Cúpula mundial se reunirá sobre solução de dois Estados à medida que cresce o apoio à Palestina
Em meio à intensificação da ofensiva israelense em Gaza e à escalada da violência dos colonos israelenses na Cisjordânia, há um crescente senso de urgência para agir agora, antes que a ideia de uma solução de dois Estados desapareça para sempre
A França e a Arábia Saudita reunirão dezenas de líderes mundiais nesta segunda-feira (22) para juntar apoio a uma solução de dois Estados, com vários deles devendo reconhecer formalmente um Estado palestino - uma medida que pode atrair respostas duras de Israel e Estados Unidos.
Embora a cúpula possa elevar o moral dos palestinos, não se espera que traga mudanças no terreno, onde o governo de extrema direita da história de Israel declarou que não haverá Estado palestino enquanto avança com sua guerra contra o Hamas em Gaza.
A solução de dois Estados foi a base do processo de paz apoiado pelos EUA, inaugurado pelos Acordos de Oslo de 1993. O processo sofreu forte resistência de ambos os lados e praticamente morreu.
Israel e os Estados Unidos boicotarão a cúpula, disse o embaixador de Israel na ONU, Danny Danon, descrevendo o evento como um "circo".
Grã-Bretanha, Canadá, Austrália e Portugal reconheceram um Estado palestino nesse domingo (21). A França e cinco outros estados também devem fazê-lo formalmente nesta segunda-feira.
Embora a maioria dos países europeus agora reconheça um Estado palestino, tanto a Alemanha quanto a Itália sinalizaram que é improvável que façam tal movimento em breve.
A Alemanha - há muito tempo um forte defensor de Israel por causa de sua responsabilidade pelo Holocausto - tornou-se mais crítica da política israelense, ao mesmo tempo em que insiste que o reconhecimento de um Estado palestino deve vir no final de um processo político para chegar a um acordo sobre uma solução de dois Estados.
O porta-voz do governo alemão disse nesta segunda-feira que não deve haver mais anexações no território ocupado por Israel.
A Itália disse que reconhecer um Estado palestino pode ser "contraproducente".
RESPOSTA ISRAELENSE PODE INCLUIR ANEXAÇÃO DA CISJORDÂNIA
Israel está considerando anexar parte da Cisjordânia ocupada como uma possível resposta, bem como medidas bilaterais específicas contra Paris, disseram autoridades israelenses, embora os reconhecimentos devam ser em grande parte simbólicos.
A anexação pode sair pela culatra e alienar países-chave como os Emirados Árabes Unidos, uma potência petrolífera global e um centro comercial com ampla influência diplomática em todo o Oriente Médio.
Os Emirados Árabes Unidos, o mais proeminente dos estados árabes que normalizaram os laços com Israel sob os Acordos de Abraão mediados pelos EUA em 2020, disseram que tal medida prejudicaria o espírito do acordo.
"É por isso que declaramos que a anexação é uma linha vermelha para o meu governo, porque atinge o cerne do que os Acordos de Abraão deveriam alcançar", disse à BBC Lana Nusseibeh, ministra de Estado do Ministério das Relações Exteriores dos Emirados Árabes Unidos, nesta segunda-feira.
A Noruega reconheceu um Estado palestino em conjunto com a Espanha e a Irlanda em 2024. Mas seu ministro das Relações Exteriores, Espen Barth Eide, foi cauteloso sobre os últimos reconhecimentos de soberania.
"A Palestina está em um ponto de inflexão e nós estamos em uma encruzilhada. Embora o apoio político internacional a uma solução de dois Estados raramente tenha sido mais forte, a situação no terreno está pior do que nunca", disse Eide.
O governo dos EUA também alertou sobre possíveis consequências para aqueles que tomarem medidas contra Israel, inclusive contra a França, cujo presidente, Emmanuel Macron, está hospedando a cúpula de Nova York.
A cúpula, antes da Assembleia Geral das Nações Unidas desta semana, acompanha o lançamento de Israel de um ataque terrestre há muito ameaçado na Cidade de Gaza, com poucas perspectivas de cessar-fogo, dois anos depois que militantes islâmicos palestinos do Hamas atacaram Israel, desencadeando a guerra no enclave palestino.
FRANÇA DIZ QUE DECLARAÇÃO É UMA REJEIÇÃO AO HAMAS
Em meio à intensificação da ofensiva israelense em Gaza e à escalada da violência dos colonos israelenses na Cisjordânia, há um crescente senso de urgência para agir agora, antes que a ideia de uma solução de dois Estados desapareça para sempre.
"A decisão que o presidente da República apresentará esta tarde à Assembleia Geral das Nações Unidas é uma decisão política simbólica e imediata que demonstra o compromisso da França com a solução de dois Estados", disse o ministro das Relações Exteriores da França, Jean-Noel Barrot, ao canal de televisão TF1.
A França impulsionou a medida, esperando que o anúncio de Macron em julho, de que reconheceria um Estado palestino, desse maior impulso a um movimento até agora dominado por nações menores que geralmente são mais críticas a Israel.
Bandeiras palestinas e israelenses foram projetadas na Torre Eiffel em Paris na noite desse domingo.
Alguns países disseram que a normalização dos laços diplomáticos seria gradual e dependente de como a Autoridade Palestina avança em suas promessas de reforma.
Em Gaza, alguns palestinos encontraram pouco alívio no reconhecimento do Estado ao fugirem dos ataques israelenses no domingo.
"Mesmo que países como Austrália, Canadá e França – que agora estão entre os que iniciam esse reconhecimento – reconheçam a Palestina, acredito que ainda não haverá pressão séria sobre Israel para conceder aos palestinos seus direitos", disse o palestino deslocado Nabeel Jaber.
PALESTINOS RECUSARAM VISTOS PARA NÓS
Em Tel Aviv, os israelenses disseram que os palestinos recusaram muitas chances de estabelecer um Estado no passado.
"Oferecemos paz a eles cerca de cinco vezes. Eles poderiam ter concordado com qualquer uma dessas, e nunca, jamais, escolheram a paz. Então, por que precisamos escolher a paz com pessoas que querem sequestrar, assassinar, estuprar nosso povo? Não acho que precisamos fazer isso", disse a estudante de cinema Tamara Raveh, 25.