MEIO AMBIENTE

Campus na Mata Atlântica - uma tragédia anunciada

Desde que o Impa resolveu aumentar seu campus com a construção de um enorme projeto arquitetônico, dentro da floresta, situada no bairro do Horto, nas adjacências do Jardim Botânico, iniciou-se uma contenda com os moradores da vizinhança

Por JB RIO
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Publicado em 28/12/2022 às 10:41

Alterado em 28/12/2022 às 10:41

Área da mata depois do início das obras do Impa reprodução

É motivo de orgulho que o Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada) esteja localizado na cidade do Rio de Janeiro. A renomada instituição, além de desenvolver ciência de ponta, é uma importante aliada em projetos sociais de educação, sendo responsável pela Olímpiada Brasileira de Matemática das escolas públicas realizada anualmente no país.

No entanto, desde que o Impa resolveu aumentar seu campus com a construção de um enorme projeto arquitetônico, dentro da floresta, situada no bairro do Horto, nas adjacências do Jardim Botânico, iniciou-se uma contenda com os moradores da vizinhança, que se posicionam contra o desmatamento. O instituto já deu início à construção de seu novo espaço, derrubando centenas de árvores e matando espécimes da fauna local. A questão se tornou problemática quando a Associação de Moradores da Rua Barão de Oliveira Castro e da Rua Marquês de Sabará passou a alertar sobre pontos questionáveis do projeto, como a não obediência às leis ambientais, relacionados à instalação desse novo campus.

 

Macaque in the trees
Área da mata antes do início das obras do Impa (Foto: reprodução)

 

Segundo Ana Soter, presidente da associação, e mais diversos pareceres técnicos, os impactos ambientais não foram dimensionados corretamente. O licenciamento para a construção foi obtido no apagar das luzes da administração de Marcelo Crivella, e deveria ter ocorrido por meio do Ibama, e não do município, uma vez que o terreno de 251 mil m² possui sua maior parte – praticamente 90% – dentro do Parque Nacional e de sua área de amortecimento, o que atrai a competência para o órgão federal.

Ana Soter afirma que “estamos lidando com um crime ambiental licenciado. O que é infração, no caso, foi o processo de licenciamento, que deveria, naturalmente, ter acontecido na esfera federal, mas que foi trazido para a esfera municipal, exatamente porque não exigiria um estudo do impacto ambiental nem de vizinhança. O licenciamento, simplesmente, não teria acontecido se houvessem esses estudos. Justamente por isso, recentemente, a Defensoria Pública da União entrou com uma ação, colocando como réus o Ibama, a Prefeitura do Rio e o Impa”.

No dia 1º de junho do ano passado, foi realizada uma audiência pública (vídeo abaixo) mediada pelo vereador Chico Alencar (PSOL-RJ) na qual se pôde acompanhar os posicionamentos das partes.

 

 

Representando o Impa na audi~encia pública, o diretor da instituição, Marcelo Vianna, fez uma apresentação sobre a importância do novo espaço e a sua relevância para a comunidade. Entre diversos pontos, assinalou os seguintes:

“A fase 1 da obra é focada em segurança geológica e segurança hídrica. Estamos construindo depósitos de retenção das águas fluviais para minimizar quaisquer possíveis efeitos, e por acordo com a prefeitura, estamos construindo, como contribuição do Impa para o bairro, uma galeria pluvial externa para levar as águas do terreno até o rio dos Macacos, com a preocupação de que tivemos de fazer a galeria mais longa do que nos foi pedido pela Rio Águas, de modo que o desague aconteça antes da comunidade das casas que são particularmente frágeis e que estão à margem da comunidade do Horto Florestal e do Rio dos Macacos. A construção também é sustentável na sua concepção, é uma construção pré-moldada, apoiada sob pilotis e que se adapta ao perfil de relevo e permite impacto mínimo sob a fauna e a passagem da flora. O resultado dessa construção leve é uma edificação que, de fato, se esconde dentro da vegetação, como a imagem sugere. Uma edificação que dialoga com o meio ambiente, dialoga com a vegetação.”

 

Macaque in the trees
Imagem apresentada pelo IMPA para mostrar a 'integração do projeto ao meio ambiente' (Foto: reprodução)

 

Após a apresentação de Marcelo Vianna, foi chamado Sergio Fontoura, professor da PUC, especialista em geotecnia e indicado pela associação de moradores para contribuir no debate. Fontoura fez algumas perguntas que, segundo ele, carecem de esclarecimento:

“Qual o impacto desse tipo de movimentação de terra numa área em que já existe um risco geológico? Deformações podem acontecer no sistema, mesmo não conduzindo à ruptura, mas levando à fissuras no terreno em que pode haver penetração de água, e isso pode conduzir a uma situação de risco até maior do que inicialmente”.

Dois pontos importantes, aventados por alguns presentes, foram a adequação da obra a esse local específico e a ausência de alternativas locacionais. O fato de a sede do Impa estar localizada no Horto contribui para a escolha da nova sede, como extensão do Impa original. No entanto, de acordo com o deputado Carlos Minc (PSB-RJ) não foi discutida uma alternativa locacional, e que o Centro da cidade seria, possivelmente, mais adequado.

O projeto é importante para o Impa, mas não para muitos moradores e especialistas em meio ambiente, que têm emitido pareceres contrários. Estes apontam para a ausência de discussão sobre diversos pontos não esclarecidos, motivando as denúncias. Cabe ao poder público averiguar, com urgência, sobre possíveis irregularidades na condução do empreendimento, que, sem dúvida, terá grande impacto na vizinhança.

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