O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Nota zero para o anúncio da Reforma Tributária

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Publicado em 25/04/2024 às 15:08

Alterado em 25/04/2024 às 15:08

Roberto Campos Neto quer fazer seu sucessor Raphael Rbeiro/BCB

O governo Lula reclama de que os avanços na economia, que são inegáveis, com a queda da inflação e o crescimento do emprego, apesar de o Banco Central jogar na retranca e não baixar os juros na dose necessária para aliviar empresas e famílias, mas é preciso fazer o “mea-culpa”. O governo erra muito na comunicação dos seus feitos. Devia aprender com as galinhas, que logo cacarejam quando põem ovos.

Vejam o caso da apresentação, ontem, pelo governo ao Congresso, do projeto de regulamentação da Reforma Tributária, com presença do presidente Lula, do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e dos presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco.

Há 40 anos a sociedade aguarda essa reforma. Era para ter feito uma tremenda badalação, pois o feito foi uma vitória da articulação política (à frente o presidente Lula), uma semana após recomendar aos ministros (Haddad, Rui Costa, Wellington e ao vice Alkimin, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio) mais conversas e articulações com deputados e senadores.

Mas o governo pisou feio na bola e agiu burocraticamente. Ou mineiramente em excesso, com medo de fracassar o acordo no Congresso (Tancredo dizia que “político mineiro só escreve carta depois de receber a resposta”), não antecipou para a mídia os detalhes da proposta.

Resultado, embora o anúncio tenha sido feito por volta das 18 horas, numa entrevista improvisada (indagado pelos repórteres sobre o conteúdo, Haddad disse que “seria distribuído amanhã” e chamou o assessor especial da Reforma, Bernard Appy, para detalhar algumas coisas). Um fiasco total.

Comunicação não é improviso
Comunicação para ter bom efeito pede planejamento e agendamento de conversas e distribuição prévia de material, com embargo de publicação. Os sites e os canais de rádio e TV e de jornalismo online ficaram pressionando o governo para apresentação das linhas gerais (os grandes noticiários são exibidos entre as 19 e 21 horas). Foi um Deus nos acuda nas redações.

Saudades das articulações que antecederam o Plano Real, com municiamento a tempo da imprensa. É verdade que a reforma vai demorar para entrar em vigor - dois a três anos. Mas, o que poderia gerar uma onda de boa vontade para com o projeto, gerou um atrito inicial desnecessário com os jornalistas.

Caberia ao próprio Lula – se não quisesse tirar o protagonismo do Congresso na Reforma (Haddad frisou que os governadores além do Congresso também eram parte da reforma, embora sem destacar o papel de seu incansável relator, o deputado Aguinaldo Ribeiro, do PP-PB) – fazer uma apresentação oficial e dividir os louros com o Congresso, como fez Haddad. Faltou solenidade.

Galípolo põe pingos nos is do Copom
Há muito critico o presidente do Banco Central. Roberto Campos Neto anda levando muito a sério o fato de que a Autoridade Monetária ficou independente do poder Executivo, desde fevereiro de 2021, pela Lei 179. Mas a independência do BC, além de não garantir sua infalibilidade (os erros têm sido uma constante em diversas gestões, antes e depois da independência), não concede ao Banco Central a decisão de seu próprio destino.

Digo isso porque me incomodou muito o fato de que Roberto Campos Neto, atual presidente do BC, com mandato até 31 de dezembro de 2024, estar querendo influir na indicação de seu sucessor. Assim como não cabe ao presidente do Banco Central influir na indicação de diretores da instituição – atribuição do ministro da Fazenda e presidente do Conselho Monetário Nacional, Fernando Haddad, que indicou Gabriel Galípolo e Ailton de Aquino, em maio de 2023, e Paulo Pichetti e Rodrigo Teixeira, em outubro de 2023 – a escolha do sucessor de Campos Neto é prerrogativa de Haddad.

O nome e a oportunidade da indicação devem ser decisões de Haddad. Contudo, diante do calendário político do Congresso, com os representantes da Câmara e do Senado envolvidos, após o recesso em 16 de julho e retomada dos trabalhos em 1º de agosto, nas eleições municipais em seus redutos eleitorais para as eleições municipais, de 6 de outubro, convém que o nome escolhido seja anunciado ainda neste 1º semestre, para que os agentes econômicos conheçam as ideias do futuro presidente do Banco Central.

É preciso haver tempo suficiente para o convencimento dos 81 senadores que respondem por sua aprovação, após sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). O pior que poderia acontecer é o calendário de votação das reformas (que nem sempre anda célere nos detalhes, como na Reforma Tributária que entra nessa fase) e de projetos do Executivo cruzar com a discussão sobre o novo comandante do Banco Central.

Campos Neto X Galípolo
Campos Neto alertou que era preferível que a escolha saísse no mês de junho, junto com a definição da meta de inflação de 2027 pelo CMN. Até aqui, Campos Neto foi bem. Errou ao avançar palpitar sobre nomes, pois não lhe cabe tal tarefa e nem influência. Cotado para substituir RCN, o diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, deixou claro que “não cabe ao BC discutir a meta de inflação que é definida no CMN pelos ministros da Fazenda e do Planejamento mais o presidente do Banco Central. Cabe ao BC apenas perseguir a meta. A meta não é para se discutir, é para se perseguir", afirmou, em um evento em São Paulo.

Os juros, depois dos EUA
Galípolo também comentou a respeito dos movimentos recentes dos mercados que resultaram em alterações das expectativas para a trajetória das taxas básicas de juros nos EUA e Brasil e no enfraquecimento do real frente ao dólar. Para ele, o Copom tem de agir com "parcimônia e serenidade", como tem sido citado nos documentos do Copom.

Galípolo completou de forma mais conservadora ser ”importante a gente ter calma, entender como isso vai se desenrolar, ainda que o risco que você esteja correndo seja de estar um pouco mais atrasado nesse processo de função de reação". O diretor entende que o BC precisa avaliar como esses movimentos impactarão a trajetória de inflação no Brasil. "A gente não tem meta de diferencial de juros e não tem meta de taxa de câmbio, a gente tem meta de inflação, que vem se comportando bem", declarou.

Sobre a atividade econômica, o diretor de Política Monetária a considerou resiliente, mesmo com a política restritiva do BC. Para ele, isto se deve aos gastos do governo (pagamento de precatórios atrasados e adiantamento do 13º salário dos aposentados em abril e maio). Galípolo espera que a demanda das famílias seguirá firme com o abrandamento da Política Monetária, a queda da inflação e as transferências do governo, como o Bolsa Família.

Sinais conflitantes nos EUA
Os dados sobre a economia dos Estados Unidos continuam emitindo sinais conflitantes que precisam ser bem examinados. O PIB do 1º trimestre cresceu apenas 1,6% em termos anualizados, bem abaixo dos 2,4% previstos pelo mercado e com forte queda frente aos 3,4% do último trimestre de 2023.

Em compensação, o Índice de Preços ao Consumidor (PCE) subiu 3,4%, em comparação com 1,8% no trimestre anterior. Excluindo os preços dos alimentos e da energia, o núcleo do índice de preços PCE aumentou 3,7%, em comparação com um aumento de 2,0%.

Resta saber se o Federal Reserve (especialmente o Federal Open Market Committee – FOMC) vai separar a tendência de desaceleração do PIB (conjuntural) dos soluços inflacionários causados pelo El Niño sobre preços dos alimentos e as altas dos combustíveis devido às tensões geopolíticas no Oriente Médio. O FOMC tem de ponderar as tendências de curto e médio prazo e mirar num horizonte 18 meses além, em fins de 2025, começo de 2026.