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O enfrentamento

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Faltavam elementos para garantir, ontem, se foi contida ou foi mantida, com maior ou menor força, a onda que empurrou o candidato Bolsonaro para 35% dos votos totais (ou 39% dos válidos) na pesquisa Datafolha de quinta-feira. Só com grande empurrão da onda ele poderia saltar 11 pontos percentuais para vencer amanhã. Embora isso não seja impossível, é menos provável. E assim, o que se deve esperar agora é um segundo turno sangrento.

Para Mauro Paulino, diretor do Datafolha, o salto não é impossível porque, apesar de a taxa de cristalização do voto já superar os 70% (eleitores que não mudarão o voto), 25% deles ainda admitem fazê-lo. E se uma grande fração fizer isso, podem acontecer variações decisivas na votação. Os menos dispostos a mudar são os eleitores de Bolsonaro e Haddad, e os mais volúveis são os de Marina (61%), e depois os de Alckmin e Ciro (40%). Em 2014, 23% dos eleitores decidiram o voto na última semana. Este ano, a insegurança, o medo e a própria timidez dos vacilantes poderão levar mais eleitores a decidir na última hora. Até mesmo na fila de votação.

Ainda assim, a onda parece ter perdido força, por conta do debate da TV Globo, com o favorito ausente e sendo muito criticado, e da postura mais ofensiva não só de Haddad e do PT. No debate, o trio de esquerda, Haddad-Ciro-Boulos, ensaiando sutilmente a aliança do futuro, destacou-se pela clareza de propostas e a firmeza nas críticas a Bolsonaro, não só pela fuga ao debate, mas pelo que representa de regressão civilizatória, com seu machismo, racismo e homofobia, e por ameaçar tão claramente a democracia, ao ponto de jornais estrangeiros apontarem este risco, como fez ontem o inglês “The Guardian”.

Ao segundo turno Bolsonaro deve chegar mais forte, com boa vantagem sobre o segundo colocado, que deve ser Haddad, apesar do esforço final da campanha de Ciro. Segundo o estudo Aja Solutions, ele praticamente empatou com Bolsonaro (31,9% a 30%) no indicador de relevância do Twitter, deixando o petista bem atrás (8%). Bolsonaro cresceu conquistando indecisos, mas também eleitores de candidatos abandonados por aliados, como Alckmin, pelo Centrão e até por tucanos. Contra a volta do PT vale tudo, dirão todos da direita autodenominada centro. Bolsonaro, que não tem projeto para o país, abraçará o programa neoliberal que lhe será oferecido.

Com ele marcharão forças poderosas, juntando o capital financeiro e produtivo, máquinas e oligarquias políticas conservadoras, militares assanhados e buscando o protagonismo perdido, governadores reeleitos com o manche estadual na mão, grupos de mídia e igrejas pentecostais, que às vezes se fundem num mesmo aparelho condutor de vontades, como o consórcio TV-Record-Igreja Universal.

Ainda assim, será outra eleição, e Haddad terá que passar a ser o candidato da esquerda, e não apenas do PT. Mais que da esquerda, se restarem forças de centro preocupadas com o futuro da democracia. Segundo o Datafolha, 69% dos brasileiros acabam de apontá-la como melhor forma de governo para o Brasil. Contra o programa neoliberal, a coalizão de esquerda defenderá um projeto nacional que garanta crescimento, emprego, desenvolvimento e soberania. Na construção da frente, não contarão com Lula como mediador. Terão todos que esquecer as cotoveladas do primeiro turno e dar-se as mãos. Se tiverem competência, poderão construir algo como a coalizão da Geringonça portuguesa, que trouxe dias melhores ao país, depois do austericídio do PSD.

O tempo de televisão para os dois candidatos será igual, e Bolsonaro não poderá mais se esconder. O jogo será pesado, terá golpe baixo e pancadaria. Mas valerá a pena se for observado o mandamento democrático: quem ganhar levará, quem perder terá que aceitar o resultado. O problema de 2014 não foi a polarização. Foi a insurgência tucana contra a reeleição de Dilma.