ARTIGOS

O Progresso da Ordem

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Por ADHEMAR BAHADIAN
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Publicado em 14/08/2022 às 11:03

Alterado em 14/08/2022 às 11:03

O 11 de agosto de 2022 talvez tenha acabado com a triste sina de se considerar agosto o mês das fatalidades políticas no Brasil, inaugurada com o suicídio de Getulio Vargas em 1954.

A manifestação nas Arcadas da Faculdade de Direito da USP, onde a sociedade brasileira finalmente cantou o seu mais belo canto de identidade democrática e de repulsa civilizada a ameaças ao sistema eleitoral disciplinado e ordeiro foi a reação mais cívica e patriótica dos últimos anos.

A presença silenciosamente eloquente do grande constitucionalista brasileiro José Afonso da Silva, apesar dos seus 95 anos de vida, testemunhava sua aprovação irrestrita à importância de se fazer ecoar no pátio das Arcadas a voz da defesa da liberdade e da Democracia, sóbria e dignamente recordada na "Carta aos brasileiros e brasileiras".

Chamava igualmente atenção o clima festivamente contido não só nas Arcadas ,mas também nas capitais do Brasil da juventude brasileira, a principal interessada no futuro de um Brasil sempre pacífico, respeitado internacionalmente e orgulhoso de sua população colorida, marca de nossa Democracia, até há pouco admirada e invejada.

Não houve nota dissonante nesta sinfonia cívica. Sem policiamento ostensivo nem provocações partidárias, ali se festejava, pela primeira vez neste ano, a alegria com o bicentenário da independência e se lamentava não se possa fazer o mesmo no sete de setembro vindouro, data agendada para se transformar em evento de contorno excludente e partidário a adiar a alegria do congraçamento cívico universal por que tanto ansiamos. Adiado para outubro.

As manifestações traduzem a determinação de respeitar e implementar o dístico da bandeira nacional em que “ Ordem e Progresso" sejam também o progresso da ordem jurídica e do Estado de Direito ,pois estamos cansados e abatidos de não vermos nem ordem nem muito menos progresso. Ao contrário, sentimo-nos acuados como se independentes não fossemos e ,pior ,como se temêssemos a possível regressão civilizatória a um Estado Neo-colonial, após duzentos anos de soberania nacional.

Este 11 de agosto certamente aprofunda o sentimento cívico recém-renascido. A alternativa autoritária a se espraiar em certos países não nos serve, não se identifica com nosso caráter nacional e, por tê-la vivido, minha geração lembra dela como uma noite indormida, em que as trevas eram menos temidas que o alvorecer.

O 11 de agosto coincidiu com a aprovação, pelo Congresso dos Estados Unidos da América , de lei a marcar o começo do fim do neoliberalismo predatório e do processo de injustiça social a ele incrustado nos últimos trinta anos sob a falácia de uma economia supostamente auto-regulável pela onisciência do mercado e pela ilusão de uma globalização falsamente universal.

A lei— modestamente chamada de “Redução da Inflação “— se propõe equilibrar, dentre outros, os custos dos medicamentos nos Estados Unidos da América, à revelia dos interesses das grandes corporações farmacêuticas e a promover ajustamentos fiscais de caráter social. Um remanejamento indigesto para oligopólios acostumados a remanejar preços com o olho gordo da especulação.
Ficará difícil para nossos fundamentalistas do mercado continuar a insistir numa politica econômica indutora de um quadro de fome endêmica e de abissal injustiça social.

Para completar, o FBI tornou pública a farsa patriótica de Donald Trump ao revelar sua apropriação criminosa de documentos ultra-secretos do Estado, no que só pode ser explicado por uma mente aleijada pelo narcisismo e prepotência. Homem que não hesitará em mais uma vez tentar promover uma cisão sangrenta na nação americana para saciar sua megalomania.

Constrange a escalada da violência armada, o estímulo suicida e genocida a uma supremacia branca afim com os piores momentos de organizações fratricidas como a Klu Klux Kan, página sombria da história do racismo americano. Os Estados Unidos da América a que tanto devemos por ter sido o inquestionável protagonista da erradicação nazista no mundo — com a contribuição exemplar da Forca Expedicionária Brasileira — se depara hoje com as sementes do ódio a minar seu passado e seu decantado “ destino manifesto”.

Mente fraturada a queixar-se por não serem os generais americanos tão leais quanto os de Hitler, fantasia desmentida pela história, Trump será contido.

Aos poucos, a roda do bom-senso se move. O 11 de agosto a azeitou no Brasil.

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