BRASIL

Antônio Carlos de Almeida Braga, o homem que liderou os seguros e perdeu o Bradesco

Por GILBERTO MENEZES CÔRTES, [email protected]
[email protected]

Publicado em 12/01/2021 às 22:23

Alterado em 13/01/2021 às 13:52

Antõnio Carlos de Almeida Braga Foto: arquivo

Antônio Carlos de Almeida Braga, o Braguinha, nascido em São Paulo em 1926 e que cresceu empresarialmente no Rio de Janeiro, morreu nesta 3ª feira, 12 de janeiro, aos 94 anos, em Sintra, Portugal, onde vivia, há décadas, e será enterrado no mausoléu da família, em Braga. Braguinha fundou o maior grupo segurador do Brasil (a Atlântica-Boavista, atual Bradesco Seguros, vendida 100% para o Bradesco em 1986) e se destacou como um empresário ousado e à frente do seu tempo. Torcedor fanático do Fluminense, do qual era benemérito, foi mecenas e amante dos esportes amadores (Ayrton Senna e Guga foram seus ídolos), sendo o 1º patrocinador do vôlei (através da Atlântica-Boavista). Torcia, mas não era apostador. Isso fez diferença na parceria dupla entre a Atlântica-Boavista e a Sul América, com o Bradesco, em 1973.

Braguinha começou no mercado segurador na Atlântica Seguros, de seu pai, no fim dos anos 40. A empresa tinha interesses no mercado imobiliário (que acabaram assumidos por seu irmão, José Carlos de Almeida Braga). Braguinha quis fazer carreira em seguros e se deu bem. Muito bem. A primeira grande tacada se deu no final dos anos 60, quando o Brasil tinha criado a correção monetária e estava estabilizando a economia. Isso ampliou o horizonte dos ativos do mercado segurador, que opera com visão de longo prazo (há companhias que carregam, papéis de renda fixa com 40/45 anos).

Delfim Neto era ministro da Fazenda (desde 1967) e estava promovendo uma onda de fusões e incorporações em diversas áreas, para a economia brasileira ganhar nova escala e reduzir custos. Em depoimento de 2008 ao Museu da Pessoa, Braguinha recorda sua primeira grande tacada: a compra, no fim dos anos 60, da Boa Vista Seguros, de Roberto Boa Vista. A empresa era bem maior que a Atlântica e bem menor que a Sul América, que durante quase um século foi a maior seguradora brasileira. Roberto Boa Vista já tinha oferecido a seguradora a Braguinha, quando este dirigiu o Banco do Estado da Guanabara no governo Carlos Lacerda (1961-65), sendo sucedido por Negrão de Lima.

Em 1968, o negócio foi fechado com um financiamento bancário, parte bancado pelo sucessor de Braguinha no BEG, Carlos Alberto Vieira (que depois dirigiu o Banco Safra por vários anos). A fusão com a Boa Vista, que tinha mais tradição no mercado (Roberto Boa Vista era também acionista do Banco Boavista, controlado pela família Paula Machado), fez a Atlântica Boavista crescer exponencialmente ao ganhar seguros estatais.

Uma frustração de Delfim – o “casamento desmanchado no altar, em 1972, entre o Bradesco, de Amador Aguiar, (maior banco comercial do país) e o Unibanco, de Walter Moreira Salles (então o maior banco de investimentos do país), depois que os dois banqueiros chegaram a posar para fotos com Delfim entre eles, no Ministério da Fazenda, no Rio –, acabou sendo benéfico para Braguinha, no ano seguinte.

Sorte e intrigas

Delfim foi procurado e decidiu ajudar a fusão empresarial em 1973 entre o Bradesco e a Atlântica Boavista (4ª seguradora do país) e a Sul América (da família Larragoiti, líder do país e com patrimônio muito maior). Mas a venda de seguros e planos de previdência privada correlatos (hoje o maior plano de saúde do Brasil é o Bradesco Saúde, também líder em previdência privada, e 2º em títulos de capitalização) foi mais benéfica a Almeida Braga que à família Larragoiti, representada por Leonídio Ribeiro Filho, que gostava de cavalos e foi presidente do Jockey Clube do Rio de Janeiro.

Uma desavença, quando a Brahma, de Hubert Gregg, sofreu tentativa de tomada de controle, em 1981, pelo trio do Banco de Investimentos Garantia (Jorge Paulo Lemann, Marcel Hermann Telles e Carlos Alberto Sicupira, que conseguiram, enfim, assumir o controle em 1986, criando a Ambev na fusão posterior à Antártica, em 1999) foi apelar para Amador Aguiar (o Bradesco era o banco da Brahma, para somar forças no bloco de controle com seus fundos de investimentos - Amador Aguiar recorreu à Sul America, que quis se desfazer da posição quase dois anos depois e ficou contrariado com as queixas de Gregg, devidamente exploradas por Braguinha) - encerrou a parceria do Bradesco com a Sul América, em 1983, e acabou levando Almeida Braga ao comando do Bradesco.

Amador não gostou da Vila Olímpica na Barra

Em depoimento em 2008 ao Museu da Pessoa (SP), Braguinha reconhece que um dos seus grandes erros à frente do Bradesco - ficou no comando do Conselho de Administração de 1983 a 1986, quando ele vendeu as ações da seguradora e transferiu as ações que tinha no banco para a primeira mulher (Vivi Nabuco) e os quatro filhos, se mudando para Portugal com Luiza Konder, de Almeida Braga, com quem teve mais dois filhos - foi não ter dado a devida importância à Fundação Bradesco. A obra sócio-educativa do banco, que ampara e educa as famílias dos funcionários da organização, era a menina dos olhos de Amador Aguiar, um homem espartano que morava na Cidade de Deus, em Osasco (SP), e estava na grande mesa do Bradesco pouco depois das seis da manhã.

Braguinha, de estilo mais boêmio, descontraído e amante dos esportes (acompanhava Olimpíadas e Copas do Mundo desde os anos 70) e seguia Ayrton Senna e Guga pelos circuitos mundiais, deu mais importância à Vila Olímpica do Bradesco, na Barra (Rio). E causou ciúmes em Aguiar. Num evento esportivo, havia mais cobertura da imprensa ao anúncio dos planos da seguradora e do banco (sempre independentes mesmo quando o Bradesco assumiu o controle da Atlântica Boavista em 1986 continuavam independente) do que nos anúncios do banco. Em relação à Fundação Bradesco, então...

O fim da parceria entre os dois titãs do mercado financeiro quase termina em duelo à bala, segundo se comentava discretamente nos corredores do Bradesco. Amador Aguiar sempre andava armado e ordenava à cúpula do Bradesco a não pagar resgate em eventual sequestro, (se mataria antes) – motivo de desavença no começo dos anos 80, quando o vice-presidente Beltran Martinez foi sequestrado (levando à saída de outros vice-presidentes, como Fernão Bracher, pai do presidente do Itaú, Cândido Bracher, que será substituído até abril). A reunião de separação foi o ponto final em uma suquência de desavenças de estilo. No começo da tensa reunião, Amador Aguiar teria colocado suas condições: “ou você acerta a venda das ações hoje, ou um de nós pode não sair vivo”.

Braguinha, que era um amante da vida, não pensou duas vezes. Foi desfrutar uma vida feliz, com a família, longe do estresse do mundo financeiro, por mais 34 anos numa Quinta da família em Sintra (Portugal), onde desenvolveu vinhos próprios. De lá ia com a família para uma casa nas Bahamas ou vinha ao Rio.

Nos dias seguintes, uma das primeiras providências de Amador Aguiar (falecido em 24 de janeiro de 1991), que reassumiu o comando do Conselho do banco por dois anos, antes de passar o bastão a Lázaro de Mello Brandão (falecido em outubro de 2019), foi encerrar o projeto da Vila Olímpica da Barra. A vasta área deu lugar a valiosos empreendimentos imobiliários na Avenida das Américas. Cada um morreu com suas convicções.

Os laços entre Braguinha e a Bradesco Seguros só foram reatados em 2007, quando Braguinha foi convidado pelo atual presidente do Conselho de Administração do Bradesco, Luiz Carlos Trabucco, então presidente da Bradesco Seguros e Previdência, para participar, em Portugal, de evento para mobilizar os portugueses a favor da eleição do Cristo Redentor como uma das “Sete Maravilhas do Mundo Moderno”, o que acabou ocorrendo em setembro, no Estádio da Luz, em Lisboa.