Bernardo Costa, Jornal do Brasil
RIO - No início, acostumou-se a ouvir das pessoas que suas músicas eram estranhas. Mas Djavan, onde está o um? , questionavam os ouvintes incapazes de identificar o primeiro compasso das canções que ele compunha. Se em Maceió seus amigos e familiares o desestimulavam a vir ao Rio (eles, também, não conseguiam encontrar o "um"), por aqui a coisa se repetiu no início dos anos 70, quando Djavan, rejeitado num primeiro momento como compositor, passou por uma triagem necessária. Foi crooner das boates Number One e 706, nas quais atuou até como iluminador, para espetáculos de Maria Alcina e do performático Edy Star. Agora consagrado, Djavan volta a essa etapa da sua carreira em Ária. Deixando de lado a composição, revisita autores lendários como Cartola e Silas de Oliveira, mas também os contemporâneos Caetano, Chico e Gil, passando por Luiz Gonzaga, entre outras reminiscências auditivas e afetivas.
Dezenas de discos e centenas de apresentações depois do estranhamento inicial, o público mais novo de Djavan irá conhecer o crooner dos anos 70 na turnê do álbum, que chega ao Rio nos dias 1 e 2 de outubro, no Citibank Hall. Em vez de Osmar Milito, que fazia Djavan cantar sambas-enredo em tons altíssimos, André Vasconcellos, Torcuato Mariano e Marcos Suzano o acompanham agora, cerca de 40 anos depois.
A ideia do disco já era antiga, mas achava que nunca a realizaria, porque a composição sempre foi uma necessidade física para mim . Mas vi que era a hora de buscar outros caminhos e desafios, como extrair frescor do standard americano Fly me to the moon ou de Palco, maior sucesso do Gil explica o cantor. Não componho desde 2003. Mas seu eu sentar aqui para compor amanhã, tenho quatro pedaços que podem gerar canções. São como a primeira pincelada de uma tela.
A diversidade de gêneros e autores das 12 canções de Ária reflete a formação musical de Djavan.
Quando tenho a oportunidade de dar um conselho a alguém, digo para ouvir de tudo. É o que liberta o músico. Fui marcado por rock, baião, valsa, salsa, rumba, samba, bossa, jazz... E acredito que o caráter multifacetado da minha música venha daí.
Com 34 anos de carreira, iniciada em Maceió com o conjunto vocal LSD, Djavan passa em revista momentos importantes de sua trajetória.
Nessa época de crooner, acho que a maior vantagem foi ter aprendido a colocar a minha voz, a defendê-la. Porque o Osmar Milito (pianista) gostava que eu cantasse em tons bem altos.
Violão ruinzinho
Djavan chegou ao Rio em 1973, cercado pela descrença. Muitos achavam que sua música não teria receptividade. Mesmo assim, o cantor e compositor procurou o conterrâneo locutor esportivo Edson Mauro, que o levou ao colega Adelson Alves. Por trabalhar com outro tipo de música na época, principalmente o samba, o radialista disse que não poderia ajudá-lo, mas o indicou para a Som Livre, onde foi recebido pelos produtores João Melo e Waltel Branco.
O João disse a mesma coisa, que minha música era esquisita e que deveria mudar conta o cantor. Mas o Waltel falou que essa diferença era o meu trunfo, e me apresentou ao João Araújo, que era o chefão da gravadora. Ele achou que minha música tinha que evoluir e me colocou para interpretar outros compositores.
Waltel Branco fez apenas uma ressalva.
Ele falou: Mas esse teu violão é bem ruinzinho lembra Djavan. - Ele pediu para eu procurá-lo no dia seguinte ao que mostrei minhas músicas. Quando cheguei, ele me levou a uma sala com seis violões e disse para escolher um. O primeiro que peguei é o que uso até hoje, e com o qual gravei este disco.
Sua voz acabou se tornando sucesso em trilhas de novelas como canções como Gabriela, cravo e canela. Mas não suas músicas. A oportunidade para um disco autoral surgiu quando gravou o segundo lugar no Festival Abertura, realizado pela TV Globo em 1975, com a canção Fato consumado.
Foi aí que o João Araújo disse: "se prepara que eu vou gravar um disco com você". Comecei