O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Quando será o fim dos cortes da Selic?

Publicado em 21/05/2024 às 16:15

Alterado em 21/05/2024 às 16:15

A divulgação, dia 14 de maio, da ata da reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) de 8 de maio, não foi suficiente para convencer os investidores de que os votos dissidentes (quatro votaram por manter a previsão de queda de 0,50% e quatro, com o voto de minerva do presidente, Roberto Campos Neto, optaram por reduzir o ritmo em 0,25% para 10,50%, diante das incertezas externas e internas) da autarquia se deram por razões técnicas.

O tom do documento veio em linha com o comunicado da semana anterior, reforçando a necessidade de cautela diante de um cenário marcado por expectativas de inflação desancoradas e piora do cenário fiscal. Apesar desse consenso entre os diretores, o grupo dissidente, que defendia a manutenção do “forward-guidance”, argumentou que o seu voto refletia a avaliação de que o custo reputacional de romper com o “guidance” superava o seu benefício.

Mas, desde então, diante das divergências, que, sintomaticamente, separou os quatro diretores indicados no governo Lula (que optaram pela manutenção dos 0,50% e os quatro que sugeriram maior cautela), e das incertezas quando o Federal Reserve iniciará a baixa de juros (setembro para os otimistas – dezembro para os pessimistas) o mercado financeiro virou uma verdadeira bolsa de apostas sobre a trajetória da inflação e dos juros da Selic.

Na última pesquisa Focus, encerrada 6ª feira e divulgada ontem pelo Banco Central, mesmo depois do Itaú divulgar, no mesmo dia 17 de maio, sua previsão de que a Selic só terá mais uma queda de 0,25% para 10,25% na reunião de junho, a mediana indicou a previsão de que a Selic encerra o ciclo de 2024 em 10% e manteve a projeção de 9% para 2024.

Isso mesmo com a previsão do IPCA subindo de 3,76% para 3,80% este ano (3,84% nas respostas dos últimos cinco dias úteis) e a taxa de 2025 elevada de 3,66% para 3,74% (recuo para 3,70% nas respostas dos últimos 5 dias úteis). Quando ao déficit fiscal primário avançou de 0,64% para 0,70% (-0,73% nos últimos 5 dias) e o de 2025 aumentou de 0,60% para 0,63% (0,69% nas respostas de 5 dias).

Calendário de escutas apertado
O Copom volta a se reunir dias 18 e 19 de junho. A Ata desta reunião será divulgada dia 23. Dia 26 de junho o Conselho Monetário Nacional deve decidir sobre a meta de inflação de 2027 (as metas de 2024 a 2026 são de 3,00%+tolerância de 1,50% para cima ou para baixo) e no dia 27 de junho o Comitê de Política Monetária (Copom) divulga o Relatório Trimestral de Inflação.

Em função destas decisões, alguns membros do Copom têm feito reuniões com economistas do mercado para auscultar suas opiniões. Entretanto, o calendário e a composição das duplas pelas quais o Copom se apresenta para auscultar o mercado continua a expressar a divisão registrada em 2 de agosto de 2023 (quando quatro diretores insistiram em só fazer a primeira baixa da Selic em 12 meses em 0,25% e quatro (sendo dois novos diretores) insistiram que havia espaço para 0,50% - e Campos Neto deu o voto de desempate para 0,50% (e desde então foram cinco reuniões seguidas de baixa unânime em 0,50% até a divisão na última reunião), mostra consultas assimétricas.

Semana passada, o diretor de Política Econômica, Diogo Guillen, que tem a responsabilidade de elaborar o RTI (embora a diretoria de Política Monetária, chefiada por Gabriel Galípolo, também participe, como as demais) se reuniu com economistas de instituições financeiras do Rio de Janeiro, acompanhado do diretor Renato Dias Gomes, de Organização e Resolução. Ambos indicados em abril de 2022, no governo Bolsonaro, têm mandato até 31 de dezembro de 2025 e integram a ala ortodoxa do Banco Central. Galípolo, que é cotado para substituir Campos Neto, cujo mandato expira em 31 de dezembro deste ano, comunga da preocupação da desancoragem, mas ainda vê espaço para pequenas reduções na Selic que aliviem as dívidas do setor real.

Dois pesos e duas medidas
O Itaú já se manifestou por mais um corte na Selic para 10,25%, o Bradesco, que previa 9,50%, está revisando para cima e ainda não divulgou o novo patamar. O Santander, cujo departamento de estudos econômicos é chefiado pela economista Ana Paula Vescovi, ex-Secretária do Tesouro no governo Temer, estava prevendo 9,75% de taxa terminal da Selic, pois admite que enquanto as expectativas sobre o IPCA de 2024 não chegarem a 3,80% haveria espaço para mais de uma redução de juros (só que a Focus deu 3,80%).

Mais pessimista, a Genial Investimentos, que deve ter sido auscultada por Guillen e Renato Dias, pela palavra de seu coordenador econômico, Yihao Lin, demonstra a visão de que a próxima reunião do Copom vai decidir por parar em 10,50% o ciclo de baixa da Selic, mantendo a taxa estável: “A desancoragem adicional das expectativas desde então sinaliza que o argumento utilizado para defender o voto em 0,5 p.p. foi insuficiente para que o mercado descartasse o risco de interferência política no processo decisório, minando a credibilidade do Banco Central, que passa a ter a maioria indicada pelo atual governo a partir do próximo ano.

Dada a significativa preocupação do Executivo com a desaceleração da economia e o uso intensivo da política fiscal para evitar esse cenário, o risco de interferência política sobre o BC, para que se adote uma política monetária mais acomodatícia, não pode ser descartado.

Nesse contexto de desancoragem das expectativas de inflação, incertezas em torno do início da flexibilização de juros nos EUA, deterioração do risco fiscal e elevação do risco de interferência política no Copom, avaliamos que o Banco Central se encontra em uma posição desfavorável para novos cortes de juros. Na nossa avaliação, a ausência de drivers que façam as expectativas recuarem, o BC anunciará o fim do ciclo de corte de juros, de modo que, a Selic permanecerá em 10,5% a.a. na reunião de junho”.
Essa visão começa a ser compartilhada pelo economista-chefe da XP Investimento, Caio Megale. Ele considera que a alta do IPCA de 2025, indicada na Pesquisa Focus (subiu de 3,66% para 3,74%, mas, nas respostas dos cinco dias úteis desceu para 3,70%) “deixa o Copom bastante desconfortável”. Ele reconheceu que já há discussão entre analistas do mercado que talvez nem venha a ter corte os juros na próxima reunião do comitê, em 18 e 19 de junho, ficando a taxa Selic estacionada em 10,50%, como sugere Lin, da Genial.

Juro real acima de 6,5%
A taxa de juro real ficou em 6,567% em maio (com a Selic em 10,50% e a taxa acumulada de 3,69% do IPCA em 12 meses em abril). Para o fim do ano, com a Selic em 10,50% e o IPCA em 3,80%, o juro real cairia para 6,45%. Ele fechou 2023 em 6,85 (Selic de 11,75% e IPCA de 4,62%). Para 2025, se as projeções da Focus se confirmarem (Selic de 9% e IPCA de 3,74%) o juro real cairia para 5,07%. Em 2022, o juro real fechou o ano em 7,5%.

Arrecadação cresce forte
A arrecadação federal somou R$ 228,873 bilhões em abril e voltou a ter forte crescimento real (descontada a inflação) de 8,76%, comparada com abril de 2023. Sobre março, o aumento foi de 19,625 em termos reais, Dois fatores turbinaram a arrecadação: a volta do PIS/Cofins sobre combustíveis (zerados eleitoralmente por Bolsonaro em 2022), que rendeu R$ 44,301 bilhões, um crescimento real de 23,38%, e o crescimento das contribuições do INSS e do IR sobre o trabalho assalariado contribuição previdenciária e do IRRF-Trabalho, que somaram R$ 52,790 bilhões, com o crescimento da massa salarial.
Nos primeiros quatro meses do ano, a arrecadação, engordada ainda pela tributação sobre fundos exclusivos, somou R$ 886,642 bilhões. Segundo a Receita, foi o melhor resultado para o 1º quadrimestre do ano, em termos reais, na série histórica iniciada em 1995. A soma representa aumento real de 8,33% na comparação com os quatro primeiros meses de 2023.