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Paixão emagrece, amor engorda

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Tania Neves, Agência JB

RIO - Se fosse anunciada como dieta da moda, faria sucesso instantâneo: paixão emagrece, amor engorda. Mas é o título do novo livro de crônicas de Sonia Hirsh que mistura comida e reflexões sobre a vida. No relato da escritora, os apaixonados se alimentam um do outro e se esquecem de comer. Emagrecem. Feita a conquista, instalam-se no ninho para celebrar o amor com chocolates, champanhe, jantares românticos. E engordam. A tese é unanimidade entre gordinhos que já estiveram magros e apaixonados, magrinhos que provaram o doce processo de engorda do amor e até os que só agora estão descobrindo isso. Como Mariana Binder, 16 anos, ainda com o primeiro namorado. Estamos firmes há um ano, e já vi que a rotina depois da conquista é outra. Antes, a gente se preocupa mais com a aparência. Depois, quando já construiu alguma coisa com o outro, sabe que ele não vai te deixar por uns quilinhos e relaxa , conta ela, ao lado da amiga Mariana Goulart, que vive situação semelhante.

O endocrinologista Tércio Rocha assina embaixo da teoria, e explica cientificamente o vai-e-vem das calorias: Na paixão, as neuroenzimas produzem mais endorfinas, o que abranda a fome, pois dá sensação de saciedade. A paixão satisfaz os amantes, e eles não vão atrás de prazer na comida . Aí, o amor se instala e traz estabilidade: o que era para ser conquistado já está no papo. Segundo Tércio, é preciso ter muito cuidado nessa hora. Nunca se deve estar totalmente disponível, porque o que está na mão só serve para jogar fora. É preciso guardar um pouco de mistério para esse momento em que a termogênese diminui e o metabolismo cai. Se for aberta a porta da rotina sexual, o acúmulo de gordura é certo, porque tédio e rotina levam à ansiedade, que faz buscar compensação na comida , explica Rocha, que completa: Não se vai ter no rodízio de pizza o que o sexo frugal na escada de incêndio oferecia .

Ela está seca de paixão . Assim define a economista Ana Chiarelle, 40 anos, a fase pela qual sua estagiária, Marina Spaneck, 23, está passando. Longe há cinco meses do namorado, em um intercâmbio nos Estados Unidos, a jovem já emagreceu seis quilos. Foi a saudade que me tirou o apetite , reflete. Com uma agenda tomada por estágio e faculdade, Marina também não recusa convites para happy hours, uma forma de espairecer que também lhe consome muitas calorias enquanto espera o desembarque do amado no Tom Jobim, mês que vem. Em uma mesa da Champanheria Ovelha Negra, em Botafogo, a psicóloga Valéria Silva, 37 anos, endossava o ponto de vista das amigas, entres goles de proseco e desprezo pelo queijo tira-gosto. A paixão substitui a ansiedade, a vontade de comer. Preenche tudo. Já o amor é mais sereno .

Para o sexólogo Amaury Mendes Júnior, a explicação dessa equação está na profunda ligação entre alimentação e sexo: a química da paixão acontece no hipocampo, região do cérebro vizinha do centro que estimula o apetite. Isso, segundo ele, faz com que uma suculenta refeição possa ser equiparada a uma boa rodada de sexo. Quando se inicia uma paixão, segundo Amaury, a liberação de oxitocina, endorfina e testosterona é maior, por isso os apaixonados fazem mais sexo no começo da relação. Podemos dizer que a paixão que causa todo esse desequilíbrio hormonal tem prazo de validade: uns seis meses, mais ou menos. Depois há uma estagnação hormonal. Caso contrário, a pessoa morreria, não agüentaria tanto tempo vivendo assim , diz. O sexólogo defendendo a hipótese de que a auto-estima elevada de cada um e a boa sintonia entre o casal poderá fazer com que a paixão retorne muitas vezes, de forma transitória. A rotina mata a paixão, mas a criatividade pode trazê-la de volta .

Foi nisso que apostou Suzana Leal quando abriu, há dois anos, a sex shop Pselda, voltada preferencialmente para mulheres. A julgar pelo boom do mercado de lá para cá segundo Suzana, pelo menos mais seis concorrentes surgiram entre a Barra e a Zona Sul desde então tem muita gente seguindo o conselho do sexólogo para incrementar a relação com brinquedinhos eróticos. Mas quando acaba de vez o tesão, nem isso dá jeito , diz a empresária, que tem uma receita ainda mais radical do que a paixão para secar. Ser traída. É uma agressão tão grande que a garganta tranca e não desce nem água. Estive mais magra e bonita ao longo dos meus 52 anos sempre que fui traída , confessa. Nem precisa dizer que as fases mais rechonchudas Suzana viveu a dois, com muitas passagens por Itaipava, à beira da lareira e comendo fondue.

Se para Suzana a traição faz emagrecer mais do que a paixão, o que leva a engordar ainda mais do que o casamento é a monogamia, na opinião de Tércio Rocha. A exclusividade sexual gera cansaço, pois o instinto do ser humano é polígamo. Somos tribais, queremos construir coisas em parceria: uma família e um patrimônio, por exemplo. Mas isso não precisa incluir exclusividade sexual, que leva ao tédio e à ansiedade. E a ansiedade estimula no organismo as catecolaminas, que induzem a produção de colesterol e cortisol, vilões da acumulação de gordura abdominal. Com a serotonina baixa, o sujeito procura a comida para ter o mesmo prazer que tinha antes, quando o sexo ainda era bom , esclarece. A receita é só para os pacientes ou vale em casa também? O médico de 43 anos, casado há 15, assegura que vale. Sempre soube respeitar meus instintos. E, como sou de uma geração de homens que insistem em não ser cornos, diria que minha mulher nunca traiu, que até hoje continua me achando gostoso .

Nutricionista dos Vigilantes do Peso, Sônia Almeida não tem estatísticas para traçar o perfil de quem busca orientação dietética no grupo mas, por observação, nota que a maioria engorda depois do casamento. E os que têm mais sucesso nos programas de emagrecimento são os que voltaram a ser solteiros. Tem a ver com uma necessidade de parecer bem para o outro, de estar em melhor forma para sair à noite , diz. O acúmulo de gordura depois do casamento, segundo ela, é fruto de uma realidade macabra: quando duas pessoas se juntam, uma fatalmente influenciará a outra, e quase sempre serão os maus hábitos de cada uma que prevalecerão. Elas capitulam diante da repetição de frases como 'Você já vai sair de novo para jogar bola?' ou 'Salada outra vez?' Os maus hábitos vencem porque são antigos, vêm da adolescência ou da infância e, sem dúvida, são muito prazerosos .

A consultora ambiental Daniella Brenny Halegua, 27 anos, bateu à porta dos Vigilantes para perder os quilos que lhe ficaram depois do casamento e da gravidez. O marido, Paulo, começou a disparar o ponteiro da balança ainda durante o namoro. Ela atribui tudo à rotina mais doméstica. Antes, eu tinha tempo para ir à academia, agora não. Fora isso, como transferi o escritório para casa, acabo comendo bobagens e a toda hora vou à cozinha beliscar. Os passeios com minha filha e minha enteada são sempre assim: levamos no parquinho e ficamos sentados enquanto elas brincam .

Roberto Campos, 41 anos, gerente de vendas da academia Estação do Corpo, vive na gangorra do engorda-emagrece desde a primeira namorada. Acredita que começa a perder peso por causa da tristeza, ao fim de uma relação, e vai secando de tanto malhar para esquecer e para ficar em forma para uma nova conquista, claro. Quando estou sozinho, tenho necessidade de me achar bem, de elevar a auto-estima, e faço isso malhando muito de dia e dançando à noite , conta Roberto, que nessas ocasiões chega fácil aos 82 quilos, seu peso ideal. Quando firma um namoro, no entanto, logo ultrapassa os três dígitos na balança. E atribui isso ao fato de se sentar mais em mesas de restaurante com a amada.

E será que o sexo influi nisso? Autor do livro Como emagrecer fazendo sexo, o americano Richard Smith prega que todas as ações relacionadas ao ato sexual gastam energia do beijo ao orgasmo, que consumiria 160 calorias. O psicólogo Oswaldo Rodrigues Júnior, presidente da Sociedade Brasileira para o Estudo em Sexualidade Humana, contesta. Garante que não há estudos sérios sobre queima calórica em atividades sexuais, já que a variação do sexo feito por cada um impediria comparações. Se a média de relações sexuais do brasileiro é duas vezes por semana, são poucas as chances de associar diminuição de peso com atividade sexual , completa. Para o psicólogo, a engorda começa no sedentarismo seja na vida de casado ou não. Alguém que faz pouca atividade física terá menos atividades sexuais e provavelmente levará pouco tempo quando fizer sexo, gastando muito menos calorias e vivendo menos emoções e sensações prazerosas , analisa.