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Quando Rita Lee jogava handebol
Por RICARDO A. FERNANDES, [email protected]
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Publicado em 10/05/2023 às 22:00
Alterado em 10/05/2023 às 22:00
Na Vila Mariana dos anos 60, a diversão aos domingos de manhã era descer até o Ibirapuera e pedir uma banana split. Dava para ir a pé, mas encarar a subida da Sena Madureira na volta não animava as meninas do Liceu Pasteur. Como, na época, era permitido circular de carro por todas as ruas do parque, a turma arranjava carona até a sorveteria. Um quiosque com balcão na frente, nada além disso. Atrás de onde, hoje, fica a Praça da Paz.
Segunda era dia de aula. No corredor, a sala da goleira do time de handebol era a última à esquerda. Rita Lee, pivô “zagueira” e melhor jogadora de linha, ficava na primeira à direita. As duas mal se falavam, recatadas. Não eram próximas, seus amigos não se reuniam em festas. Mas o compromisso com a equipe do colégio era sério. Nunca chegavam atrasadas aos treinos. Entravam para ganhar.
Os jogos aconteciam na quadra do Pacaembu. Vez ou outra no Pinheiros. A goleira e a zagueira eram as mais altas do time que avançava no torneio. Na torcida, que não chegava a ocupar uma fileira da arquibancada, os meninos da sala da goleira faziam a festa. A zagueira levava os rapazes da sua banda, acompanhados de violões.
O time era bom. A torcida, pequena e animada. Era difícil passar pela Rita, sempre séria e comprometida. Quando isso acontecia, lá estava a goleira para garantir a meta da equipe que chegou à final do intermunicipal e levou a taça.
Comemoração. Talvez a festa tenha sido um chopp no Ema, sábado à noite. Para voltar, no máximo, até às 11.
Agora, as campeãs da capital disputariam o estadual contra o melhor time do interior. No dia do grande jogo, uma confusão: o técnico levou o time até o Pacaembu. Chegando lá, a quadra vazia. A final seria no Pinheiros.
As meninas do Pasteur chegaram esbaforidas. Esse, no entanto, era o menor dos problemas. Rita Lee, com problemas na vista, havia sido operada e estava fora da final. Sem a jogadora, dava para encarar? Para piorar, as adversárias haviam chegado no horário, tranquilas e concentradas. E eram grandes, magras, fortes.
Foi um vareio. O time da capital mal viu a cor da bola. Sem a defensora, o caminho até o gol era um corredor desocupado. Resultado: 9 a 2 para o time de Franca.
O chopp no Ema e, no dia seguinte, a banana split no Ibirapuera não fariam mal às vice-campeãs. Creio que para minha mãe, que contou a história e era a goleira do time, assistir a um show da banda da destacada pivô seria, também, um bom prêmio de consolação.
Publicitário, escritor e vice-presidente da União Brasileira de Escritores. Autor do romance “Através”.