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Pesquisador sobre UPPs: Rio de Janeiro está muito longe de encontrar a paz

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O assassinato do líder comunitário Vanderlan Barros, esta semana, na favela da Rocinha (Zona Sul), recém ocupada por forças de segurança, e a invasão de homens armados na reunião de candidatos à presidência da escola de samba Estação Primeira de Mangueira, na "pacificada" comunidade da Zona Norte, reacenderam o debate sobre os avanços da política de segurança pública do atual governo estadual, que vê na ocupação de comunidades cariocas a solução para combater os problemas gerados pelo tráfico de drogas. 

Diante dos mais recentes problemas envolvendo comunidades "pacificadas", o Jornal do Brasil ouviu pesquisadores que analisaram os rumos da segurança pública no estado. Eles  constatam que ainda falta muito para que a população das favelas não esteja mais à mercê de grupos criminosos.

A declaração de que o Rio de Janeiro reencontrou a paz, proferida pelo governador Sérgio Cabral, em Roma, na Itália, nesta sexta-feira (30), foi completamente rechaçada pelo especialista Ignácio Cano, do Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Para ele, os últimos eventos de mortes em favelas já ocupadas expõem a fragilidade. 

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Apesar de destacar a diminuição de homicídios em áreas que contam com Unidades de Polícia Pacificadora (os casos de homicídios dolosos - com intenção de matar - diminuíram até 71%. É o caso da área da Grande Tijuca. Já os autos de resistência - mortes em confronto com a polícia - foram a zero), Cano alerta para a violência na Zona Oeste e na Baixada:

"No caso da Rocinha, os casos de assassinatos noticiados recentemente estão atrelados à fase de transição. Como foi ocupada, mas ainda não conta com uma UPP, há uma grande disputa de grupos de traficantes rivais pelo controle da venda de drogas. Já no caso das comunidades como as do Complexo do Alemão, ocupadas há mais de um ano, o maior desafio para se resolver os problemas é a capacitação das tropas que lá atuam", aponta o especialista. "O Rio de Janeiro está muito longe de reencontrar a paz. Temos pouco para festejar, e muito para trabalhar. Também é preciso uma preocupação do governo estadual com a Zona Oeste e a Baixada Fluminense, o que ainda não está acontecendo".

Para o sociólogo João Trajano Sento-Sé, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, os assassinatos em áreas ocupadas e os atentados a policiais militares que atuam em UPPs (no ano passado, um soldado foi baleado no Morro do Fogueteiro e ficou tetraplégico, enquanto um colega está paraplégico após confronto no Morro da Coroa) mostram que a atual situação das comunidades preocupa.

"A experiência das Unidades de Polícia Pacificadora é muito nova. Os últimos eventos, infelizmente, não me surpreendem. A população das comunidades pacificadas continua muito exposta às ações criminosas. É preciso criar mecanismos para identificar falhas e aperfeiçoar o que está sendo feito. Precisa-se evoluir, e muito", avalia Trajano.

Mediação de conflitos

Organizadora e uma das autoras do livro Cem anos de favela, a pesquisadora da Uerj Alba Zaluar ressalta a ingenuidade daqueles que acreditam que a situação consolidada com o domínio do tráfico de drogas desapareceria de uma hora para outra com a chegada da polícia às áreas antes conflagradas. 

"Os traficantes não vão desistir com facilidade da atividade que exerciam há décadas. Na Mangueira, há uma disputa pela questão política, no restante das comunidades pacificadas há uma briga pelo controle do tráfico de drogas - ainda que seja feito sem ostentação de armamentos pesados", diz Alba. "Além de muitas outras carências de ordem social precisa-se treinar os policias para mediar conflitos".