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O homem com o maior guarda-roupa do mundo

Divulgação -
Trapetti com Cláudia Cardinale, numa das muitas entregas do Oscar de que participou, e sua Tirelli Costumi foi celebrada
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Sem perder o fôlego, o italiano Dino Trappetti desfia as incontáveis histórias do cinema italiano em sua fase áurea, do neorrealismo ao cinema Spaghetti, com nomes como Rosellini, Visconti, De Sica, Pasolini, Fellini, Sergio Leone. Algumas décadas do período glorioso, que fez da Itália o país mais premiado do Oscar com o "Melhor Filme Estrangeiro" - 14 estatuetas, o segundo mais premiado com a Palma de Ouro em Cannes, foram 12, mais 11 Leões de Ouro e 7 Ursos de Ouro. E a Tirelli Costumi, de Dino Trapetti, tem parte importante em todo esse sucesso. Fundado em 1964, o Atelier Tirelli tem sido o responsável, desde então, pela criação e a realização dos figurinos de quase todos os filmes de Luchino Visconti. Fundada por Umberto Tirelli, a Tirelli Costumi colaborou com os figurinos de "Casanova", de Federico Fellini, Oscar de Melhor Figurino em 1973/74, de "Carruagens de Fogo", do diretor Hugh Hudson, ganhador do Oscar em 1982, e os figurinos para "Amadeus", de Milos Forman, com que Teodor Pistek ganhou um Oscar em 1985. E estes são apenas exemplos, há muito mais além desses, e as indicações de figurinos com o carimbo Tirelli são incontáveis, tanto para Hollywood quanto para o cenário Europeu de cinema. Pensem em... "O leopardo", de Visconti. Onde estão aqueles figurinos sensacionais usados pela jovem Claudia Cardinale com cintura 55? Guardados no acervo da Tirelli, naturalmente!

O Acervo Tirelli reúne cerca de 40 mil figurinos. Das roupas dos centuriões romanos de grandes produções épicas aos vestidos alta costura de La Dolce Vitta, aos figurinos de ópera de Maria Callas. E o depositário disso tudo é Dino Trapetti, proprietário da empresa Tirelli, ele mesmo uma personalidade do cinema, aquele que praticamente reinventou o relações públicas no cenário teatral e artístico da Itália, amigo pessoal de todas aquelas celebridades de que ouvimos falar, de Mastroianni a Lollobrigida, Cardinale, e todo o catálogo de famosos de Cinecittá. Nesta entrevista, Dino Trappetti fala sobre seu trabalho, o cinema e sua relação de amor com o Rio de Janeiro, onde se hospeda no Arpoador, no apartamento da amiga condessa Georgina Brandolini, onde conversou com o repórter João Francisco Werneck.

Como começa a sua relação com o Umberto Tirelli?

Na verdade, eu nunca trabalhei com o Umberto. Eu não sou alfaiate! Eu morei com ele, mas tinha a minha própria assessoria de imprensa, fazia relações públicas, festivais para cinema, teatro, tudo para cultura. Conheci o Umberto fazendo teatro amador. Nós íamos fazer uma comédia do Carlo Goldoni, e precisávamos de roupa de época para encenar. Então, fomos no atelier do Umberto, que ainda não era o dono do local, mas o diretor. Ele mandou trazer algumas peças, gostamos, e então começamos a conversar sobre teatro. E aconteceu que ele veio ver a estreia da nossa peça, amadora, né?! Inacreditável E ele gostou...

Macaque in the trees
Dino Trapetti, na sede de seu Atelier Tirelli, em Roma (Foto: Arquivos Tirelli )

E ele já tinha um nome consagrado em Roma, não é?

Sim, claro. Tudo porque ele já trabalhava com nomes como Luchino Visconti e Marcello Mastroianni Com todos mesmo. Ele chegou em Roma em 1956, e conheceu o Luchino Visconti no Alla Scala, em Milão, onde estava ajudando no palco. Era um ensaio em que o próprio Visconti era o diretor do espetáculo. Umberto ajudou Visconti a conseguir umas roupas de época para a montagem, e então foi convidado para trabalhar em Roma. Umberto quase desmaiou. E foi o Luchino que o colocou neste ateliê em Roma.

E aí vocês se conheceram...

Visconti pediu a Danilo Donatti (figurinista ganhador de um Oscar) para levar Umberto Tirelli "para passar o fim de semana com todos", e ele me levou. "Todos" eram Franco Zeffirelli, Piero Tozzi, Mauro Bolognini, Danilo Antonale. Todos os grandes talentos em uma só casa! Foi na mesma época em que ele foi lá assistir à minha peça, gostou muito, e nós passamos a conversar, se frequentar Foi quando começou uma amizade mais próxima.

Foi quando vocês criaram a Tirelli Costumi?

Em 1964, o Umberto largou o trabalho e decidiu criar o seu próprio atelier. Alguns amigos ajudaram. Eu tinha algum dinheiro de herança, e dei a ele o que tinha. Quando o atelier de costura, com demandas que chegavam da França, dos Estados Unidos, começou a dar certo, ele me ofereceu uma sociedade. A proposta era: receber o meu dinheiro de volta, com juros, ou entrar com ele em uma sociedade. Eu escolhi a segunda evidentemente

E como foi isso?

Nunca trabalhei com ele na costura. Eu sempre tive muito sucesso no meu trabalho como assessor de imprensa. Então eu continuei tocando meus negócios. Enquanto isso o Umberto continuava investindo na empresa. Ele comprava acervos de roupas antigas, algumas das mais importantes do mundo. Coleções de alta costura, também, principalmente a francesa...

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Trapetti com Cláudia Cardinale, numa das muitas entregas do Oscar de que participou, e sua Tirelli Costumi foi celebrada (Foto: Divulgação)

Como era fazer relações pública na época de ouro do cinema italiano?

Trabalhar com alguns artistas era um prazer imenso. Outros era o inferno...

Alguma história curiosa?

Tem uma boa. Quando eu fazia assessoria de peças de teatro, e tirava fotos dos artistas para divulgação do material, eu sempre às mostrava aos atores e atrizes antes de mandar para a imprensa. Nunca escolhi uma foto. Aconteceu que uma atriz recebeu uma crítica pela sua imagem no cartaz de divulgação do espetáculo. E ela veio me cobrar por isso. Mas eu disse a ela, "não, sou eu é que me recuso a trabalhar com você novamente".

E na Tirelli, quais são as histórias?

Durante a gravação de um dos primeiros filmes da Sophia Loren, o "Lady L", dirigido pelo Peter Ustinov, ela estava precisando de uma roupa de Odalisca. Umberto foi informado pelo nosso figurinista que a gravação aconteceria em determinado dia. Só que ela foi antecipada em dois dias. E o figurinista esqueceu de avisar ao Umberto! Ligaram para ele de Edimburgo, na Escócia: "e então quando a peça chega?". E você sabe quanto custa para atrasar uma gravação de cinema Tirelli pegou imediatamente o avião de Roma para lá. Eles levaram de carro a roupa, que ainda estava inacabada, até as locações, e enquanto isso a costureira trabalhava na peça no banco de trás. Quando chegaram ao local, a roupa ainda não estava pronta. A Sophia, claro, percebeu. Eles brigaram, claro. E a Sophia se negou a trabalhar novamente com o Umberto. Ela achou durante muito tempo que foi falta de profissionalismo dele. Claro que a história foi esclarecida depois...

Como foi assumir a Tirelli Costumi? O que muda?

Eu não mudei nada. Está tudo intacto. O escritório está do mesmo jeito de quando o Umberto morreu.

Você teve medo de dar errado?

Claro que tive. Umberto era o grande protagonista. Uma personalidade fascinante; ele era amado ou odiado. Eu sou de Aquário. E as pessoas pensavam que não era possível continuar com a empresa. Pensaram que iria acabar. E eu mantive até as pequenas tradições, como as festas na casa de Capri.

Reza a lenda que vir ao Rio de Janeiro te curou de uma depressão. Como foi esta história?

Queria mudar de vida. Eu vim pela primeira vez em 1981. Quem me trouxe foi o Gigi Giuliani, um grande amigo e ator. Filmou com grandes nomes, inclusive a Sophia. Ele era mais amigo do Umberto do que meu. Mas aconteceu que em 1980 faleceu o meu grande mestre, o ator Romulo Valni. Ele era um grande homem. Eu comecei o meu trabalho com ele, aos 16 anos. A morte dele me causou uma grande depressão. E o Umberto, que não quis tomar conta da minha depressão, pediu ao Gigi para me levar para o Rio de Janeiro. Curei a depressão em 15 dias. A cidade tinha tudo para um jovem...

O que te faz voltar todos os anos?

Meus muitos amigos. Passei um réveillon na casa do Roberto Marinho. Estou indo à missa da Gisela Amaral. Tenho muitos amigos no Rio de Janeiro. Apesar de que, a respeito de trabalho, por aqui é só fracasso Falaram que eu tinha que fazer desfiles, exposições Eu tentei. Inscrevi um projeto no CCBB, que entrou no edital da Lei Rouanet. Mas ninguém nunca me explicou o porquê de não ter sido aceito. Me disseram que o projeto foi mal apresentado. E eu respondi, "mas ele passou por editais em Tóquio, Paris, Nova Iorque, Xangai E só no Brasil ele não foi aproveitado?". Agora, no Rio de Janeiro, eu tenho ido muito ao cinema, porque sou jurado do Oscar para este ano.

O que há de novos projetos na Tirelli?

São vários. Alguns eu não posso falar, é claro. O Martin Scorsese está chegando em Roma para o novo filme dele. O Spielberg também tem uma história legal, sobre a Itália, e vai trabalhar conosco. No momento, eu estou trabalhando em um projeto financiado pelo Netflix sobre o império otomano, gravado na Tunísia. A previsão é fazer 12 episódios. Também estou trabalhando para o cinema italiano, com filmes e séries.

Arquivos Tirelli - Dino Trapetti, na sede de seu Atelier Tirelli, em Roma

UMA CRACOLÂNDIA

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se formou no coração da Zona Sul, entre Copacabana e Ipanema, em cima do túnel da Sá Ferreira. Dá pena ver aquela juventude dourada da praia, meninas lindas, na fissura do crack. A policia ameaça, aponta os fuzis em sua direção, e somem todos. Vai-se a patrulhinha, e eles voltam como formigas. Não será com tiro, porrada e bomba que isso vai se resolver.