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O poder dos juros compostos e da disciplina financeira: lições que podemos aprender com a Mega da Virada
Por GABRIEL REDIVO
Publicado em 21/12/2025 às 11:43
Alterado em 21/12/2025 às 11:44
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A Mega da Virada, que tradicionalmente é sorteada no dia 31 de dezembro, é o sonho de boa parte dos brasileiros. Muitas pessoas terminam o ano fazendo sua “fezinha” para – quem sabe – começar o ano seguinte milionário. Costumo dizer que a Mega da Virada é o verdadeiro Jogo da Esperança Matemática. A chance de acertar as seis dezenas é de 1 em 50.063.860, mas quando alguém vence, vence também a própria estatística, e isso faz da conquista algo único. É o momento em que a matemática abre espaço para o improvável, e o sonho torna-se uma realidade.
Este ano, o prêmio previsto é de R$ 850 milhões – o maior já registrado no concurso (valor 33% maior que o do ano passado). Já imaginou começar 2026 com este valor na sua conta bancária? Nenhuma dívida, preocupação zero com os boletos daqui para frente e apenas a decisão mais importante da sua vida financeira: o que fazer com esse dinheiro?
Comprar dezenas de imóveis e receber um bom valor mensal com aluguéis? Adquirir carros dos sonhos, como Porsche e Ferrari? Viajar o mundo e se hospedar nos hotéis cinco estrelas mais desejados? Comprar um iate para passar dias em alto mar com a família e os amigos? São inúmeras opções...
E se você, ao invés de vez de correr para gastar, aplicar todo o dinheiro em uma carteira conservadora para viver apenas dos rendimentos e deixar o patrimônio crescer? A dúvida, então, é natural: quanto tempo levaria para transformar esses R$ 850 milhões em R$ 1 bilhão?
Para responder, vamos imaginar três cenários diferentes, todos baseados em uma carteira conservadora de ativos de renda fixa. No primeiro cenário consideramos aplicar todo o recurso nos 100% do CDI (atualmente). O segundo adota uma visão mais de longo prazo, considerando como taxa o CDI médio dos últimos 10 anos, que atualmente está próximo dos 11% ao ano. No terceiro cenário, o mais comum entre investidores qualificados, é o da carteira conservadora que rende 110% do CDI de longo prazo, o equivalente a 12,1% ao ano de retorno bruto.
Em todos os casos, é importante lembrar que as aplicações em renda fixa no Brasil estão sujeitas a Imposto de Renda de 15% sobre os rendimentos (para prazos longos) e que o ganho real deve ser medido após descontar a inflação, que estimamos aqui em 5% ao ano.
Começando pelo cenário mais generoso, com o CDI atual de 15% ao ano, o rendimento líquido após o imposto de 15% ficaria em cerca de 12,75% ao ano. Mesmo descontando a inflação média de 5%, ainda restaria uma taxa real de aproximadamente 7,4% ao ano. A essa velocidade, o prêmio da Mega chegaria a R$ 1 bilhão em pouco menos de dois anos e quatro meses. Ou seja, quem ganhasse o prêmio na virada de 2025 para 2026 poderia se tornar bilionário em meados de 2027, apenas deixando o dinheiro quieto em aplicações de baixo risco.
No cenário mais moderado, considerando o CDI de longo prazo de 11% ao ano, o retorno líquido cai para cerca de 9,35% ao ano (já com IR de 15%). Após descontar a inflação, a taxa real seria de 4,14% ao ano. Nesse ritmo, o salto dos R$ 850 milhões para R$ 1 bilhão levaria aproximadamente 4 anos. Um prazo ainda bastante curto, considerando que o investidor não assumiria praticamente nenhum risco de mercado.
Agora, para quem quiser um pouco mais de eficiência sem sair do perfil conservador, dá para imaginar uma carteira rendendo 110% do CDI de longo prazo, o que equivale a 12,1% ao ano. Descontando os mesmos 15% de IR, o retorno líquido seria de 10,3% ao ano, e, após a inflação, de 5% ao ano real. Nesse cenário, o bilhão chegaria em cerca de 3 anos e 4 meses, digno de quem investe com estratégia, mesmo com o pé no chão.
A renda mensal líquida seria de R$ 7,3 milhões, já descontando o IR e o impacto inflacionário. Isso significa que, mesmo retirando R$ 7 milhões por mês, valor que já supera o faturamento de muitas empresas, o investidor ainda poderia ver seu patrimônio crescer em termos reais, preservando o poder de compra ao longo do tempo.
Essas simulações mostram algo que vai além da curiosidade: o poder dos juros compostos e da disciplina financeira. Mesmo sem correr riscos, o dinheiro cresce de forma exponencial quando o tempo trabalha a seu favor. E o mais interessante é perceber que, apesar da inflação e dos impostos, o ganho real continua expressivo. O que diferencia o milionário do bilionário, nesse caso, não é a sorte do sorteio, mas a paciência de deixar o dinheiro render.
E se, dentro desse terceiro cenário, com a carteira que rende 110% do CDI de longo prazo, o investidor decidir sacar R$ 1 milhão por mês para viver com conforto, manter padrão de vida elevado e ainda assim preservar parte significativa do patrimônio? Mesmo realizando retiradas constantes, a força dos juros compostos continua impressionante. O patrimônio não apenas se sustenta, como segue crescendo, nesse ritmo, mesmo com saques mensais de sete dígitos, o investidor ainda alcançaria o tão sonhado R$ 1 bilhão em cerca de 4 anos e 7 meses. Ou seja, é perfeitamente possível aproveitar a vida desde o primeiro mês, com folga financeira, e ainda assim deixar o patrimônio caminhar de forma consistente rumo ao bilhão. Uma prova de que, quando a matemática trabalha a seu favor, disciplina e tempo falam mais alto do que qualquer impulso.
Ao final, o exercício serve para lembrar que a renda fixa, muitas vezes vista como “conservadora demais”, é capaz de entregar resultados impressionantes quando se combina tempo, escala e disciplina. Ganhar R$ 850 milhões pode ser questão de sorte, mas transformar isso em R$ 1 bilhão e garantir uma renda vitalícia é pura matemática financeira.
Gabriel Redivo é sócio e diretor de gestão da gestora de patrimônio Aware Investment