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Coalizão em xeque

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Na semana passada o ex-deputado Marcus Pestana, que tem expressão junto aos setores mais influentes do tucanato, incluiu-se entre os que tendem a admitir que estão esgotadas as forças do presidencialismo de coalizão, depois de ter cumprido missões de contemporização durante quase três décadas. Na verdade, admitiu que o modelo teve finalidade modelar no apoio ao projeto de transição democrática, com Ulysses e Tancredo, mas sem eficácia nestes tempos de bolsonarismo insipiente. No rastro da avaliação, veio, em consequência, a sugestão de se criar um novo partido, com suficiente robustez para enfrentar o futuro imediato, longe dos extremos radiciais; uma ideia que revê antiga aspiração de quem se preocupava com a abundância das atuais siglas, onde se hospedam matizes variadíssimos de tendências ideológicas, além dos muitos partidos sem qualquer preocupação pragmática.

O ex-deputado mineiro, que brevemente poderá retornar à Câmara, pois é primeiro suplente de uma bancada em que seis sairão para disputar prefeituras, tem alimentado estreitas empatias com o governador de São Paulo, João Dória, mas não informa se a mesma ideia de criação de nova sigla já estaria povoando as margens do Ipiranga.

Interessante a análise que tem sido feita sobre o presidencialismo de coalizão, exposto como cadáver insepulto, do qual, mesmo assim, se valeu sem medidas o governo Temer. Nada parece sugerir imediato descrédito do que esse modelo, mesmo com formato e nome diferentes, tenha inspirado a política aliancista. O exemplo que ocorre de imediato é a aprovação da reforma da Previdência, em primeiro turno, sob a égide do protagonismo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ao deixar substancialmente claro que a coligação das tendências de centro garantiu votos mais que suficientes para matéria de tal complexidade. Não seria sustentável a ideia de que coalizão, lato sensu, e aliança sejam coisas muito distantes, principalmente quando chega o momento aritmético da contagem dos votos; o que não excluiu a convicção de que aquele jeito meio parlamentarista esteja isento de admoestações. Seria ignorar evidências.

No rastro do tema, quando se fala em mais um partido, admite-se que ainda está para nascer uma razão palpável em favor desse multipatidarismo com que hoje se pratica a democracia representativa no Brasil, pois esta, soberanamente indispensável, poderia se realizar perfeitamente em meia dúzia de legendas, ou pouco mais que isso, com programas e planos de ação capazes de acolhe todas as correntes políticas, inclusive as de tenências radicalizantes. Diferentemente, os 35 partidos hoje reconhecidos pelo Tribunal Superior Eleitoral primam por pulverizar ideias e projetos, além de empobrecer a representação popular. Não sendo suficientemente fortes para se imporem, mostram-se presa fácil para todo tipo de interesses que o Executivo é capaz de arquitetar. [Considere-se que a legislação eleitoral em vigor, com exigência crescente de desempenho das legendas nas eleições, acarretará gradativa redução delas nos próximos pleitos.]

Da mesma forma duvidoso o argumento de que o momento político brasileiro padece de um vácuo entre os setores radicais. A propósito, pode-se recorrer, mais uma vez, ao episódio da reforma da Previdência, cuja aprovação se deu, basicamente, pelo que se arquitetou com as bancadas do centro, que negam a tal vacuidade. Inexiste, portanto, salvo melhor juízo, o risco desse limbo, mesmo que a extrema esquerda permaneça meio recolhida, sem saber exatamente como se reorganizar; e a direita, enquanto isso, vai se dando bem como os objetivos centristas.

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