RIO - O jornal francês 'Le Monde' publica um artigo, na edição desta quinta-feira, classificando as autoridades brasileiras de 'negligentes' na tragédia das enchentes que devastaram a Região Serrana do Rio de Janeiro. "A nova tragédia mostra a negligência criminosa de algumas autoridades eleitas. Por demagogia ou interesses eleitorais, elas deixaram que o concreto tomasse os morros, ou mesmo encorajaram a especulação imobiliária", acusa o artigo.
Segundo o jornal, "a fúria da natureza tropical" pode ter sido a responsável inicial pelo desastre, mas "os céus têm menos culpa que os homens". "Não há fim no inventário das muitas falhas que levaram à tragédia", diz o diário francês, citando falta de capacidade para previsões meteorológicas precisas, inexistência de sistemas de alerta e a ocupação irregular em áreas de risco.
E o jornal vai mais longe, enfatizando que ''a prevenção não faz parte dos discursos dos políticos, totalmente focados em ações imediatas, porque isso daria pouco retorno a eles nas eleições''.
O artigo reproduz as declarações da consultora da Organização das Nações Unidas (ONU) Debarati Guha-Sapir, do Centro de Pesquisas sobre a Epidemiologia de Desastres (Cred), de Bruxelas, na Bélgica, para quem é um absurdo que o Brasil, com "apenas um perigo natural para administrar", não consiga fazê-lo.
"Este foi o 37º deslizamento de terra no Brasil em menos de dez anos. Imagine se o país também enfrentasse terremotos, vulcões ou furacões. O Brasil não é Bangladesh, não tem desculpas'', apontou a consultora.
Mortes
As enxurradas e deslizamentos de terra provocados pelo excesso de chuvas na Região Serrana do Rio de Janeiro entre os dias 11 e 12 de janeiro já causaram a morte de 741 pessoas. Segundo o último levantamento divulgado pela Secretaria Estadual de Saúde e Defesa Civil, 355 mortos foram registrados em Nova Friburgo, 302 em Teresópolis, 63 em Petrópolis e 21 em Sumidouro.
Os números da secretaria, entretanto, não contabilizam para São José do Vale do Rio Preto três mortes confirmadas pela Defesa Civil municipal. O balanço do Estado também não confirma uma morte em Bom Jardim, registrada pela Polícia Civil.
De acordo com os dados oficiais, 6,4 mil pessoas estão desabrigadas ou desalojadas em Petrópolis, 5.190 em Nova Friburgo e 2.240 em Teresópolis.
Nesta quarta, o trabalho das equipes de limpeza e resgate foi facilitado pelo bom tempo na região. Apesar disso, algumas regiões de Nova Fribugo continuam isoladas, de acordo com o tenente-coronel Roberto Robadey, coordenador da Defesa Civil.
Em relação ao fornecimento de energia elétrica, a concessionária Energisa informou que 97% dos clientes já tinham o serviço. O fornecimento de energia à principal estação de tratamento de água da Nova Friburgo foi reestabelecido, após a chuva danificar a rede de alta tensão.
O coordenador do segundo maior galpão de donativos de Teresópolis negou os boatos de que vítimas isoladas tenham comido carne de cachorro. Segundo o empresário Gilmar Gomes Chaves, moradores de todas as regiões receberam donativos.
Na edição de ontem do Diário Oficial da União, a Secretaria Nacional de Defesa Civil reconheceu o estado de calamidade pública decretado pelos municípios de Nova Friburgo, Sumidouro e Petrópolis. Com isso, o município e a população afetada podem fazer uso de alguns benefícios. Entre eles, estão a dispensa de licitação para a contratação de obras emergenciais e ao saque do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).