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O mundo contra nós

A ausência de certa unidade propositiva, quero crer, acentua a indisposição da opinião pública internacional em relação ao Brasil

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É evidente que prospera a hostilidade dos meios ambientalistas internacionais em relação ao Brasil, sentimento que tem se ampliado à medida em que constatam e deploram nossos fracassos nesse campo. Ainda agora, acusados de insuficientes iniciativas protecionistas do clima, emissores de gás estufa, acabamos de amargar a exclusão do clube dos 70 países empenhados em projetar ações não degradáveis nas próximas quatro décadas. Na linha das críticas mais ferozes nem têm estado ausentes certos governos que andaram descuidados, tanto como temos sido nós. Viram as costas para as tragédias ambientais que também colecionam. Diga-se, contudo, que os tratamentos diferenciados não devem ser suficientes para que nos sintamos perdoados por omissões praticadas.

Há que fazer alguma coisa; muita coisa. Talvez começando por admitir que as ações e proposições nessa área vêm pecando, pelo que poderíamos chamar de “desconcerto” das iniciativas praticadas, muitas vezes, em campos isolados. É o que se descobre, a título de argumentação, no papel desempenhado pelo Congresso, onde conflitam projetos e discursos que buscam a preservação dos recursos ambientais, tanto nos aspectos jurídicos, como na visão política e científica. Atropelam-se, de tal forma, que acabam na mesma vala comum da inviabilidade. Não tem sido possível, salvo juízo diferente dos parlamentares, uma certa harmonia no encaminhamento de iniciativas para as questões atinentes.

Caberia, pois, considerada a reconhecida relevância, promover alguma disciplina na discussão dos numerosos projetos que buscam a mesma causa, mas dela acabam distanciados. Nada mais adequado e oportuno, para que se dê ao Brasil um norte legislativo na defesa dos bens naturais tão degradados; desprotegidos e ofendidos, mas ainda imensos neste país generosamente contemplado pela natureza.

Outro ponto, de importância não inferior, diria respeito à coordenação de iniciativas entre os poderes Legislativo e Executivo, que, não raro, têm caminhado em rotas diferentes, mesmo quando pregoam a intenção de chegar a um ponto comum. Porque não há como divergir na rota de objetivo tão superior. Mais recentemente, para buscar exemplos ainda calcinantes, vimos a destruição de imensas áreas do Pantanal e da floresta Amazônica, e sobre eles raramente foi possível identificar visões e discursos coincidentes entre o Congresso e o Planalto. Pelo contrário, perde-se tempo na discussão de desencontrados percentuais da destruição, ou na troca de responsabilidades difusas. E o fogo ardendo.

A ausência de certa unidade propositiva, quero crer, acentua a indisposição da opinião pública internacional em relação ao Brasil, que, ao contrário, prefere ter olhares clementes com a devastação com que os incêndios se alastram pelas florestas dos Estados Unidos, da Austrália e em pontos isolados da África.

Mas, mesmo não contando com isonomia internacional na distribuição de culpas, certo é que temos pecados ambientais. Devemos confessá-los, com humildade, e dar garantias de sincero esforço para alcançar a remissão.

Falou-se do entrosamento entre os poderes nessa questão essencial. Longe de ser o único desafio a encarar, certamente é o primeiro, porque, a partir daí, poderemos reduzir a carga de hostilidades que contra nós orquestra-se em quase todas as partes do mundo.

Há que se tomar em consideração outro detalhe, que não dispensa preocupação. É a escasso interesse da opinião pública frente ao intenso noticiário sobre os acidentes que agridem a natureza. As pessoas, quando muito, limitam sua preocupação a breves lamentações. Falta, por sobre tudo, maior envolvimento da sociedade nessa questão; envolvimento, digamos, com base em conteúdo didático. É preciso ensinar ao homem da rua, de que geração for, os inevitáveis riscos, menos do presente que do futuro, se hoje não despertarmos da sonolência que temos vivido em relação à escalada da degradação. Para informar, por exemplo, que não é mero devaneio dos cientistas, quando advertem para a gravidade da ascensão de dois graus Celsius sobre a vida, a começa pelos seres que vivem nos oceanos, ameaçados de despovoamento. Se não explicarmos, a tendência é conferir pouco caso ao caos que ameaça.

Demais, se nos permite a boa vontade dos indigenistas, e das organizações que se levantam em defesa das populações embrenhadas, cabe acentuar que é nas aldeias que devemos construir os primeiros e mais rigorosos defensores das riquezas florestais, da fauna e dos cursos de água doce; até porque são elas as beneficiárias diretas. Devem estar vigilantes nas invasões e atentar para os próprios índios, quando estes ajudam a agredir os bens naturais. Há uma tendência a expor as comunidades indígenas apenas como vítimas, quando, na verdade, elas significam muito mais. São guardiães.

No alvorecer de um novo ano, vários desafios nos aguardam. Um deles é tentar alcançar mentalidade mais racional, menos romântica, sobre as riquezas naturais que cercam o país. Riquezas que, jamais deixando de ser nossas, fazem bem ao mundo inteiro.