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Populismo à direita

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Incursões mais recentes do presidente Bolsonaro permitem admitir estar ele convencido, definitivamente, de que um roteiro populista de direita continuará sendo o mais adequado para seu projeto político, estimulado por colaboradores estreitos que, no seu conjunto, parecem ceder a dois detalhes importantes, que coincidem com o Brasil de hoje e seu recém-inaugurado governo. O primeiro é a tendência universal de adotar nova experiência com ideias da direita. O segundo detalhe, este à mão de imediato, é que a esquerda brasileira, além de carecer de alguma unidade, não sabe exatamente qual o caminho a adotar na retomada de seu antigo prestígio. Essas seriam as águas favoráveis em que o presidente navegaria, sem que nelas naufrague, desde agora, o projeto de um segundo mandato, do qual ele não fala, mas não pode negar que setores do governo pensam nisso. Fieis camaradas anoitecem e amanhecem pensando como transformar tal sonho em realidade. 

Primeiro sinal dessa disposição identifica-se em ações presenciais, que ele tem intensificado, sob os cuidados da informalidade, seja no encontro com caminhoneiros, no prestígio que confere à seleção de futebol ou em visitas inesperadas. Coisas que o povo gosta de ver, e que, de alguma forma, podem ajudá-lo no confronto com setores resistentes da sociedade que o acusam de inerte nos primeiros cinco meses de gestão. Observe-se que, por si ou pelos porta-vozes, Bolsonaro procura mostrar aos segmentos sociais mais acessíveis ao seu discurso que está nas bancadas parlamentares e nos gabinetes boa parte dos que “não querem ver o Brasil sair do buraco”. Ele sabe que um dos assuntos preferidos das ruas brasileiras é falar mal dos políticos.

 Vai se tornando cada vez mais claro que a oposição a esse presidente não pode subestimar, muito menos ignorar, que está em curso um projeto populista de direita, ajustado ao temperamento latino-americano, neste momento apresentado como contrafação da vertente populista de esquerda, derrotada no Brasil e sobrevivente na Venezuela. Nessa conduta, que se revela francamente adotada, há sinais de estratégia e tática bem adotadas, nas quais seria impossível negar o dedo dos militares pensantes que o cercam; sem dificuldades ou constrangimentos, pois o presidente não apenas está entre eles; é um deles. Uma leitura sobre as bases científicas do populismo confirma que esse fenômeno não é incompatível com o militarismo, contrariando o que pensou Peter Wills, “o próprio conceito do exército como povo armado, na soma de virtudes populares (…) é um conceito populista típico” (Dicionário de Política, Bobbio, Matteucci e Pasquino. Editora UNB). 

Estariam condenadas ao fracasso se, na elaboração de seu projeto, as lideranças oposicionistas abrigassem preocupações superficiais, insuficientes para enriquecer o debate político do país. Andariam mal contentando-se com acusações pouco ou nada construtivas. A elas não cabe olvidar que “o populismo é o recurso natural de uma sociedade em crise, dividida entre o setor tradicional e o setor moderno”, como se lê na fonte citada. E onde há crise viceja o campo fértil do messianismo, ainda mais temperado por seitas evangélicas ou fundamentalistas, tão simpáticas ao poder instalado. Policiar as consequências desse inter-relacionamento é tarefa que vai além e acima de estereótipos para o papel que a oposição tem de representar na democracia de um país.