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Barbosa vota pela condenação de João Paulo, Valério e seus sócios

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O ministro Joaquim Barbosa, na continuação do julgamento da ação penal do mensalão, nesta quinta-feira, votou também pela condenação de João Paulo Cunha (PT) — presidente da Câmara dos Deputados na época dos fatos — pela prática dos crimes de lavagem de dinheiro e peculato (duas vezes).

Os réus Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano de Mello Paz — sócios da empresa de publicidade SMP&B — foram igualmente condenados pelo relator, nesta etapa do julgamento, por peculato. No início da sessão, João Paulo e os sócios da agência tinham sido declarados culpados pelo ministro-relator da prática de corrupção passiva e ativa, respectivamente.

O crime de lavagem praticado pelo ex-presidente da Câmara dos Deputados ficou configurado, segundo o ministro-relator, pela recepção de R$ 50 mil em espécie, através de sua mulher, em 4 de setembro de 2003, com base numa operação em que a matriz do Banco Rural em Belo Horizonte enviou a ordem de pagamento para a agência em Brasília como se fosse para o próprio banco, havendo, no entanto, comunicação interna para que a quantia fosse entregue ao ex-parlamentar ou à sua esposa.

>> Relator condena João Paulo Cunha por corrupção passiva 

O primeiro crime de peculato, segundo Barbosa, ficou comprovado com a autorização dada por Cunha para a terceirização do contrato principal que a Câmara dos Deputados mantinha com a agência publicitária  SMP&B ( de Marcos Valério, Ramon Haollerbach e Crisiana de Mello Paz). Com base nessa autorização para pagar serviços de terceiros com recursos públicos, da ordem de quase R$ 11 milhões, apenas o percentual de 0,01% (R$ 17.091) foi realmente executado em serviços para a Câmara pelos terceirizados.  “Vejam, senhores ministros, é engenharia e arquitetura”, comentou o relator em seu voto. E acrescentou: “O crime está materializado. Apenas 0,01% dos serviços prestados no contrato da empresa foram executados”.

Lavagem

De acordo com o ministro Joaquim Barbosa, o “modus operandi” para o cometimento do crime de lavagem de dinheiro foi a emissão de cheque da SMP&B em Belo Horizonte, sem qualquer identificação do beneficiário. A agência não registrava o saque em nome do destinatário, que constava na agência via telex enviado pela agência central. Assim, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) não poderia detectar a operação.

“Não havia nenhuma formalização do saque em nome de João Paulo Cunha ou de sua esposa. Ela mesma disse na investigação que o valor sacado já estava à sua disposição na agência bancária de Brasília. Assim, o recebimento de R$ 50 mil em espécie, deu-se por lavagem de dinheiro. Só depois de buscas feitas no decorrer deste processo, descobriu-se o 'modus operandi', caracterizando-se, portanto, a lavagem de dinheiro”, disse o ministro.

Ele destacou que, “ciente de que o dinheiro tinha origem ilícita (crime contra a administração pública), João Paulo usou pessoa de sua confiança que não revelaria a terceiros o saque ilegal”. Assim, “o dolo da origem ilícita está presente, já que o próprio réu era o autor de crime antecedente (corrupção passiva)” — sublinhou o relator.

Finalmente, Barbosa lembrou jurisprudência do STF na linha de que “lavagem de dinheiro é crime autônomo”, podendo o agente responder pelos crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro.

A lei assim tipifica o crime de lavagem de dinheiro: “Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. (Pena: reclusão de 3 a 10 anos).

Peculatos

Logo a seguir, o ministro-relator votou pela condenação do réu, duas vezes, por crime de peculato.

Conforme o ministro-relator, a agência SMP&B terceirizou criminalmente os serviços que deveria prestar para publicidade da Câmara dos Deputados, em conluio com o então presidente da Casa. Relatou que, depois de diligências feitas no processo por peritos, constatou-se que somente uma parte ínfima dos serviços prestados correspondia a atividades de criação da agência, evidenciando-se “desvio de finalidade do contrato, com ônus para a Câmara”.

O mecanismo usado para alcançar o objetivo criminoso seria o seguinte: Cunha concedeu mais de 50 autorizacões para contratações de serviços de terceiros; os serviços subcontratados, no entanto, não se referiam aos de criação; as despesas relativas aos gastos de serviços não realizados foram depositadas nas contas da agência.

“Temos três conclusões de órgãos colegiados, todos no mesmo sentido, de que apenas o percentual de 0,01% dos gastos do contrato foi executado pela SMP&B”, afirmou Barbosa.

O relator acrescentou que, embora João Paulo Cunha tenha afirmado perante o Conselho de Ética da Câmara que nunca tratou de contrato com a “estrutura da Casa”, os autos demonstram o contrário, ou seja, “que o réu participou ativa e intensivamente da execução do contrato da Câmara com a agência de Marcos Valério”.

O outro crime de peculato atribuído ao ex-presidente da Câmara dos Deputados refere-se ao uso da empresa Idéia Fatos e Textos (IFT), do jornalista Luiz Costa Pinto — que era o assessor de imprensa de João Paulo Cunha — a fim de obter vantagens financeiras com o desvio de recursos públicos. O ministro Joaquim Barbosa acolheu a denúncia e a sustentação final do Ministério Público de que houve um desvio de R$ 252 mil em recursos públicos, dos quais João Paulo tinha a posse como presidente da Câmara, em proveito dos também réus Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Mello Paz.

O Código Penal assim tipifica o crime de peculato: “Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: Pena— reclusão, de dois a 12 anos, e multa”.