emissões de CO2 em 2018 devem aumentar 2,7% em relação ao ano passado; em 2017, já haviam crescido 1,6%, após três anos estáveis. Isso se dá por conta de um aumento na demanda mundial por petróleo e gás.

A principal maneira de se evitar o aquecimento do planeta é justamente cortar de forma considerável a emissão de CO2. Porém, os números expostos acima atestam que talvez seja hora de buscar novas soluções. Uma delas, bastante polêmica, será testada pela primeira vez em 2019. Trata-se da geoengenharia solar, uma ciência que estuda como manipular o clima de forma controlada, usando tecnologia. Pesquisadores de Harvard planejam realizar um experimento ainda na primeira metade do ano que vem, no qual um balão dirigível será colocado na estratosfera, a 20 quilômetros de altura (acima da região do Sudoeste dos EUA), e, uma vez posicionado, irá lançar uma pequena quantidade de partículas de carbonato de cálcio, que, supostamente, podem refletir luz solar para fora da Terra e resfriar o planeta. O objetivo é estudar como estas partículas se comportam. O experimento está orçado em US$ 3 milhões e é a primeira fase de um projeto maior, o Stratospheric Controlled Perturbation Experiment (SCoPEx). No total, o SCoPEx já levantou US$12 milhões, de nomes como Bill Gates, conhecido investidor em novas tecnologias na área ambiental.

A inspiração para a geoengenharia solar vem de acontecimentos naturais. Em 1991, uma erupção no Monte Pinatubo, nas Filipinas, liberou cerca de 20 milhões de toneladas de dióxido de enxofre na estratosfera, criando uma nuvem que resfriou o planeta em 0,5°C por 18 meses. Porém, o dióxido de enxofre não é visto como a melhor opção para o experimento, pois no mesmo caso de 1991 a taxa de esgotamento da camada de ozônio teve registros de aceleração pela ação do composto. Além disso, ele aquece com o Sol, o suficiente para poder afetar movimentos de umidade e correntes de jato. Por isso, a escolha pelo carbonato de cálcio, que, em teoria, aquece menos e causa menor impacto na Ozonosfera.

A polêmica surge exatamente aqui: até hoje os resultados de iniciativas em geoengenharia solar ficaram apenas nas teorias de modelos computacionais, o que provoca questionamentos de grupos ambientalistas e especialistas em clima. Há preocupações de que refletir a luz solar pode diminuir a exposição ao Sol de algumas áreas do planeta e mudar padrões de chuva de forma permanente, inclusive aumentando registros de seca. Existe também um receio de que o sucesso desses experimentos pode desviar a atenção para importância de se diminuir as emissões de CO2. Mesmo que o aquecimento global pudesse ser controlado, um acúmulo de CO2 na atmosfera, por exemplo, aumentaria a absorção do mesmo pelos oceanos, tornando-os mais ácidos. Porém, os responsáveis pelo projeto argumentam que a ideia é que a geoengenharia atue de forma complementar às ações de corte nas emissões. Por conta destas discussões, o SCoPEx irá inclusive montar um comitê independente para avaliar o trabalho.

Apesar de ser uma iniciativa em mínima escala e ainda haver obstáculos tecnológicos para realiza-la, o trabalho em Harvard será acompanhado de perto por instituições importantes: a Real Sociedade de Londres e a Academia Nacional de Ciências, Engenharia e Medicina dos EUA, por exemplo, demonstraram interesse pelo assunto. Se der certo, ainda haverá um longo caminho até pensarmos em tentativas maiores; se não, pelo menos irá servir para ampliar as conversas sobre geoengenharia. Mesmo que seja para descartar de vez sua aplicação e partir para outras soluções.