ASSINE
search button

Amigos e familiares prestam homenagem a capitã morta em incêndio no RS

Palavras da mãe e o choro da filha marcaram o enterro nesta quarta-feira

Compartilhar

"O que eu pude fazer por você eu fiz, dando carinho, apoio, sempre perto de você". Essas foram as palavras de Maria Cristina Dias de Mattos, mãe da capitã do Exército Daniele Dias Mattos,ao se despedir da filha no enterro realizado no Cemitério de Inhaúma, na Zona Norte do Rio, nesta quarta-feira(30).

Ao lado dela, a filha de Daniele, Anna Carolina, de 14 anos, chorava agarrada a uma bandeira do Brasil. Ela estava no exterior quando soube da morte da mãe, e voltou ao Brasil para acompanhar o enterro. 

Daniele foi uma das 235 vítimas do incêndio na Boate Kiss, na cidade gaúcha de Santa Maria, na madrugada de domingo(27). A capitã, cardiologista da unidade coronariana do Hospital Central do Exército, estava de férias em Santa Maria, cidade onde havia trabalhado entre 2005 e 2011, no Hospital de Guarnição local.

O clima no enterro foi de desolação, muitas lágrimas e poucas palavras. Além das palavras da mãe, poucos presentes disseram alguma palavra durante a cerimônia. Daniele foi enterrada com honras fúnebres pela Guarda do Exército Brasileiro, com direito a salva de tiros em homenagem à capitã. Não havia muito a ser dito: o silêncio era a tradução perfeita da dor dos parentes e amigos que foram prestar a última homenagem a Daniele.

Depoimentos

A tenente e fisioterapeuta Sílvia Nobre, que trabalhou dois anos com Daniele, falou sobre a amiga e disse que a médica era treinada em socorro de emergência e, por isso, acredita que ela tenha morrido tentando salvar alguém. 

"Era uma menina simples, especial. Está todo mundo arrasado. Pelo nosso trabalho, convivemos todo o dia com a morte, mas quando é alguém do nosso convívio o desespero é maior", disse Sílvia.

"Daniele era tão apegada ao trabalho que se esquecia da hora do almoço", acrescentou a fisioterapeuta. A militar contou ainda que Daniele será sepultada com a farda do Exército.

A prima de 3º grau de Daniele, Sueli Coutinho, de 55 anos, não a via há uns 10 anos. A última vez foi no enterro da avó da militar. “Participei de toda essa situação com muita tristeza. A morte dela foi estúpida. Espero que a justiça seja feita”, disse ela. Rosalina Cardoso, de 56 anos, que também é prima da capitã, mas de 2º grau, também quer “justiça” neste caso. “É o que espero, para que isso não aconteça com outros jovens”, afirmou ela, dizendo ainda que Daniele resolveu ficar até segunda-feira em Santa Maria, contrariando a previsão inicial de deixar a cidade no sábado.

Perfil

Filha de Maria Cristina Dias de Mattos e Sérgio Pires de Mattos, Daniele nasceu em 04 de março de 1976, na cidade do Rio de Janeiro. Na vida civil, formou-se em Medicina pela Universidade Federal Fluminense (UFF), em 1998.

Daniele Mattos incorporou às fileiras do Exército Brasileiro em 4 de dezembro de 2004, como Aspirante a Oficial do Quadro de Oficiais Temporários. No mesmo ano, foi admitida em concurso público para a Escola de Saúde do Exército (EsSEx).

Em 7 de março de 2005, Daniele iniciou o Curso de Formação de Oficiais na Escola de Saúde do Exército, sendo nomeada 1º Tenente de Saúde Médica em 05 de novembro daquele mesmo ano. A Oficial foi transferida por término de curso para o Hospital de Guarnição de Santa Maria (H Gu S M), no Rio Grande do Sul, unidade em que serviu até 02 de fevereiro de 2011.

Além do Curso de Formação de Oficiais, Daniele realizou Pós-Graduação - Especialização em Perícias Médicas do Programa de Capacitação e Atualização dos Profissionais de Saúde do Exército Brasileiro (PROCAP/ Sau) em 2010, pela Escola de Saúde.

Em 9 de março de 2011, foi transferida para o Hospital Central do Exército (HCE), localizado no bairro de Triagem, no Rio de Janeiro, onde atuou como Médica Cardiologista da Unidade Coronariana (UniCor ? HCE). Daniele Mattos foi promovida ao posto de capitão em 25 de dezembro do mesmo ano.

Daniele estava de férias desde o dia 31 de dezembro e retornaria no dia 30 de janeiro de 2013. Ela deixou uma filha, Anna Carolina, de 14 anos.

Outra vítima carioca da tragédia é cremada no Caju

Nesta terça- feira (29), o corpo do tenente Leonardo de Lacerda, outra vítima carioca da tragédia, foi cremado no cemitério do Caju.

Dezenas de pessoas, entre familiares, amigos e colegas do Exército, acompanharam, em clima de forte consternação, o velório do tenente Leonardo, de 28 anos. A cerimônia aconteceu no Cemitério Memorial do Carmo, no Caju, Zona Portuária do Rio. A família do tenente pediu aos jornalistas para se manterem afastados do local, e também solicitou aos representantes do Exército que foram ao velório para que não realizassem homenagens além das que já estavam sendo prestadas pelos presentes.

Durante o incêndio, o tenente Leonardo Lacerda conseguiu deixar a boate, mas decidiu voltar para o interior para ajudar outras vítimas. Ele chegou a socorrer uma colega, mas decidiu entrar novamente e acabou morrendo intoxicado pela fumaça.

O coronel Mário Fonseca, que foi representar o Comando Militar do Leste no velório, destacou a bravura de Leonardo. "Ele já tinha saído e voltou para salvar outro oficial. Depois, de tirá-lo da boate, voltou mais uma vez. Esta é uma atitude inerente aos oficiais do Exército". 

Juntamente com o coronel estavam dez homens representando o 2º Regimento da Cavalaria. O objetivo era prestar uma homenagem especial ao tenente, mas a família preferiu que ela não acontecesse. Mesmo assim, o coronel Fonseca admite a possibilidade de o Exército conceder postumamente ao tenente alguma honraria. O corpo de Leonardo será cremado por volta das 17h40.

Marcelo Moreira, 73 anos, vizinho do tenente em Copacabana, lamentou a morte do jovem. "O garoto era o filho que todo pai queria ter. Nunca se metia em confusão, não fumava, não cometia excessos. Morreu como herói", disse. 

A amiga do jovem tenente, Mariana Dutra, 26, estava visivelmente abatida: "Não caiu a ficha ainda". Ela conta que a família passa por um momento de muita dor, mas tenta se conformar de que foi uma escolha de Leonardo - assumir o risco ao voltar para a boate - morrer como herói.

Os corpos dos dois militares chegaram na noite desta segunda-feira ao Rio de Janeiro. Leonardo estava no primeiro regimento de carros de combate de Santa Maria há apenas 15 dias. Já Daniele estava de férias e visitava junto com o noivo, Herbert Magalhães Charão, que também morreu no incêndio, amigos que tinham na cidade, onde ela serviu de 2006 a 2011.

Gás idêntico aos usados pelos nazistas

Um incêndio de grandes proporções deixou mais de 230 mortos na madrugada deste domingo (27)em Santa Maria (RS). O incidente, que começou por volta das 2h30, ocorreu na Boate Kiss, na rua dos Andradas, no centro da cidade. O Corpo de Bombeiros acredita que o fogo iniciou com um sinalizador lançado por um integrante da banda que fazia show na festa universitária. A queima dos forros das paredes que eram revestidas com material para abafar o som acabou gerando uma forte fumação que matou os jovens intoxicados.

Incêndio em boate no RS gerou o mesmo gás usado por nazistas

Segundo um segurança que trabalhava no local, muitas pessoas foram pisoteadas. "Na hora que o fogo começou foi um desespero para tentar sair pela única porta de entrada e saída da boate e muita gente foi pisoteada. Todos quiseram sair ao mesmo tempo e muita gente morreu tentando sair", contou. O local foi interditado e os corpos foram levados ao Centro Desportivo Municipal, onde centenas de pessoas se reuniam em busca de informações.

>>>> Prefeitura transfere responsabilidade de alvará a bombeiros

>>> Juiz autoriza bloqueio de bens de donos da boate Kiss

A prefeitura da cidade decretou luto oficial de 30 dias e anunciou a contratação imediata de psicólogos e psiquiatras para acompanhar as famílias das vítimas. A presidente Dilma Rousseff interrompeu viagem oficial que fazia ao Chile e foi até a cidade, onde se reuniu com o governador Tarso Genro e parentes dos mortos.