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A reciclagem dos partidos

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Os partidos ainda não se dispuseram a cuidar da reformulação de seus programas, muito menos de novos métodos da operacionalidade, que, contudo, devem considerar com devido cuidado. Talvez despertem para isso, a partir de agora, quando deputados e senadores ocupam-se da legislatura, e têm tempo para conversar.

Antes disso, houvesse um pouco de boa vontade, poderiam ter caminhado, com tempo para os primeiros avanços, pois passaram-se três meses desde que enfrentaram, todos eles, os embates da eleição; e dela ainda não cuidaram de sacudir a poeira, sarar as feridas e partir para novas jornadas. De uma ampla e inevitável revisão nem escapariam os que se deram bem nos resultados aritméticos das urnas.

É o caso do PSL, que cavalgou no projeto Bolsonaro, mas não pode usufruir eternamente da sombra que conquistou. E, como ele, as demais legendas com suas frágeis estruturas. Ninguém está à margem da tarefa de se reciclar, embora, antes de todos, esteja o PT, pois saiu do cenário arrastando a principal derrota.

É pertinente essa missão comum, sem discriminações ou preferências, ao se considerar que as organizações políticas estão frente a frente com novos donos do poder; além de saberem que, sendo contra ou a favor do governo, em 2020 serão novamente chamadas às urnas.

Sem descanso. Já dizia a presidente Dilma que nunca se sai de campanha, pois as eleições se processam de dois em dois anos. Uma realidade que afeta, primeiramente, os partidos.

Para serem contra ou a favor do governo Bolsonaro terão de se apresentar minimamente organizados, entendendo-se, por isso, não sedes confortáveis e gabinetes em ordem; mas a organização da palavra, das propostas e das linhas de atuação claramente delineadas. Sem isso continuarão em declínio.

Nem se admite descuidarem do dever da nitidez de conduta, o que chegava a preocupar o presidente Temer. Comparou ele, certa vez: se o estrangeiro assistir a uma sessão da Câmara, concluiria que, no Brasil, há três partidos; o que vota a favor, o que vota contra e um terceiro, que, eventualmente, vota contra ou a favor.

Para o velho João Pinheiro mesmo os três já seriam demais. Tinha como ideia fixa que eles comprometiam o espírito federativo. Efetivamente, em seu tempo os partidos republicanos eram estaduais.

O inevitável

Da mesma forma como hoje não se conceberia democracia sem voto, é impossível divorciá-la das organizações partidárias. Raras vezes sentiram-se excluídas dos momentos maiores da política. Tomo ensaio do professor Paulo Medina para lembrar três casos únicos, em que elas estiveram ausentes ou a reboque: a campanha civista de Rui em 1910, a reação republicana de Nilo Peçanha contra Artur Bernardes, e a Aliança Liberal de 1930. Fora disso, sempre atuantes e influentes.

A certeza de sua imprescindibilidade agrava o imperativo das reciclagens exigidas pelo tempo, pelos costumes e pela evolução do pensamento. O velho Partido Trabalhista Brasileiro poderia ser indicado como exemplo clássico: da fase caudilhesca dos varguistas passou pela experiência ideológica de Alberto Pasqualini e Fernando Ferrari, para depois adotar o rito fisiológico, que apreciou muito e nele permanece. Seja com que roupa se vestiu, a sigla trabalhista sempre encontrou um jeito de ter seu espaço.

Dessa capacidade de mudar e adaptar-se nem se baniu uma arqui-inimiga do PTB, a União Democrática Nacional, da qual se diz, sem que falte uma pitada de ironia, ter sido um partido de liberais legalistas, que trabalhou para a deposição de Vargas, tentou impedir a posse de Juscelino e contribuiu na derrubada de João Goulart.

“O partido político é o lar cívico, que deve existir sempre, ao lado do lar doméstico"

Afonso Arinos