COISAS DA POLÍTICA

Nem com o VAR o palmeirense Toffoli ressuscitará o Banco Master

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Publicado em 28/12/2025 às 07:02

Alterado em 28/12/2025 às 08:33

Daniel Vorcaro Foto: divulgação/Banco Master

O gênio saiu da lâmpada mágica quando Aladim a esfregou. Era ficção. Na real, ninguém foi capaz de devolver o gênio à lâmpada mágica ou à garrafa. Nem nos devaneios de quem esvaziou várias delas seguidas. Os momentos passam e as ocasiões propícias se evaporam. Isso se aplica à dupla tentativa de ressuscitar o falido Banco Master, de Daniel Vorcaro, que sofreu intervenção do Banco Central em 18 de dezembro e começou a ser liquidado em seguida. Isto porque foram descobertas fraudes de créditos no valor de R$ 12,2 bilhões, motivo pelo qual o BC vetou, em 3 de setembro, a compra de 49% das ações ordinárias do Master (58% do total) pelo Banco Regional de Brasília, o banco do Distrito Federal governado pelo advogado Ibaneis Rocha (MDB-DF).

No dia 20 de dezembro, o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Jhonatan Pereira de Jesus, ex-deputado federal pelo Republicanos (RR), pediu explicações ao Banco Central em 72 horas e ameaçou suspender a liquidação do Banco Master. A decisão, individual, causou surpresa entre os demais membros do TCU, já que não havia recursos públicos na União envolvidos na transação. Ademais, com a corte em recesso, o plenário do Tribunal só voltaria a se reunir em meados de janeiro. Em função dos feriados do fim de ano, a notificação do TCU só chegou ao BC na segunda-feira, 22 de dezembro, e o novo prazo é o fim da manhã de 30 de dezembro.

Mais perplexidade causou a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal, Antônio Dias Toffoli, de convocar para a mesma terça-feira, 30 de dezembro, uma acareação (em vídeo) entre o presidente do Master, Daniel Vorcaro, o ex-presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, e o diretor de Fiscalização do Banco Central, Aílton de Aquino Santos. A estranheza, no mercado financeiro e no Banco Central, prende-se ao fato de quem examinou e vetou a operação entre o BRB e o Master (proposta em maio) foi o diretor de Organização do Sistema Financeiro, Renato Dias Brito Gomes. O mandato de Gomes se encerraria em 31 de dezembro, mas o presidente Lula antecipou a exoneração nesta semana. A acareação, como parte de inquérito conduzido pela Polícia Federal, reuniria os acusados de fraude, de um lado, e o órgão fiscalizador, de outro.

O Banco Master surgiu com negócios em Minas Gerais e na Bahia, e tinha grande influência junto a políticos do “Centrão” (sobretudo PP e União Brasil). O banco fugia aos padrões do mercado na captação de recursos ao oferecer rendimentos de até 140% dos juros dos CDIs (certificados de depósitos interbancário, a taxa média dos CDBs negociados diariamente no mercado). A captação era agressiva e se valia das comissões de colocação (garantidas na largada) oferecida a grandes “players” do mercado, como XP, Nu (bank) e BTG-Pactual. Os repassadores de investimento “vendiam” os CDBs como seguros, citando a garantia de até R$ 250 mil por titular pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que é bancado pelos grandes bancos mediante transferências de custos aos próprios investidores. A agressividade do Master indica que há mais de R$ 61 bilhões a serem honrados pelo FGC.

Em 2024, quando a escalada dos juros da Selic levou o Master a ter problemas de captação e elevar a margem frente ao CDI de 120% para 140%, o senador piauiense Ciro Nogueira, presidente do PP, chegou a propor o aumento do teto de proteção do FGC para R$ 1 milhão, mas foi demovido pelos grandes bancos. Nem por isso diminuíram as campanhas e ofertas de comissões por fora para a colocação de CDBs e letras financeiras (isentas de IR e com o mesmo teto do FGC) junto a fundos de pensão de funcionários públicos de estados e municípios. Por coincidência, os fundos de pensão que mais carregaram papéis do Master e correm risco de calote, por excederem o teto do FGC, são dos estados do Rio de Janeiro (com quase R$ 2 bilhões aplicados) e do Amapá (R$ 400 milhões), ambos governados por políticos do União. No caso do Amapá, o gestor do fundo de pensão foi indicado pelo presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (União-AP). Municípios de São Paulo e Amazonas também estão carregados de papéis sem garantia do Master.

A radiografia do Banco Master revela uma instituição financeira de difícil avaliação do patrimônio. Os ativos, segundo a própria auditoria da KPMG, no balanço de junho de 2025, eram de complexa mensuração por serem formados por títulos de precatórios judiciais (mais de R$ 10 bilhões) e ativos de empresas de baixa liquidez. Uma delas, a Ambipar, entrou em ruidosa recuperação judicial. Havia um emaranhado de instituições vinculadas (como o Will Bank) e fundos de investimento de grande patrimônio, em valor de registro, mas com papéis de baixa liquidez e cotações irregulares. Quando a fusão entre o Master e o BRB estava sob exame do Banco Central, alguns ativos do Master começaram a ser vendidos. O BTG-Pactual, de André Esteves, era um dos interessados e ficou com parte das ações do Master na Light. Outras transações foram interrompidas e interessados inconformados foram pressionar o STF e o TCU.

Uma hipotética reviravolta para o Master voltar a operar é considerada inviável por 9 entre 10 banqueiros (a exceção é o próprio Vorcaro). Na volta ao mercado, mesmo com outra placa, o novo banco dificilmente conseguiria levantar recursos. Se fosse tentar emitir letras financeiras, por exemplo, não seria fácil encontrar investidores institucionais que comprassem os papéis – sem a cobertura do FGC. Se quisesse vender CDBs no mercado, não encontraria plataformas de distribuição dispostas a colocar os papéis do ex-Master. Não há ingênuos, só grandes interesses em salvar alguns milhões. Houve problemas assim com o espanhol BBVA quando a parceria com o Econômico (ACM era interessado) foi desfeita nos anos 90.

As suspeitas sobre o STF
A credibilidade e a segurança são pedras angulares no mercado de capitais. Assim como cristal, quando um cálice trinca, a unidade tem de ser descartada. Mais sério, no entanto, são os arranhões que as relações do Master com o mundo político produziram na credibilidade do Supremo Tribunal Federal. Juízes foram palestrar promiscuamente em seminários com largo patrocínio do banco em questão. [é uma situação que se repete nas agências reguladoras]. Como não há vedação legal à atuação de parentes de juízes, desembargadores e ministros do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal na advocacia privada, há situações conflitantes na ética. Lembro do passado, quando os filhos do saudoso Evandro Lins e Silva já advogavam, e alguns casos recentes: a ex-mulher de Gilmar Mendes (estão separados há um mês), Guiomar Mendes, dirigiu, por várias décadas, o escritório do advogado Sérgio Bermudes em Brasília, uma das maiores bancas de advocacia do país, que tinha como clientes o Banco Nacional e grandes empresas com contencioso no STJ e no STF. Os filhos do ministro Luiz Fux montaram, há dois anos, um escritório de advocacia na Rua Barão da Torre, em frente à Praça Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, no Rio, no qual o pai terá lugar quando se aposentar, em abril de 2028.

Mas há situações que podem arranhar a credibilidade dos membros do Supremo, sobretudo quando os julgamentos dos acusados pelas tramas golpistas contra o Estado Democrático de Direito estão no fim, com grande ressentimento dos bolsonaristas. O presidente do STF, Edson Fachin, quer um código de conduta para os tribunais superiores.

O ministro do STF, Antônio Dias Toffoli, em cujas mãos foi parar, por sorteio, como relator, a “Operação Compliance” da Polícia Federal, que investiga as possíveis fraudes entre o Master e o BRB referentes à troca de cessão de créditos, determinou sigilo sobre o caso na primeira semana de dezembro. O ministro recebeu os autos da Justiça Federal a pedido da defesa de Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, depois que a PF apreendeu, em um dos endereços do banqueiro, um envelope com o nome do deputado federal João Carlos Bacelar (PL-BA). O STF é o tribunal responsável por processar e julgar parlamentares. Antes, a defesa de Vorcaro tentou tirar o caso da primeira instância da Justiça Federal, que decretou a sua prisão preventiva.

Até aí tudo estaria correto.

Levantou suspeitas o fato de que o ministro, palmeirense convicto, viajou, de São Paulo para Lima (Peru), no fim de novembro, no avião particular de seu amigo, o empresário palmeirense Luiz Oswaldo Pastore, para assistir, no sábado 29 de novembro, à final da Taça Libertadores entre o Palmeiras e o Flamengo. O jogo, como se sabe, terminou com vitória do Rubro-Negro por 1 X 0 e o tetracampeonato de um time brasileiro na competição sul-americana.

O que deu dor de cabeça ao ministro do STF foi a revelação, pelo jornalista Lauro Jardim, de “O Globo”, confirmada pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, de que, no mesmo voo, estava o advogado Augusto Arruda Botelho, ex-secretário nacional de Justiça. Todos palmeirenses, pegaram carona no jatinho para assistir à final da Libertadores em Lima, no Peru. Botelho é advogado do diretor de “compliance” do Banco Master, Luiz Antônio Bull, que chegou a ser preso na “Operação Compliance Zero” e agora está em liberdade provisória, com tornozeleira eletrônica.

É verdade que o processo ainda não havia sido distribuído ao gabinete de Toffoli quando os dois embarcaram rumo ao Peru. A distribuição foi feita por sorteio entre os ministros do STF. Mas tão logo retomou o expediente no STF, em 2 de dezembro, e foi sorteado relator, Toffoli determinou sigilo nas investigações. A acareação de terça-feira próxima é resultado dos desdobramentos do processo. Mas Toffoli jura que só trataram de amenidades futebolísticas nas cinco horas de voo (otimista) para Lima e no retorno (depressivo) a São Paulo.

O Master e a família Moraes
Por artimanhas outras, em janeiro de 2024, há dois anos, portanto, o escritório de advocacia Barci de Moraes, comandado por Viviani Barci de Moraes, mulher do ministro-relator do processo da trama golpista no STF, Alexandre de Moraes, celebrou um contrato milionário com o ascendente Banco Master, de Daniel Vorcaro, pelo qual ela e os filhos, que tocam as atividades, receberiam R$ 3,6 milhões mensais. A duração seria até o começo de 2027. Cumprido até o final, renderia R$ 130 milhões à banca. Com a intervenção do Banco Central, o contrato foi interrompido, mas teria rendido R$ 79 milhões em 22 meses.

Acontece que a partir do fim fevereiro deste ano, quando os três Poderes da República brasileira voltaram a operar integralmente, e o governo Trump completava 40 dias, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho 03 do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, declarou nas redes sociais que estava se licenciando para trabalhar nos Estados Unidos junto ao governo Trump para interferir a favor de seu pai e demais acusados na trama golpista. Num primeiro momento, a versão vendida pelo filho 03 e pelo economista Paulo Figueiredo, neto do último ditador brasileiro, o general João Figueiredo, de que o Brasil não era democrático e promovia uma “caça às bruxas” aos golpistas bolsonaristas, chegou a convencer parte do Departamento de Estado dos Estados Unidos. Em junho, o presidente Donald Trump ameaçou o governo brasileiro pelas redes sociais, e exigiu a IMEDIATA (escreveu com letras garrafais) suspensão do julgamento no TSF, além de impor altas tarifas alfandegárias às exportações brasileiras.

Em agosto, houve uma escalada, com tarifas de até 50% nos produtos brasileiros exportados para os EUA, e sanções da Lei Magnitsky ao ministro Alexandre de Moraes, sua esposa e filhos e mais sete ministros do SFT. As sanções da Magnitsky poderiam atingir o sistema bancário, a começar pelo Banco do Brasil, por onde recebem os ministros do STF. E preocuparam todo o mercado financeiro, motivando forte queda das ações dos bancos de agosto até meados de setembro. Houve a natural preocupação do ministro Moraes (o alvo principal da Magnitsky) de avaliar o impacto da lei sobre o mercado financeiro e a economia brasileira. Daí as consultas frequentes ao presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo.

Mas justamente depois da decretação da intervenção no Banco Master e liquidação de algumas de suas empresas, em decorrência da abertura de diálogo entre o presidente Donald Trump com o presidente Lula quando da Assembleia Geral da ONU, em 15 de setembro, foram sendo removidas as barreiras tarifárias contra produtos brasileiros nos EUA. As negociações prosseguem com perspectiva de baixa nas tarifas sobre café, carne, peixes e frutas, além de madeiras serradas, no começo de 2026. Mas o mais importante foi a retirada, em 12 de dezembro, dos nomes do ministro Alexandre de Moraes e de sua mulher, Viviani, da lista de sanções. Dias depois, na sessão de 18 de dezembro, a Mesa da Câmara dos Deputados cassou o mandato de Eduardo Bolsonaro por excesso de faltas.

Como não podia deixar de ser, além do mandato, diante da dupla ou tripla derrota – Eduardo perdeu no tarifaço, o julgamento prosseguiu levando o pai à prisão por 27 anos e três meses, e as sanções contra os Moraes foram revogadas pelo governo Trump -; o filho 03 começou a incentivar uma campanha para intrigar tanto o ministro Alexandre de Moraes quanto o presidente do Banco Central, insinuando, por meios diversos (há também quem veja digitais de André Esteves na intriga) que Moraes pressionava o Banco Central pelo Banco Master, embora as duas autoridades garantam que nunca trataram sobre nada além dos impactos da Magnistiky. De certa forma, a acareação determinada por Toffoli, mesmo que esdrúxula, vai ajudar a clarear a situação e pôr parcialmente os pingos nos is.


Banqueiro André Esteves, do BTG, que comprou ações do Master na Light: dedo na intriga Moraes-Master Reprodução de vídeo



Um fim de ano melancólico para os Bolsonaro
Graças a uma operação de hérnia inguinal, no dia 25, com internação na véspera autorizada por Alexandre Moraes, Jair Messias Bolsonaro evitou passar a noite de Natal da cadeia da Polícia Federal, em Brasília, embora estivesse sob custódia da PF e tornozeleira eletrônica no Copa Star.

Para aumentar os dissabores do fim de ano, a família teve a confirmação, sexta-feira, 26 de dezembro, pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), vinculada à Organização dos Estados Americanos (OEA), de que o Brasil sofreu uma tentativa de golpe de Estado em 2022/23 liderada por Jair Bolsonaro e seus aliados. Bolsonaro se reuniu em fevereiro com o relator do documento, Pedro Vaca Villarreal, e esperava ver no relatório reparos à atuação do Supremo Tribunal Federal. Pois o relatório destaca o papel fundamental do STF nas investigações, que estão levando às condenações da grande maioria dos envolvidos.

Tendo indicado seu filho 01, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), como o candidato do PL à Presidência em 2026, o clã Bolsonaro ganhou algum alento com a boa repercussão – até aqui – da candidatura do senador em outubro de 2026. Entretanto, o clã não perde a oportunidade de perder uma oportunidade.

Com a prisão do ex-diretor geral da Polícia Rodoviária Federal, Silvinei Vasques, em meio à fuga rocambolesca a partir pro Paraguai, onde foi detido e entregue à Polícia Federal, o ministro Alexandre de Moraes determinou, nesse sábado (27), a prisão preventiva domiciliar de outros 10 réus do núcleo 2 da trama golpista, antes que tentem imitar Vasques, condenado a 24 anos - mas cuja sentença ainda não transitou em julgado (ainda cabem recursos ao STF).

Pé-de-chinelo
Cassado por faltar às sessões da Câmara ao tramar nos Estados Unidos contra o Brasil, com a imposição de tarifas e a Lei Magnitsky que geraram mais de US$ 7 bilhões de prejuízos às exportações e ao sistema financeiro, o filho 03 resolveu ressuscitar o veio nacionalista da família – que bateu continência para a bandeira americana na Avenida Paulista e louvou o tarifaço e as sanções financeiras aos bancos brasileiros – tão logo foi veiculada a mensagem de Ano Novo das Havaianas, estrelada pela atriz Fernanda Torres.

Falar em patriotismo, lembrando a bandeirinha do Brasil em algumas tiragens do passado, além de anacrônico, chega a ser cômico, antes de ser trágico, partindo de quem tanto atuou contra o país em 2025.

Que todos entrem com os dois pés no chão em 2026 e tenham bons fluidos no Ano Novo.

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