Cidades Inteligentes

Por Ricardo Salles

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CIDADES INTELIGENTES

A busca por zerar emissões

Relatório da Agência Internacional de Energia para a presidência italiana do G20 identifica que as cidades podem ser a chave para um futuro com emissões líquidas zero (quando se equilibra a quantidade emitida removida)

Publicado em 21/05/2023 às 10:31

Alterado em 23/05/2023 às 00:00

Globalmente, as cidades respondem por mais de 50% da população, 80% do PIB, dois terços do consumo de energia e mais de 70% das emissões de carbono. Esses fatores crescerão significativamente nas próximas décadas, impulsionados, dentre outros fatores, pela tecnologia no campo, onde a cada dia, menos trabalhadores são necessários. Estudos da AIE apontam que até 2050 mais de 70% da população mundial viverá em cidades, resultando em um crescimento maciço na demanda por infraestrutura de energia urbana.

 

Macaque in the trees
Fonte: Relatório da IEA, Empowering Cities for a Net Zero Future. Adapted from UN (2018), Population of Urban Agglomerations with 300,000 Inhabitants or More in 2018, by country, 1950-2035 (Foto: Reprodução)



Neste cenário, fontes de energia como a bioenergia e a energia nuclear têm ganhado destaque na busca por soluções energéticas limpas e sustentáveis em todo o mundo.

Aqui temos dois problemas que precisam ser resolvidos, o primeiro diz respeito à geração de energia limpa para perpetuação da vida no planeta com qualidade, e o outro é sobre dar condição para que o desenvolvimento possa ser efetivo. Sem energia não há desenvolvimento, e ainda temos um gargalo que é o horário de ponta, aquele onde há uma concentração do consumo, normalmente entre 15h e 21h.

Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico - ONS, existem 212 localidades isoladas no Brasil. A maior parte está na região Norte, nos estados de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Amapá e Pará. A ilha de Fernando de Noronha, em Pernambuco, e algumas localidades de Mato Grosso. Entre as capitais, Boa Vista (RR) é a única que ainda é atendida por um sistema isolado. A energia dessas regiões é gerada, principalmente, por térmicas a óleo diesel. Isso é grave e precisamos resolver; para estes e tantos outros casos, a energia nuclear é uma alternativa bastante razoável, e vou concentrar nela este texto.

A energia nuclear é gerada a partir da fissão de átomos de urânio, produzindo calor, que por sua vez gera vapor para movimentar as turbinas geradoras de eletricidade. Essa energia elétrica pode ser utilizada para alimentar as atividades cotidianas da cidade, incluindo, residências, indústrias, transporte público, entre outros.

A estabilidade na geração é um dos pontos altos, não depende de condições climáticas, o que é importante para as cidades onde fontes de energia confiáveis e estáveis são fundamentais. As centrais nucleares podem operar continuamente por longos períodos sem interrupção, garantindo o fornecimento constante de eletricidade.

Esta matriz não emite gases poluentes na atmosfera, o que reduz a poluição do ar e os efeitos do aquecimento global. Além disso, a produção de energia nuclear requer uma quantidade significativamente menor de recursos naturais do que outras fontes de energia, como os combustíveis fósseis.

O Brasil é um dos países com as maiores reservas de urânio do mundo, com grande potencial para a produção de energia nuclear. Isso é uma vantagem econômica significativa, já que o urânio é um recurso mineral estratégico que é utilizado em diversas aplicações, além da produção de energia elétrica.

O engenheiro Jairo Bastos, doutorando e um especialista na área, destaca que a AIEA facilita a realização de missões de especialistas que ajudam os países a melhorarem a eficácia das suas entidades regulatórias e de operação de instalações nucleares. Jairo ainda afirma que "o Brasil está pronto e a hora que a população tiver acesso a informação de qualidade sobre o tema, certamente nos transformaremos em uma das maiores potências na área, o que viabiliza o desenvolvimento industrial, econômico e socioambiental para o país”.

A tecnologia de geração de energia nuclear tem caminhado em direção aos Micro Modular Reactors (MMRs) e Small Modular Reactors (SMRs), estes são reatores nucleares modulares de tamanho reduzido que têm sido considerados como uma grande inovação tecnológica para a geração de energia nuclear em menor escala, ideal para instalações próximas aos centros de uso da energia e uma ótima opção para Cidades Inteligentes.

Mais de 70 projetos estão em desenvolvimento no mundo, sendo liderados por startups, até por conceituadas organizações com presença internacional, como a inglesas Rolls-Royce, que pretende ser uma referência. Isso nos aponta uma tendência que certamente nos próximos anos estará presente com força nas nossas cidades e distritos industriais.

John Forman, presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear - ABEN, é um entusiasta das usinas modulares e nos aponta um estudo da EPE que mostra o desenvolvimento e avanço da tecnologia. As SMRs têm seu foco em gerar entre 20Mwh e 300Mwh, mas empresas estão desenvolvendo as MMRs entre 2Mwh e 20Mwh. Estas podem atender demandas de pequeno porte, e a área ocupada por uma usina destas, se comparada a uma fotovoltaica, deixa uma vantagem muito grande, pois é na ordem de 10 vezes menor, só que gera energia 24 horas por dia, diferente da outra que precisa da radiação solar.

Estas pequenas usinas podem ser construídas em fábricas e transportadas em módulos para o local de instalação, o que reduz significativamente os custos de construção e torna o processo mais eficiente, além disso, as SMRs são muito seguras, dados todos os avanços tecnológicos desenvolvidos nas últimas décadas. Isso inclui a utilização de sistemas de resfriamento redundantes e isolados, bem como a implementação de sistemas de contenção que limitam riscos.

Temos hoje no Brasil mão-de-obra especializada e pronta a multiplicar este conhecimento para o ecossistema, nos colocando em posição de destaque no cenário internacional novamente.

As MMRs e SMRs têm potencial para serem usadas em várias aplicações, como a geração de energia elétrica, produção de hidrogênio, dessalinização de água e propulsão naval. Eles também podem ser usados em locais remotos ou em áreas que não têm acesso a uma rede elétrica confiável. Mas a aplicação de maior impacto na sociedade será em substituição a outras fontes com a construção de distritos de energia nos centros de nossas cidades. A geração de uma energia limpa direto no ponto de consumo elimina a absurda perda que hoje temos na transmissão, e certamente impulsionará nossa economia, seja gerando estabilidade e segurança energética nos prédios de escritórios, hospitais, data centers e até mesmo nos distritos industriais. Outro destaque é que a água quente que precisa ser resfriada pode servir para economizar a energia em outros sistemas, tais como os necessários na hotelaria ou mesmo na refrigeração (cogeração).

Modelo de distrito de energia e refrigeração – Ricardo Salles


O lado social é outro ponto de destaque, considerando que devido ao nível de especialização profissional e a tecnologia embarcada em todo o processo, os salários pagos elevam o padrão social e incrementam a economia.

A tecnologia nuclear também é utilizada na produção de radioisótopos (isótopos de elementos químicos que são instáveis e emitem radiação ionizante. Isótopos são átomos de um mesmo elemento, que possuem o mesmo número de prótons, mas podem ter números diferentes de nêutrons em seus núcleos), que são usados em uma variedade de aplicações médicas, como tratamentos de câncer, diagnóstico e terapia de doenças, bem como na pesquisa científica.

Em suma, a energia nuclear e a bioenergia são fontes de energia reais na luta contra as mudanças climáticas, e devem ser consideradas como uma opção viável na transição para um futuro de baixo carbono das “Cidades Inteligentes” para emissões líquidas zero.

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