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Máfia dos ingressos: polícia e promotor dizem que membro da Fifa é "graúdo"

“Seria impossível conseguir 20% dos melhores ingressos sem a ajuda de alguém de dentro"

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O promotor Marcos Kac, da 9a. Promotoria de Investigação Penal (PIP) do Rio de Janeiro, já deu as primeiras pistas da identidade do suposto integrante da Fifa envolvido com a máfia internacional de venda iliegal dos ingressos para a Copa do Mundo. Segundo Karc, se trata de um homem suíço e muito influente na Fifa, que quando revelado o seu nome pode abalar a cúpula da entidade. O suspeito é chamado pela Polícia do Rio de "tubarão". “Seria impossível conseguir 20% dos melhores ingressos sem a ajuda de alguém de dentro", disse o promotor. Um membro da empresa Match, única autorizada pela Fifa a comercializar as entradas dos Mundiais, também sendo investigado por participação no esquema.

Sobre o caso:

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A Polícia Civil vai pedir à Justiça a quebra do sigilo telefônico do suposto funcionário "tubarão" da Fifa envolvido no escândalo dos ingressos. A decisão foi tomada após o depoimento do advogado do franco-argelino Mohamadou Fofana Lamine, acusado de chefiar a quadrilha, José Massih. Segundo o delegado Fábio Barucke, da 18a. DP (Praça da Bandeira), Massih forneceu o primeiro nome do membro da entidade em troca de uma possível delação premiada. O "tubarão" mantinha contatos telefônicos com Lamine, como foi confirmado em escutas telefônicas autorizadas pela Justiça. A polícia vai pedir a prisão de outras sete pessoas ligadas ao grupo criminoso, entre eles um chinês que agia em São Paulo e um Mc da Zona Oeste do Rio de Janeiro.   

O jornalista britânico Andrew Jennings denunciou nos últimos anos um esquema fraudulento mantido pelo alto escalão da Fifa, visando o desvio de ingressos para venda no mercado negro nos quatro últimos Mundiais e em troca de favores e vantagens nos países sede do campeonato. Jennings publicou um livro com as suas investigações sobre o esquema - "Um jogo cada vez mais sujo". Ao tomar conhecimento das prisões dos integrantes da quadrilha no Brasil, desde a última terça-feira (1/7), Jennings elogiou a atuação da polícia do Rio e está otimista quanto a solução do caso. "Isso é emocionante [a prisão dos integrantes da quadrilha e investigação sobre os membros da Fifa]. É animador que os policiais do Rio tenham tomado esta iniciativa e espero que eles e os juízes tenham a coragem e resistência para seguir com esta investigação até o fim", disse o jornalista britânico. "Todos os bilhetes vêm dos irmãos Byrom e quando provas suficientes forem coletadas, eles devem ser interrogados formalmente e perguntados como os bilhetes chegaram aos bandidos. É possível traçar a rota de cada bilhete e os policiais devem isso ao povo brasileiro para descobrir e processar todos", complementou.

"Tubarão" pode estar no Copacabana Palace ou fora do país

Na coletiva realizada nesta quinta-feira (3/7), no Centro Integrado de Comando e Controle, na Cidade Nova, a Polícia Civil do Rio disse que o membro da Fifa ligado à quadrilha de cambistas pode estar hospedado no Copacabana Palace, na Zona Sul da cidade, onde também está concentrada a cúpula da organização para o Mundial. A informação foi dada pelo delegado titular da 18ª DP, Fábio Barucke. O delegado afirma que os ingressos privilegiados ligam diretamente “a pelo menos um membro da Fifa”, pela facilidade de conseguir o repasse. 

Segundo o delegado, um dos presos na operação, José Massih, advogado do também preso Lamine Fofana, alegou o benefício da delação premiada e entregou o primeiro nome do suspeito. Contudo, Barucke não informou o nome do integrante da Fifa, que segue em segredo de justiça. “Ele deu o nome dessa pessoa e isso está sendo avaliado e vamos ver se alcançamos essa pessoa. Nós temos alguns elementos, mas ele não sabia dar todos os elementos para chegar a essa pessoa. É um nome comum, que ainda falta a qualificação completa”, pontuou o delegado da 18ª DP, que explicou que o benefício da delação premiada ainda será analisado.

Das 50 mil interceptações eletrônicas, 25 mil já foram escutadas. Barucke explicou que, agora, está finalizando a primeira etapa do processo e terminando relatórios e é a hora de “exaurir as escutas”. Finalizada esta primeira parte, inicia-se a segunda fase, quando jogadores, ex-jogadores e pessoas próximas a eles podem ser chamadas para depor. Entre eles está Junior Baiano, que alugou seu apartamento para Lamine durante o Mundial. Sobre a relação entre o brasileiro e o franco-argelino, o delegado esclarece: “O Lamine alugou o apartamento do Júnior Baiano nesse período de Copa. Ele pagou e estabeleceu um contrato. Há uma relação contratual normal entre eles”. No apartamento do jogador foram apreendidos 100 ingressos, que seriam revendidos pela quadrilha.

Além de Júnior Baiano, Dunga, que aparece nas investigações com relação próxima ao argelino, também pode ser chamado para depor. O ex-técnico da Seleção Brasileira esteve em uma festa dada por Lamine e também teve encontros e conversas em outros locais, inclusive hotéis. Barucke contou que, durante as festas que promovia, o franco-argelino distribuía ingressos para jogadores. “Eu tinha policiais dentro dessas festas, que fizeram registros em vídeo”, garante.

O pai de Neymar é outro que aparece em escutas telefônicas. Em uma das ligações, Lamine diz para um homem que está ao lado do pai e empresário do jogador. O irmão de Ronaldinho Gaúcho, Assis, também pode ter repassado ingressos para que Lamine revendesse a preços superfaturados. Novos depoimentos e possíveis prisões, de pelo menos sete pessoas, podem ser feitas a partir da semana que vem.

“Nós detectamos diversas fontes de ingressos que chegam nas mãos de cambistas, facilitadas pela forma de distribuição de ingressos. Grande parte desses ingressos são destinados a patrocinadores, Ongs e jogadores de futebol”, disse Barucke. Durante as investigações, a Polícia Civil chegou a um DJ, da Vila Kennedy, que seria o responsável por repassar para os cambistas os ingressos destinados às Ongs. De acordo com o delegado, quando identificado, o DJ será autuado.

Durante a coletiva, o delegado ressaltou que as escutas telefônicas indicaram que o grupo atua há, pelo menos, quatro Copas do Mundo. Ele contou que em uma das ligações, um dos presos diz trabalha há mais de 30 anos como cambista em Mundiais. Com o restante das escutas, a Polícia Civil espera chegar a mais envolvidos no escândalo. “Como foi uma investigação diferenciada, para um evento que tem prazo para terminar, nós não tivemos tempo de ouvir todos esses registros. Falta ouvir a metade. Então ainda temos muito material para analisar ainda. A equipe está trabalhando dia, noite e final de semana”, ressaltou. Durante o cumprimento dos mandados, conta o delegado, foi apreendido um documento “de um preso que, na Copa de 98, se declarou como jornalista para ter entrada no evento”. A exceção de Massih, os outros dez presos se negaram a falar na delegacia e vão responder em juízo.

Perguntado sobre o grande número de brasileiros participantes da quadrilha, o delegado explicou: “Nossa investigação iniciou-se contra brasileiros e por fim chegou ao Fofana. Certamente a rede de envolvidos é mais extensa. Nós temos a certeza que tem um chinês que está em São Paulo. Sabemos que onde tinha a Copa, eles iam. Aqui no Brasil eles viajavam para todos os jogos da seleção e vendiam ingressos para todo o país em malotes, via aéreo. Nas escutas interceptadas, eles falavam que só no Brasil está acontecendo esse cerco ao cambismo, que nas outras Copas do Mundo foi muito mais fácil. Sabemos que existem outras seleções que repassavam ingressos privilegiados, mas não sabemos quais”. Barucke reforçou ainda que é preciso alcançar todo o grupo, desde a base até o maior escalão, ou seja, quem estiver acima de Lamine.

O delegado da Polícia Civil, Tarcisio Jansen, também participou da coletiva. Ele garantiu: “Quem tiver uma conduta dolosa na venda honerosa de ingressos com participação eventual nesse tipo de organização será trazido aos autos do inquérito”. Jansen pontuou que “desde o início da operação Copa do Mundo, essa foi uma grande preocupação da Polícia Civil. Todos os órgãos estão trabalhando de forma reservada e ostensiva na repressão desse crime. Desde então, nos assusta um pouco a quantidade de autuações relacionadas a esse crime”.

Jansen disse ainda que, “no último jogo que teve no Maracanã, foram 21 autuações de cambismo. Os agentes podem perceber que é um crime muito recorrente, tanto no entorno do Maracanã, quanto no grande número de ocorrências que estamos testemunhando. A Polícia Civil desde o início, em seu planejamento estratégico, previu uma ação contundente em determinados crimes que impactariam o evento. E o crime de cambismo é um deles”.