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Natal do livramento

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Me diga aí, veja se é capaz de adivinhar: qual o produto de boa qualidade que, dependendo do volume, pode custar menos que 100, que 50, e até menos que 30 ou 20 reais? Qual objeto que reúne condições ideais para atravessar dias, meses, décadas e chegar, por dentro, e por fora, em perfeitas condições de ser professor, irmão, amigo e nutriente ao mesmo tempo? Que coisa é essa que pode passar desapercebida, como coisa aparentemente inocente e, no entanto, ser capaz de unir vozes, mudar pensamentos, estabelecer redes, apoiar revoluções? Me diga, meu leitor amado, quem é o mistério único que pode ser arma, equipamento de libertação e não ser reconhecido por qualquer opressor, de passar por seus antagonistas, e de contornar até determinados exércitos e outras corporações? Quem é o mudo falante, o influenciador silencioso, o mensageiro que faz defunto viver e conversar, que faz a palavra do morto ainda fecundar? Quem pode copular almas, fazer filhos e frutos numa turma inteira sem ninguém desconfiar? O que é que, em cada mão se apresenta de alguma maneira e a cada alma traz um jeito único de encantar? O que é este objeto até agora neste texto não identificado que pode em seu corpo ocultar pensamentos , projetos, bilhetes, cartas, dinheiro, fotografias... ? O que é isso que dura, que atravessa séculos, é estudado e vira relíquia em museu? Quem pode ser o único professor de quem não teve nenhum outro? Quem é o mensageiro, o arauto simbólico que pode esconder dos inimigos seu conteúdo e, ao mesmo tempo salvar pátrias, situações, já que sua bagagem é passível de interpretações? Quem é esse transporte, esse avião, essa aeronave invisivel que leva o pobre a passear dentro do palácio sem ser barrado, que faz o rico entrar na favela, que circula o mundo inteiro e o seu sentido se aplica, se multiplica, se diversifica de acordo com cada língua em que opera? Quem é que nos faz gastar por ele só uma vez, mas qual um invisível cavalo alado, pode nos levar a viagens internacionais e nos fazer passar a tarde em Lisboa, Londres, Moçambique, Burkina Faso, Nigéria, Grécia, Egito, Paris, sem sair daqui, sem nos exigir visto ou passaporte? Quem, que sorte é essa que muda o destino dos presos, que pode intervir na diferença das classes, que empodera minorias, que liberta mulheres, que organiza ideias, grupos e seguidores? Quem é, meus leitores, de quem falo? Que espécie de coisa é essa que pode servir a um aluno, e a várias gerações? Quem pode ter nascido no século anterior ao futuro ao qual explicará ? Que loucura é essa? Do que fala a cronista? Quem é o cavaleiro de produções, filmes, roteiros, novelas, teatros e outras derivações? Quem é o apaziguador dos povos, o que traz os tratados de fé, o que pode no fim de tudo realmente produzir a paz? Quem é o fim das guerras, o promotor das igualdades e pode ser realizado por homem, criança e mulher? Quem é? Quem é o testemunho do pensamento humano que, de mão em mão, pode servir de casa em casa até o fim dos tempos ou o até o fim dos seus próprios dias? Quem que usado não gasta, bebido não esvazia, comido não desaparece, e quanto mais absorvido não se esgota? Quem é o pai do saber novo e a mãe do que ninguém preveria? Já sabe, meu leitor, do que falo? O nome de tal alegria?

Pois sem ele, aqui eu não estaria. E não teria me transformado no que sou, nem conheceria por sua via a palavra respeito. Porque lá em casa esse objeto era também brinquedo de infância, era o portador das utopias, era o baú das imaginações! Por ele é que minha cabeça e a dos meus irmãos puderam passear por campos inéditos. Este meu amigo querido, que na minha casa está nos banheiros, nos quartos, nas salas, à vista de amigos e visitantes, nas cabeceiras do meu filho, é fundamental para o desenvolvimento dos povos. Por causa desse sábio ambulante e portátil é que cultivei leitores, administrei românticos desejos. Só quando ele chegou na vida de muitos pretos é que começou a fazer sentido alguma lei de libertação. Por causa desse pequeno grande objeto, individual e coletivo, que Mandela tornou-se, de dentro das grades , o maior libertador.

Quem é que garante o lugar de fala das etnias, dos gêneros, das minorias, o lugar de fala escrito,que é a chave mestra da cidadania? É o livro, minha gente, é o livro! Por isso nesse natal, doe livros. É ele que, na Páscoa, não está pendurado nos tetos das lojas como os bombons e nem é sugerido como opção no saco de Noel. Dê livros de presente. Neste Natal faça um amigo oculto só com livro bom que você leu e ofereça a um amigo. Neste Natal compre um livro novo, não deixe fechar uma biblioteca, uma escola, uma livraria. São vitoriosos, resistentes, revolucionários os editores e os livreiros de agora.O livro é o que nos livrará de todo mal, amém. Livrai-nos do mal. Livrai-nos, ó cavaleiro Livro, livrai-nos!