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Os bumbos do antipetismo

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Entre sexta-feira e ontem, quando o Datafolha fez sua última pesquisa, Jair Bolsonaro cresceu quatro pontos, passando de 28% para 32%, apesar das manifestações nacionais que as mulheres fizeram contra ele no sábado. O petista Fernando Haddad encolheu de 22% para 21%, e se não se recuperar, irá para o segundo turno enfraquecido. O que deu impulso a Bolsonaro foi o troar do antipetismo, no discurso de Alckmin e concorrentes, através das manobras do STF para calar Lula e da jogada de Moro ao liberar a delação de Palocci. A guerra do segundo turno está se antecipando e será pesada, talvez suja mesmo.

Quem nunca ouviu alguém dizer que deixará o Brasil se Bolsonaro virar presidente? Pois trate de conferir o passaporte. Na simulação de segundo turno do Datafolha, o capitão cresceu de 39% para 44% e Haddad caiu de 45% para 42%. O instituto, com rigor metodológico, fala em empate técnico, mas o que temos aí é mesmo um quadro em que Bolsonaro derrota o petista. E pode ganhar mesmo, por mais espantoso que seja escrever isso, admitindo que uma maioria eleitoral ressentida e egoísta pode impor ao Brasil a opção pelo autoritarismo, pelo capitalismo mais arcaico e pela regressão nos costumes.

Ciro Gomes continua aparecendo como quem tem mais chances de derrotar o ex-capitão no segundo turno (45% a 39%), mas, no adiantar da hora, só um crescimento sobrenatural poderia levá-lo a ultrapassar o petista. A mesma pesquisa diz que 84% dos eleitores de Bolsonaro e 82% dos eleitores do petista declaram que não mudarão o voto. Isso finca os dois no segundo turno, mas hoje o petista chegaria fragilizado. A erupção do antipetismo barrou Haddad e fez sua rejeição subir de 32% para 41%. A de Bolsonaro, sob os ecos do #elenão, caiu de 46% para 45%.

O antipetista já era um ser amargurado muito antes de o PT, achando que podia fazer o que os outros sempre fizeram, cometer os erros que lhe foram cobrados com rigor nunca antes aplicado a outros partidos que, para governar, também transigiram com a corrupção e com o fisiologismo. O antipetista, que votava no PSDB, soltou fogos quando estourou o mensalão, mas tucanos e pefelistas não ousaram tentar o impeachment de Lula. O antipetista vibrou depois com a condenação e prisão de estrelas como Genoíno e Dirceu no julgamento da AP-470.

No segundo governo Lula, a ascensão dos pobres, os aviões cheios, os jovens pobres nas universidades, o sucesso internacional do Brasil e de Lula, tudo aquilo era intolerável, e o PT ainda elegeu Dilma. Mas em 2014, com o petrolão e a Lava Jato, pensou o antipetista, aquilo teria fim. Dilma se reelegeu. O PSDB juntou-se com o MDB para derrubar Dilma, mas o governo de Temer aprofundou a recessão e desnudou a corrupção emedebista. Os antipetistas trocaram então o PSDB por Bolsonaro. Ele não encarna exatamente uma extrema-direita, como a europeia, ou como Trump. Ele incorporou o espírito do antipetismo, acrescido de preconceito e de moralismo.

Nos últimos dias o candidato tucano Geraldo Alckmin adubou o antipetismo com suas peças de campanha: “votou Bolsonaro, elegeu o PT”, diz suas marchinhas. Todo seu discurso é sobre o “risco de o PT voltar”. Apontando o perigo oposto, o da vitória de Bolsonaro, Ciro também bate no PT. E a mídia repete o filme, publicando a delação de Palocci liberada por Moro.

Nesta hora tão sombria, vem de um lúcido representante da alta burguesia industrial, o empresário Ricardo Semler, sóbrias e sensatas advertências à sua classe, em artigo publicado ontem na Folha de S. Paulo: “Colegas de elite, acordem. Não se vota com bílis. O PT errou sem parar nos 12 anos, mas talvez queria e possa mostrar, num segundo ciclo, que ainda é melhor do que o Centrão megacorrupto ou uma ditadura autoritária. Foi assim que a Europa inteira se tornou civilizada. Precisamos de tempo, como nação, para espantar a ignorância e aprendermos a ser estáveis. Não vamos deixar o pavor instruir nossas escolhas”.