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Artigo: Um tijolo coletivo na casa deste sonho

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A fome endêmica atingindo milhões de brasileiras/os acabou no Brasil, graças ao Fome Zero, às políticas do governo Lula, à participação da sociedade civil, com ações coordenadas pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea), e ao engajamento voluntário e consciente de milhões de brasileiras/os, organizados ou não. O Brasil coloca-se outro desafio até 2014: acabar com a extrema pobreza, ainda presente, segundo o  Plano Brasil sem Miséria, na vida de 16,2 milhões de pessoas. Há hoje outro problema, quase tão sério quanto a fome: a obesidade, que ameaça tornar-se crônica e atinge amplos setores da população, de A a Z, ricos, pobres e remediados. As pessoas comem mal e/ou demais.

Neste contexto e realidade, os Conseas nacional, estaduais e municipais e  governos estão preparando a 4ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, a realizar-se em Salvador, de 7 a 10 de novembro, com o lema Alimentação adequada e saudável: Direito de todos.

O mundo está em crise. Crise econômica, ambiental, de valores. O desemprego bate à porta dos países ricos. Os trabalhadores dos países ditos desenvolvidos veem crescer a fome, até a miséria. A fome, que atingia 850 milhões de pessoas no mundo, aumentou hoje para 1 bilhão. Tsunâmis, terremotos, enxurradas, tempestades atingem todos e tudo, com consequências desastrosas, perdas materiais, mortes, choro e ranger de dentes. O consumismo do “ter” invade famílias, comunidades e corações, sem olhar se leva à solidariedade, à justiça e à dignidade. Monopólios e oligopólios destroem sementes crioulas e culturas milenares, espalham agrotóxicos, poluem rios e riachos, criam alimentos sem sal, sem sabor, artificiais, impõem preços e hábitos alimentares.

Ao mesmo tempo, a resistência se fortalece: os jovens de Barcelona, as mulheres dos países árabes, o povo latino-americano, os agricultores agroecológicos voltam às raízes. Consumidores conscientes rejeitam o plástico, os anabolizantes, as injeções químicas e transgênicas.  Querem um mundo para viver e respirar. Querem paz. Querem alimentos saudáveis. Querem direitos. Querem liberdade.

Realizar uma conferência para discutir alimentação saudável e adequada como direito de todos vai à raiz dos problemas e das soluções e ao cerne das mudanças urgentes, necessárias. A voz militante de quem quer um outro mundo possível engaja-se no esforço coletivo. Não há mais o quê e como esperar. Não só a fome tem pressa, como dizia Betinho. Também os direitos, a fraternidade, o meio ambiente, a floresta. Não ao consumismo. Não ao lucro desenfreado. Não às guerras. Não à concentração de terra, renda, riqueza e poder. Sim à vida, à simplicidade, sim ao bem-viver indígena.

O Brasil e seu povo fazem a sua parte. Mas uma andorinha apenas não faz verão. A 4ª Conferência espera a presença, o apoio entusiasmado e sorridente daqueles que continuam sonhando e acreditam no futuro, dos homens e mulheres de boa vontade cheios de esperança e fé em si mesmos, nos outros e nas outras. 

Nem gordos, nem magros. Saudáveis. Nem famintos, nem pobres, nem miseráveis, nem ricos ou super-ricos. Iguais. Sujeitos de direitos, protagonistas de um mundo justo com alimento adequado e saudável para todos e todas: homens, mulheres, jovens, idosos, crianças, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, agricultores familiares, militantes da economia solidária, acampados e assentados, moradores de favelas, população em situação de rua, catadores de material reciclável, trabalhadoras/es, funcionários públicos e professores. Somos todos e todas parceiros e parceiras. Companheiras e companheiros, no sentido original da palavra, que vem de "cum pane", no latim. Ou seja, "com pão": o pão repartido, o pão comunitário, o pão partilhado, o pão nas bocas e mesas sem distinção de cor, de raça, de gênero, de origem, de posses. O pão da vida, o pão da esperança, o pão do futuro.

O chamamento é este, a hora é essa. A 4ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional é uma pedra, um tijolo na casa coletiva deste sonho. Basta você  estender a mão e colocá-los no lugar devido, no lugar que merecem.

Selvino Heck é assessor especial da Secretaria Geral da Presidência da República e conselheiro do Consea