DIREITOS HUMANOS

Por proteção, familiares de Mãe Bernadete deixam quilombo onde ela foi assassinada

Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Estado da Bahia informou que equipes da pasta e policiais estão na comunidade para dar segurança aos moradores

Por JORNAL DO BRASIL
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Publicado em 19/08/2023 às 19:09

Alterado em 19/08/2023 às 19:14

Jurandir Pacífico, filho da Maria Bernadete, líder quilombola assassinada na Bahia Arquivo pessoal/Divulgação

A secretária de Promoção da Igualdade Racial do Estado da Bahia, Ângela Guimarães, disse, neste sábado (19), que os familiares de Bernadete Pacífico, líder quilombola executada a tiros em frente à sua casa, na quinta-feira (17), foram retirados da comunidade Quilombo Pitanga dos Palmares, no município de Simões Filho, Região Metropolitana de Salvador, como medida de proteção. De acordo com Ângela, equipes da pasta e policiais estão na comunidade para dar segurança aos moradores.

Mãe Bernadete, como era conhecida, tinha 72 anos e foi assassinada por dois homens que atiraram diversas vezes contra sua residência. O corpo da yalorixá foi enterrado neste sábado, em Salvador. A líder quilombola foi homenageada com samba, caminhada pelas ruas de Simões Filho e com ritual candomblecista.

“Estamos dando todo o acolhimento. Obviamente a comunidade está assustada, porque ninguém esperava uma situação tão brutal e tão torpe. Estamos com a presença da Polícia Militar e retiramos os familiares para eles não ficarem na comunidade. Também estamos identificando as pessoas que necessitem dos programas de proteção à vítimas e de defensores de direitos humanos”, disse Ângela.

Macaque in the trees
Mãe Bernardete foi assassinada na quinta-feira Foto: Divulgação

A secretaria informou que as investigações estão em curso e que há uma determinação do governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues, para uma apuração rigorosa por parte das polícias Militar e Civil para descobrir os autores e possíveis mandantes do crime. A Polícia Federal também abriu inquérito para investigar o caso.

Quem foi Bernardete?

Mãe Bernadete era coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ) e ex-secretária de Promoção da Igualdade Racial de Simões Filho. Ela foi morta a tiros em sua casa e terreiro religioso, enquanto assistia televisão com dois netos e mais duas crianças. Ela já vinha denunciando há algum tempo a diversas instâncias governamentais que estava sendo ameaçada de morte.

A líder quilombola também estava empenhada na busca da justiça pela morte do seu filho Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, conhecido como Binho do Quilombo, também assassinado a tiros em 2017. A Yalorixá sempre denunciou a violência enfrentada pelas comunidades quilombolas.

Entidades condenam

Em nota divulgada sexta-feira (18), o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania lamentou o assassinato, manifestou solidariedade aos familiares e à comunidade e informou que enviou equipes “para que todas as providências necessárias sejam tomadas”.

“Que as autoridades consigam com celeridade encontrar os culpados e que esses sejam punidos com o total rigor da Lei”, diz a nota.

Para o coordenador da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) Denildo Rodrigues, conhecido como Biko, o cenário é de preocupação, ainda mais na Bahia, estado que registrou, segundo a entidade, pelo menos 11 mortes de quilombolas nos últimos 10 anos.

Biko disse ainda que o assassinato de Mãe Bernadete mostra a urgência de se avançar na titulação dos territórios ancestrais e quilombolas e na efetivação dos direitos dessa população.

“Isso mostra que nós temos muito que avançar na política da regularização fundiária. O estado brasileiro ainda tem que trabalhar muito para tirar dos porões da Esplanada [dos Ministérios] uma política de quilombo. É importante que ações concretas sejam feitas, não é só falar. Temos mais de seis mil territórios quilombolas e não chegam a 200 os territórios titulados. Não tem como avançar na regularização dos territórios e garantir, de fato, que essas famílias possam permanecer no território, se não tiver o braço forte do estado e com recursos”, afirmou.

O assassinato de Mãe Bernadete também foi condenado por organismos internacionais. Em um comunicado divulgado neste sábado, o escritório regional para a América do Sul da ONU Direitos Humanos manifestou solidariedade com a família e a comunidade e convocou o Estado Brasileiro a realizar uma investigação “célere, imparcial e transparente” sobre o homicídio.

*Com Agência Brasil