POLÍTICA

Coronel que clamou por golpe diz à CPMI que queria 'apaziguar' o país

Alegação causou revolta nos parlamentares; governistas, oposiçaõ e integrantes do Centrão afirmam que Jean Lawand Júnior mentiu

Por Gabriel Mansur
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Publicado em 27/06/2023 às 19:00

Alterado em 27/06/2023 às 19:06

Coronel do Exército, Jean Lawand Junior Bruno Spada/Câmara dos Deputados

O coronel do Exército Jean Lawand Júnior, que implorou por um golpe de estado para impedir que o "Brasil fosse entregue aos bandidos", afirmou à CPMI dos Atos Golpistas nesta terça-feira (27) que, na verdade, não queria destituir o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas sim que o então presidente Jair Bolsonaro (PL) mandasse uma mensagem "apaziguadora" aos seus apoiadores que acampavam nos quartéis pelo Brasil.

Lawand aparece nas mensagens interceptadas no celular do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), tenente-coronel Mauro Cid. O diálogo entre os militares supostamente indicaria a articulação de um golpe de Estado depois do resultado das eleições de 2022.

“A ideia minha, desde o começo, desde a 1ª mensagem com o tenente-coronel Cid, foi que viesse alguma manifestação [de Bolsonaro] para poder apaziguar aquilo e as pessoas voltarem às suas casas e seguirem a vida normal. Em nenhum momento eu falei golpe, eu falei ordem. E ordem, eu volto a dizer, é manifestação", disse o coronel em resposta aos questionamentos da relatora da CPI, senadora Eliziane Gama (PSD-AM).

Aos parlamentares, o militar alegou reiteradamente que os atos golpistas registrados em Brasília na esteira das discussões entre ele e Cid seriam apenas "coincidência". No depoimento, também afirmou que foi "infeliz" em algumas das mensagens enviadas.

A participação popular no golpe era um dos elementos citados no passo a passo da ruptura apreendido no celular de Cid. O próprio Lawand chegou a afirmar que "teria que ser pelo povo" após a ordem não ser dada por Bolsonaro.

"A sociedade brasileira, dividida em opiniões, acerca de 'o que vai acontecer?', 'o que vai ser agora?', 'como foi o pleito?'. A gente vendo aquelas pessoas, a insegurança trazida por aquilo, que podia levar a alguma convulsão social, a alguma revolta, a um problema na segurança, foi o que eu falei", afirmou.

A alegação causou revolta nos parlamentares. A senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da comissão, alegou que o coronel, ao fazer a afirmação, estaria infantilizando os integrantes da CPMI. Já o deputado Rafael Brito (MDB-AL) disse que o argumento "esgarçaria a inteligência" dos parlamentares.

Nem mesmo os senadores da oposição acreditaram nas declarações. O senador bolsonarista Marcos Rogério (PL-RO), que substitui Marcos do Val (Podemos-ES) na comissão, acusou Lawand Júnior de mentir no depoimento.

"Eu não sei quem lhe orientou, mas, de verdade, o senhor não convence ninguém. O senhor atrofia sua história, apequena sua carreira e tenta impor uma narrativa que não para de pé ao menor esforço. Não sei se vossa senhoria se convence da versão que está apresentando aqui no dia de hoje”, observou.

O presidente da CPI, Arthur Maia (União-BA), também afirmou que o coronel "faltou com a verdade durante o depoimento". Por motivações distintas, integrantes da base do centrão, bolsonaristas e governistas, em todas as inquirições, acusaram o depoente de mentir.

"Eu quero dizer que essa foi a reunião mais difícil como presidente desta CPMI. Mais difícil, porque intimamente eu acho que o senhor faltou com a verdade. Intimamente, foi um sentimento que eu tive”, afirmou Maia.

Apesar das acusações, porém, o militar não foi preso.No encerramento da audiência, Maia declarou ser “um legalista” e indicou que não aplicaria uma punição a Lawand. Maia ainda disse ter consultado o senador Sérgio Moro (União-PR), ex-juiz federal, e ouvido que Lawand "estava respondendo para não se incriminar e que eu não poderia interpretar aquilo apenas por uma suposição".

Entenda o caso

O nome de Lawand ganhou o noticiário após virem à tona as mensagens de caráter golpista trocadas em 2022 com o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL).As mensagens citadas pela PF são do período entre 27 de novembro de 2022 e 4 de janeiro de 2023. Em uma delas, o coronel pede "pelo amor de Deus" para que Bolsonaro dê a ordem para o golpe.

"Cidão, pelo amor de Deus, cara. Ele [Bolsonaro] dê a ordem que o povo tá com ele, cara. Se os caras não cumprirem, o problema é deles. Acaba o Exército Brasileiro se esses cara não cumprir a ordem do Comandante Supremo. Como é que eu vou aceitar uma ordem de um General, que não recebeu, que não aceitou a ordem do Comandante. Pelo amor de Deus, Cidão. Pelo amor de Deus, faz alguma coisa, cara. Convence ele a fazer", disse Lawand em um dos áudios, segundo transcrição da PF.

Lawand Júnior disse à CPI que sua observação sobre o Exército foi "infeliz", que não tem contato com ninguém do Alto Comando e que está arrependido. Ele pediu desculpas ao Exército e ao povo brasileiro e afirmou que apenas deu sua opinião "no calor do momento".

O coronel havia sido designado para representação diplomática do Brasil nos Estados Unidos, mas o Comando do Exército decidiu anular a nomeação após o surgimento do relatório da PF sobre o conteúdo do celular de Mauro Cid.

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