CINEMA
Crítica - ‘A baleia’: um filme doloroso de se ver, com uma comovente atuação de Brendan Fraser
Por TOM LEÃO
nacovadoleao.blogspot.com.br
Publicado em 09/03/2023 às 14:37
Alterado em 09/03/2023 às 14:43
Uma coisa que causa estranheza quando olhamos a lista dos 10 filmes que concorrem ao Oscar de melhores do ano é notar que ‘A baleia’ não está lá (tem até o novo ‘Avatar’!). Tremenda injustiça. Porque ele é melhor do que vários da lista (assim como outro injustiçado, ‘Babilônia’). Após debutar em quarto lugar na lista de maiores bilheterias do fim de semana no Brasil, levando um público aproximado de 100 mil espectadores às salas de cinema, ‘A baleia’ (‘The whale’) teve o seu circuito ampliado desde quinta-feira, 2 de março, passando de 137 para 206 cópias dubladas e legendadas.
Dirigido por Darren Aronofsky (‘Réquiem para um sonho’), o doloroso drama é protagonizado por Brendan Fraser (que está absolutamente fantástico e irreconhecível como um homem que tem obesidade mórbida) que levou, semana passada, o Screen Actors Guild Awards de Melhor Ator, assumindo o favoritismo ao Oscar. No filme, Fraser interpreta Charlie, um professor de 270 Kg que não consegue sair do sofá e está repleto de problemas emocionais (principalmente a má relação com uma filha adolescente, que abandonou quando pequena, entre outras coisas). No Festival de Veneza, em setembro de 2022, o ator americano de 54 anos recebeu quase 10 minutos de aplausos na sessão de gala do longa. Não é difícil saber o porquê. Quando o filme acaba, estamos arrasados. Com a performance e com a trama.
‘A baleia’ (o nome, além de fazer uma analogia ao sobrepeso do personagem, está intrinsicamente ligado a ‘Moby Dick’, o livro de Herman Melville, cujo personagem vive citando passagens), que também está indicado ao Oscar nas categorias de Melhor Cabelo e Maquiagem e de Atriz Coadjuvante (para Hong Chau), andou essa semana na roda de polêmicas bestas. Tudo porque acusam Fraser de não ser um ator ‘realmente obeso’ fazendo o papel. Céus! Onde fica a atuação? O que seria do ‘Othello’, de Orson Welles, hoje? O ator e diretor não era negro. Mas era um excelente artista.
Fraser se transformou fisicamente para viver o personagem (além de muito boas próteses e maquiagem): um homem com obesidade severa que não consegue sair do sofá. Professor de literatura, ele precisa se confrontar com uma filha adolescente (Sadie Sink, de ‘Strangers things’) e sua ex-mulher (Samantha Morton, de ‘Minority Report’). O roteiro é escrito por Samuel D. Hunter, baseado em sua peça homônima. Por isso o filme se passa basicamente num único cenário, o sombrio apartamento do professor. E os personagens vão e vêm, alternados, exatamente como numa peça de teatro. Há apenas um pequeno momento fora da casa, numa varanda.
Aronofsky se interessou em adaptar a peça desde que a viu, mais de dez anos atrás. Ela tem elementos comuns a várias obras de sua filmografia. Como o contraponto com a religião (vistos em ‘Pi’, ‘Mãe!’ e ‘Noé’, por exemplo). Fraser, por sua vez, conta que teve uma entrega total ao personagem, como nunca fizera antes, para mostrar toda a força e vulnerabilidade de Charlie. “Ele tem uma melancolia que o paralisa, que vem do fato de nunca poder ter sido a pessoa que queria ser. Ele carrega muito sentimento de culpa”, explica o ator.
Aronofsky confessa que sempre esteve próximo de Fraser durante todo o processo, a fim de protegê-lo, pois sabia que, ao entrar no personagem, o ator também ficaria muito fragilizado emocionalmente. “Preconceito contra obesidade é uma das últimas fronteiras das maneiras de uma pessoa menosprezar a outra. Muitas vezes, as pessoas do tamanho de Charlie são invisíveis, vistas apenas por suas famílias e cuidadores. É uma forma de silenciamento’’, disse Fraser numa recente entrevista de divulgação do filme.
Esteja avisado de que, ao entrar na sala para assistir ‘A Baleia’, você não sairá da mesma forma. O tour de force de Fraser, bem como tudo o que cerca a produção, é de dilacerar o coração. Não será nenhuma surpresa se o ator, conhecido por trabalhos mais amenos, como a aventura ‘A Múmia’ e a comédia ‘George das selvas’ (onde exibia uma forma física espetacular), ganhar a estatueta dourada.
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