Há limites ao crescimento

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O presidente Lula, que comemorou a média de crescimento 3,5% no seu primeiro governo (2003 a 2006) e de 4,6% no 2º período (2007o a 2010), quando deixou o poder com o PIB crescendo 7,5% e um índice de popularidade de mais de 80% (motivo pelo qual elegeu fácil sua sucessora, Dilma Roussef, “mãe do PAC”, mas que era vista nos meios populares mais incultos como a “mulher do Lula”, agora, no Lula III, na ânsia de repetir níveis amplos de crescimento, parece seguir Proust “Em busca do tempo perdido”. para crescer a qualquer custo. Vale dizer que muito do crescimento de 2010 veio da base de comparação de 2009 (queda de 0,2%).

 O presidente, e uma parte do governo ligada a sindicatos de trabalhadores, como o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, direciona, muitas vezes em conflito com o Banco Central (antes com Campos Neto, agora, com Gabriel Galípolo, que indicou), as políticas oficiais para buscar o crescimento máximo. Toda economia tem limites físicos. A começar, pela necessidade de os gastos não ultrapassarem as receitas, pois o desequilíbrio tende a levar ao endividamento perigoso. E à inflação.

 Mas há limites físicos na capacidade da infraestrutura do país (energia, estradas, produção de indústrias básicas) acompanhar o ritmo de crescimento da demanda. O primeiro impacto de desequilíbrio entre demanda acelerada e oferta travada por políticas econômicas ou causas externas (seca ou excesso de chuvas na agropecuária) ocorre na alta dos preços. Uma safra ruim, pode ser recuperada no ano seguinte (nas grandes lavouras) ou em poucos meses, em hortaliças, legumes, frutas ou na avicultura e pecuária.

 Mas há um impacto mais grave na economia, lembrava o saudoso ministro da Fazenda, Mário Henrique Simonsen: o balanço de pagamentos. O resultado final das transações do país com o exterior acaba sendo afetado se a economia cresce além das possibilidades estruturais. Simonsen dizia: “a inflação aleija; o balanço de pagamentos mata”. Era um recado que repetia como mantra no governo Geisel aos saudosos do crescimento acelerado do milagre econômico de Delfim Neto, no auge da ditadura. [mais recentemente, no Plano Real, o mantra do ministro Pedro Malan era de que “não se pode gastar além da receita”, conhecida pela maioria das famílias].

 A economia brasileira, que cresceu 14% em 1973, no auge do “milagre brasileiro”, tinha todos os sintomas do hiperaquecimento: havia fila de compradores de automóveis nas concessionárias porque as montadoras não conseguiam terminar os carros por falta de maçanetas, vidros laterais e outros insumos entregues pelos fabricantes de autopeças. As importações ainda ficaram US$ 7 milhões inferiores às exportações, porque a escalada dos preços do petróleo (em setembro de 1973, que fez desmoronar o “milagre”, só produziu impactos em menos de três meses (os contratos eram antecipados pela Petrobrás).

 Em 1974, a economia capotou, com déficit de US$ 4,5 bilhões. Um erro do governo, que manteve os juros fixos (em cruzeiros) dos pré-financiamentos de importações, fez a conta de petróleo ter um gasto extra de US$ 2,1 bilhões, enquanto as demais mercadorias cresceram US$ 2,4 bilhões. Houve excesso de estoques especulativos. Para corrigir os problemas estruturais, o II PND visou a substituição de importações, com projetos financiados pelo BNDE a juros subsidiados.

 Um duplo desastre

 Mas houve um grande desastre agrícola no Brasil em junho de 1975. As pesadas geadas destruíram os cafezais de São Paulo e Paraná e a estrutura fundiária do “colonato”, implantada no país na metade do século XIX, quando as leis inglesas já limitavam o tráfico de escravos. Os fazendeiros de café atraíram famílias de colonos europeus (italianos, espanhóis, suíços, alemães e ucranianos) para cuidarem do café nas ricas e planas terras roxas dos soia estados e lhes deram direito – em regime de meia ou terça – para plantarem milho, feijão e mandioca nas “ruas” do café. Com o resultado da colheita, ainda engordavam porcos e aves. Por isso, os colonos estrangeiros puderam enriquecer no acesso à terra – principal meio de produção da época, ao contrário dos escravos afric

A quebra das lavouras levou ao fim do colonato e causou uma disruptura na produção de alimentos básicos do país, com prolongada inflação nos anos 70 e 80 – até a Embrapa desenvolver sementes para a conquista do Centro-Oeste. Os subsídios explodiram, agravando o déficit público. Os antigos colonos - dispensados pelos fazendeiros que optaram pela monocultura mecanizada da cana-de-açúcar ou pela citricultura em São Paulo, enquanto a soja invadia o interior do Paraná - foram inscritos no Funrural do INPS, gerando déficit estrutural que persiste até hoje (com as distorções dos altos salários e dos militares das forças armadas e das PMs).

 A rearrumação da agricultura brasileira, hoje concentrada no Centro-Oeste, ajudou a normalizar a inflação (sempre sujeita a impactos climáticos nas safras ou a choques esternos) e a reequilibrar as contas externas. O pessoal do agro valoriza a sua parte – embora o agronegócio seja a base da economia desde os anos 1500. Mas a verdade é que a outra perna que equilibrou as contas externas foi o aumento da produção interna de petróleo. O país passou a ser autossuficiente (ainda não no refino de combustíveis) e nos últimos 14 meses, com a quebra da safra de soja em 2024, o petróleo passou a ser o principal item da pauta da exportação, desbancando a soja, líder desde 1995.

 Alerta para Lula

Há limites ao crescimento Os números do balanço de pagamentos de dezembro e janeiro (o déficit na Conta Corrente – balança comercial + serviços, e rendas de capitais - cresceu para US$ 8,655 bilhões, quase dobrando frente aos US$ 4,407 bilhões de janeiro de 2024 explicam boa parte da pira do resultado, pois o saldo da balança comercial caiu de US$ 5,563 bilhões para US$ 1,223 bilhão (menos US$ 4,340 bilhões).

 Mas enquanto as exportações agrícolas não retomarem o fôlego (o mundo protecionista de Donald Trump torna o cenário incerto), é prematuro tentar crescer a qualquer custo. Os números do Investimento Direto Estrangeiro no país (IDP) de janeiro ficaram em apenas US$ 6,501 bilhões, ou seja, faltaram recursos na balança comercial e no IDP para cobrir o rombo em Transações Correntes (US$ 8,655 bilhões).

 Delfim Neto, que foi conselheiro econômico de Lula, não acreditou na advertência de Simonsen e quando voltou a ser czar da economia em agosto de 1979 mandou os empresários “tacar o pau na máquina” (mais ou menos como prega Lula) e ainda desvalorizou a moeda em 30% em dezembro, duas semanas antes do segundo choque do petróleo em fins de 1979. Resultado, a economia cresceu muito em 1980, capotou com recessão de 1981 a 1983 e a crise da dívida externa de 1982, levando à década perdida de alta inflação e baixo crescimento. O preço de ignorar sinais pode vir na conta de 2026.